segunda-feira, novembro 13, 2023

Seminários que formam clérigos e não pastores

Quando leio o que alguns jovens seminaristas escrevem por estes dias, por ocasião da semana dos seminários, e me apercebo que lhes falta a frescura das palavras e da novidade de Cristo no seu coração, e que insistem em repetir palavras clericais que parecem ter aprendido no percurso do seminário, palavras de bem dizer, mas que dizem pouco, devo confessar que fico triste. Parece-me que falta vida nos nossos seminários. Vida de verdade. Não quero generalizar e quero imaginar que a grande maioria dos nossos seminaristas é bem mais santa do que eu. E precisamos de padres santos. No entanto, estou convencido que ainda há muito por fazer para que os seminários deixem de ser redomas de vidro que protegem os futuros padres dos males do mundo ou fábricas de uma casta clerical que se fecha sobre si mesma. Ainda bem que a assembleia sinodal do último mês de outubro deixou plasmada, no seu relatório de síntese, a necessidade de uma formação dos candidatos ao sacerdócio ministerial que não crie um ambiente artificial separado da vida normal dos fiéis. Precisamos de seminários que formem pastores e não clérigos!

7 comentários:

Anónimo disse...

Bom dia, senhor padre.
O que refere são afirmações duras, mas concordo substancialmente com elas.
Muitos seminaristas parecem jovens de um mundo à parte.
cumprimentos

Anónimo disse...

Ó padre, acho que ninguém está interessado em reflectir sobre a vida nos seminários.
É como um mistério.
O que se querem é padres para as nossas conveniências.
O resto é com os bispos e com Roma.

Talvez nos falte aos leigos interesse por estas coisas! Não sei...

Anónimo disse...

Tem graça. Há mais de 40 anos que o modelo de seminário dito "tridentino" (que parece ser tido pour muitos como fábrica de clérigos e não de pastores, e criticado nos poucos exemplos que ainda restam como sendo seminários anacrónicos, integristas e clericalistas, mesmo se com a missa de SS. Paulo VI) deixou de existir exatamente para dar lugar a modelos em que a pastoral tem a prioridade sobre tudo o resto.

"ambiente artificial separado da vida normal dos fiéis" ? Os seminário "modernos" incluem leigos na formação, psicólogos (com transferências duvidosas do foro interno aos superiores), os seminaristas já não estudam dentro do seminário, vão às universidades misturados com rapazes e raparigas da mesma idade, passam no mínimo os fins de semana nas paróquias, desdobram-se em actividade de voluntariado, não têm hábito eclesiástico (muitas vezes vestidos de forma mais mundana do que outros rapazes da mesma idade...), etc. Afinal qual é o problema?

Se calhar o problema é exatamenre ter-se abandonado o modelo anterior, pelo menos no ideal a procurar, do "seminário-mosteiro" em que os seminaristas viviam de Deus, cresciam numa vida espiritual intensa, mais próxima duma comunidade contemplativa do que do activismo actual, em que pouco a pouco entravam numa identidade clara clerical no sentido de configuração com Cristo Sacerdote que dá a vida pelos irmãos. É o modelo evangélico, de resto. Jesus escolheu os que quis, constituiu um grupo de 12 para estaram com ele, para serem formados por ele, numa intimidade que os separava dos outros "discipulos". E depois, só depois, os enviou ao mundo.

Confessionário disse...

29 novembro, 2023 15:23

Grato pela oportunidade que me dá de aprofundar a reflexão.

Discordo em alguns pontos:
- o facto de terem aulas misturados com outros, não significa que tenham de 'lutar', como os outros, pelas condições básicas necessárias, exactamente porque o estilo "seminário-mosteiro" acaba por lhes proporcionar tudo feito, tudo dado, uma comunidade organizada para se preocuparem apenas com os estudos e o discernimento... Não sei bem o quê, mas falta qualquer coisa neste sentido!
- a distinção, que parece subjacente no seu comentário, entre mundano e espiritual, na medida em que a salvação acontece no mundo e a fé se vive na história.
- a ideia de que os apóstolos, por terem sido escolhidos para uma missão específica, foram separados dos outros. Não me parece, de todo. E também podemos recordar o envio dos 72. O chamamento não separa, mas envia ao outro!
- a configuração com Cristo é para todos e não apenas para um estado de vida clerical.
- é difícil equilibar vida espiritual intensa com activismo (e estamos de acordo que o segundo não pode viver sem o primeiro), mas cada uma se exige.

Anónimo disse...

Discordo das suas discordâncias :D

Falava de estar próximo dos fíeis, agora fala de luta por condições de vida...não é bem a mesma coisa. Se tivessemos de passar exatamente por todas as circunstancias de vida mais dificeis para podermos ser enviados como ministros da boa nova, estavamosà partida votados ao fracasso: é impossível.

"Tudo feito", bom, depende... talvez nalguns seminários diocesanos que se tornaram seminários mais burgueses que os do "antigo regime", mesmo que sob a imagem de proximidade com o mundo e de aggiornamento, pela rejeição das pedagogias tradicionais. Nas congregações, comunidades e sociedades de vida apostólica (pude conhecer várias) que tentam replicar o modelo tradicional que parece ser criticado, o do "seminário-mosteiro", os candidados, para além de muitas vezes terem de encontrar meios para pagar a mensalidade (sem a qual os institutos não sobrevivem), privando-se de muita coisa a que outros com salários garantidos não têm de se privar, executam todas as tarefas manuais e ditas servis que os membros dos verdadeiros mosteiros têm se executar e vivem muitas vezes (em questão de alimentação e alojamento) com bastante frugalidade. Não há cá essa ideia de "proporcionar tudo feito". Muito distante da realidade da dezena de empregados de alguns seminários ou da mulher a dias que limpa a casa paroquial. Se as comunidades ditas "tradicionais" não convencem alguns, deixemo-las de lado, basta pegar o exemplo da Comunidade Saint Martin, em França, ao serviço das dioceses e da liturgia ordinária celebrada em toda a Igreja. O sucesso espiritual e pastoral é atestado pelos pedidos dos bispos de sacerdotes dessa comunidade. Não precisaram de abrir mão do ideal elevado sobre o sacerdócio atestado pelos santos e pelo magistério dos papas, de o diliuir ou tornar indistinto ao lado do sacerdócio comum dos fiéis.

Madre Teresa ou São Vicente de Paulo são exemplos de intensa vida espiritual com atividade pastoral abundante e frutuosa, justamente por fundada numa identidade clara e numa visão sobrenatural e sagrada da sua missão.

Depois, acho que está a misturar conceitos. O activismo e o mundanismo são erros graves, basta pesquisar o que o Papa Francisco tem escrito sobre o assunto. Servir os nossos irmãos significa elevar as realidades do mundo ao sobrenatural, ao divino: "não vos conformeis com este mundo". Deus "viu que o mundo era bom", não que o que de pecado ou de oposto a Ele existe no mundo.

A configuração com Cristo admite distinções e graus de participação: a cabeça não é o corpo, a mão não é o pé, o braço não é perna. Todos os batizados são configurados com Cristo, os diáconos de forma especial com Cristo Servo, os padres de forma eminente com Cristo Sacerdote, etc.

Anónimo disse...

O Evangelho distingue claramente os 12 dos 72, seria fastidioso replicar aqui as várias passagens que o demonstram . O facto de separar os 12 para os formar de forma especial na intimidade com o Mestre, o que o Evangelho atesta, não tem nada a ver com o seu afastamento dos outros. O envio vem depois. O envio é feito quando há algo a propor: ninguém dá o que não tem. Daí a figura do modelo de seminário dito tridentino: "O Seminário apresenta-se como um tempo e um espaço; mas configura-se sobretudo como uma comunidade educativa em caminhada: é a comunidade promovida pelo Bispo para oferecer, a quem é chamado pelo Senhor a servir como os apóstolos, a possibilidade de reviver a experiência formativa que o Senhor reservou aos Doze. Na realidade, uma prolongada e íntima permanência de vida com Jesus é apresentada no Evangelho como premissa necessária para o ministério apostólico. Esta permanência requer dos Doze a realização, de modo particularmente claro e específico, da separação, em certa medida proposta a todos os discípulos, do ambiente de origem, do trabalho habitual, dos afectos, até dos mais queridos (cf. Mc 1, 16-20; 10, 28; Lc 9, 23.57-62; 14, 25-27). Já mais de uma vez apresentámos a tradição de Marcos que sublinha a ligação profunda que une os apóstolos a Cristo, e entre si: antes de serem enviados a pregar e a fazer curas, são chamados a "estar com Ele" (Mc 3, 14)." Cf. SS. João Paulo II, Pastores Dabo Vobis

Talvez a "falta de frescura" que sentimos por vezes deva ser mais vista do nosso próprio lado. Em vez da procura incessante de novidade, um exame sobre a vivência do evangelho e do que o magistério propõe já sobre o sacerdócio seria mais útil."Jesus Cristo é o mesmo, ontem, hoje e por toda a eternidade". Em vez de pensar novas ratios e directórios, basta reler o que Directório para a Vida e MInistério dos Presbiteros e a Pastores Dabo Vobis, documentos na senda da renovação do CVII, dizem sobre a identidade e lugar do padre e tentar vivê-los. Se não funcionar, concedo, é preciso reflectir. Até lá...

Anónimo disse...

Mensagem do Papa aos seminaristas franceses, hoje. Toda ela é excelente! "Je suis heureux, chers séminaristes de France, de pouvoir m’adresser à vous à l’occasion de votre rencontre, et de vous transmettre les chaleureuses pensées que Sa Sainteté le Pape François forme pour chacun d’entre vous dans la prière. Il rend grâce pour l’appel singulier que le Seigneur vous a adressé, vous ayant choisis parmi tant d’autres, aimés d’un amour privilégié et MIS À PART ; et il rend grâce aussi pour la réponse courageuse que vous souhaitez donner à cet appel" MESSAGE DU PAPE FRANÇOIS
SIGNÉ PAR LE CARDINAL SECRÉTAIRE D'ÉTAT, PIETRO PAROLIN,
AUX SÉMINARISTES DE FRANCE