sexta-feira, janeiro 31, 2014

visão [poema 3]

Que vês tu para além de mim?
Olha-me e diz
Que vês quando olhas
Para mim

Vês quem eu sou
Ou quem é Deus em mim?
Vês o homem que sou
Ou o Deus que existe em mim?

Olha-me e diz
Com verdade me diz
Se eu sou mais do que eu em mim

quarta-feira, janeiro 29, 2014

As batatas do Carlos que é meu sacristão

Por alturas do Natal passado, a minha despensa viu os baldes de batata esvaziarem-se. Restavam umas três ou quatro batatas que já nem davam para uma sopa em condições. Ora, como o Carlos, que é meu sacristão, conhece e é conhecido por toda a gente aqui na terra, enquanto nos preparávamos para a Eucaristia, ousei perguntar-lhe se conhecia alguém que tivesse lá umas batatitas e não se importasse de as partilhar. Acenou com a cabeça, para cima e para baixo, que quer dizer sim. Ergui os ombros, alcei o pescoço e fiz uma beiça em forma de pergunta e, percebendo que eu lhe perguntara Quem, respondeu-me que ele tinha. E sorriu. Intuí que tivesse vários sacos ou baldes delas na arrecadação. Aqui o ingénuo nestas coisas, que sou eu, não sabia nem sabe que esta não é altura para ter arrobas de batatas em casa. A resposta dele é que mo ensinou. Já tenho poucas, senhor padre. Mas como o conceito de poucas é sempre muito relativo, insisti em saber o que eram essas poucas. Eram apenas um saquito ou dois. É óbvio e lógico que eu não tive coragem de lhe pedir nem uma mão cheia delas. O Carlos faz parte do grupo de pessoas que vive com meia dúzia de euros e com o que o quintal lhe oferece. Mesmo pagando-as, ele ficaria sem elas e eu não queria isso. O assunto encerrou por ali, mas não no coração do Carlos que é meu sacristão. Ao outro dia de manhã, quando saí à rua, tinha uma saca de batatas à porta. O Carlos levantara-se cedo para que não faltassem as batatas para o almoço do senhor padre.
O meu olhar demorou-se nas batatas, e nelas recordei o Evangelho de Lucas e o episódio daquela pobre viúva que deitara duas pequeninas moedas de cobre na caixinha de esmolas. Jesus observava e comentara que ela deitara mais que os ricos que ali haviam deixado fortunas, porque ela dera tudo o que tinha para viver.
É assim o Carlos que é meu sacristão.
 
rever

sábado, janeiro 25, 2014

A Igreja formatada

Não gosto da Igreja formatada. É ela a culpada de uma perda de sentido dos nossos cristãos mal formados ou com fé à superfície.
Não gosto de uma Igreja formatada que faz aquilo que sempre fez e não deixa cada um dos seus membros ser aquilo que é. Não gosto de uma Igreja que tenha de fazer assim porque sempre assim foi. Essa seria a Igreja de ontem, mas não a Igreja de hoje. Essa seria a Igreja que é um hábito, mas não uma Vida. E ninguém quer ser um autómato de hábitos. Não gosto de uma Igreja que, como um animal que urina para deixar marcas, marque territórios, rotinas ou espaços. Não quero uma Igreja que exista à custa do que marcou, mas à custa de Deus. Quero uma Igreja que esteja sempre a viver com a vida que Deus nos deu e não com a vida que conquistou.
Quero uma Igreja que não sabe sempre aonde vai. Quero uma Igreja em caminho. Uma Igreja que seja caminho. Não quero uma Igreja parada. Quero uma Igreja que pode não saber nada de nada, mas que procura e sabe procurar. Quero uma Igreja que não se contenta com o caminho andado e que se gasta olhando o caminho por andar.
Não quero uma Igreja falante, mas uma Igreja Voz. Não quero uma Igreja que saiba falar, mas uma Igreja que fale. Quero uma Igreja que saiba falar com Deus em vez de uma Igreja que fala de deus, pois quem fala com Deus mostra-O mais que quem fala Dele.
Não quero uma Igreja que nos faça sentir obrigados a entrar nela, mas uma Igreja que nos faça ter vontade de ser Igreja. Quero uma Igreja sem forma que se forma à medida de quem se faz Igreja e à medida de Deus. Uma Igreja de portas abertas. Uma Igreja mais segura de Deus que de si. Uma Igreja livre e libertadora. Que não seja castradora, mas construtora.
A nossa Igreja precisa ser desformatada. A igreja das missas a que temos de ir senão nem é Domingo precisa sair para fora de si. Precisa sair para dentro de Deus. Foi esta Igreja formatada que levou muitos dos nossos cristãos mal formados ou com fé à superfície, a bater com a porta ou a fazer da Igreja o tal supermercado de sacramentos e de ocasiões. Porque não a compreendiam. Porque não lhes trazia mais vida às suas vidas. Porque nunca viram nela senão o rosto de uma igreja. Porque não conseguiram encontrar nela o rosto apaixonante de Cristo. Porque não perceberam que ela era a Igreja de Cristo. Porque não conseguiram ser Igreja.
Não gosto de uma Igreja formatada, porque esta não nos forma. Enforma-nos.

quarta-feira, janeiro 22, 2014

Qual foi para ti o melhor post de 2013?

A última sondagem proposta questionava-nos sobre o novo aspecto do blogue em geral. Agradeço a todos os que votaram, e mais ainda a quem explicou a sua votação ou comentou a sondagem. Li todos com atenção e tenciono ir melhorando com algumas das achegas que me sugeriram, sobretudo as que se referem ao lugar de acolhimento que esperam aqui encontrar.
Hoje surge a sondagem que prometi no dia 3 deste mês. Depois de apurar com os vossos comentários e alguns emails os 10 posts que supostamente e/ou relativamente se destacaram ao longo do ano 2013, surge agora a pergunta: Qual foi para ti o melhor post de 2013?
Por debaixo da sondagem, encontram-se os links respectivos, para quem quiser conferir. Agradeço todas as justificações nos comentários.
 

quinta-feira, janeiro 16, 2014

Numa palavra [poema 2]

Amas-me tanto
Que eu não sei quanto

Olhas para mim e dizes:
Amo-te tanto
Que até Eu não sei quanto

E ficamos os dois neste tanto e quanto
Como se não tivessem peso, medida, tempo
Este tanto e quanto

Amas-me tão só, numa palavra
Portanto

segunda-feira, janeiro 13, 2014

A criança do Santuário

Gosto das luzes acesas no Santuário de Fátima, que acabam o frenesim das devoções e descobrem o véu da fé. É a melhor altura para se ir dizer umas coisas a Nossa Senhora. Falar com ela da nossa vida que está para resolver. Do filho que se tem esquecido de passar pelas bandas por onde passo. Ou passa discreto e eu, de tão ocupado, não pressinto a Sua presença. A mãe não tira o lugar do filho, mas chega-lhe com mais frequência. Por isso é bom falar com ela. É a melhor altura para não me mostrar rabugento a murmurar daqueles que vão a Fátima mas não vão à missa, que depositam flores em vasos já carregados, que acendem velas como quem faz outra coisa qualquer, que percorrem o tapete de joelhos almofadados.
Estava na minha conversa amena, simples, directa, sentida, quando à minha frente uma criança dos seus sete, oito ou nove anos, sozinha, se pôs de joelhos a percorrer o centro da capelinha, olhando para os lados, orgulhosa do seu feito, como que a dizer Eu também sei fazer. Perdi-me à procura da sua família e à procura da minha conversa com Nossa Senhora. Perdi-me e só me ocorreu que nós somos homens de hábitos e as crianças cópias dos seus ídolos, familiares ou não. Para uma criança não há feito maior que conseguir fazer o mesmo que os que lhe são modelos. Ali estava ela feliz pelo feito. E nisto comecei a entabular uma rabugice com Nossa senhora, porque me questionei que fés imitam ou aprendem as nossas crianças com os cristãos que somos. Podia estar errado. Podia não ter percebido o gesto daquela criança. Podia muitas coisas, mas não consegui deixar a rabugice com Nossa Senhora.

quinta-feira, janeiro 09, 2014

A geração do telemóvel II e o porco do senhor Manuel

O Manuel, que é meu ajudante na paróquia e na missa, pelos vistos, faz parte da geração que não sabe calar o telemóvel ou usar a tecla de silêncio. Posta esta informação, vamos à missa que está na hora dela. Ou melhor, vamos ao final da missa que está quase a acabar. Faltam a oração post-comunio, os avisos e a bênção final. Levantamo-nos ou erguemo-nos para lhes dar lugar ou para acabar com elas. Dou início à referida oração e nisto ouve-se ali ao lado, a uns dois metros de distância, um porco a berrinchar de uma forma que achei assustadora. Calou-se tudo, menos o porco. Todos olhámos em redor. A matança do porco chegara à Igreja e à missa. Era o telemóvel do senhor Manuel. Fez-se ouvir até à porta de saída com o senhor Manuel a correr. Porco e senhor Manuel a fugir, e toda a assembleia a segui-los com a mão na boca para evitar os sons das gargalhadas. Bem quis dar avisos e a bênção final. Mas foi tudo a correr como o porco do telemóvel e o senhor Manuel. Terminada a missa, em vez do cântico final, a assembleia em coro, padre incluído, não conseguiu evitar fazer ouvir as suas gargalhadas. Pelo menos saiu tudo bem disposto da missa.

segunda-feira, janeiro 06, 2014

dois braços [poema 1]

Um dos meus braços agarra-me
O outro agarra o primeiro
São dois braços que tenho,
O que me agarra e é agarrado
E o outro.
Não quero estar apenas agarrado
Ao meu sacerdócio, a mim
A mim que sou e sou sacerdote
Quero estar agarrado a Deus
Por isso tenho dois braços

sábado, janeiro 04, 2014

O que achas do novo aspecto geral do blogue?

A última sondagem proposta questionava-nos sobre o que devíamos melhorar na catequese da Infância e Adolescência em Portugal. Constatou-se que o mais necessário era “actualizá-la” (21%), logo seguida de “mais catequese para os pais” (18%) e mais “formação de catequistas”(13%). Houve ainda quem mudasse o “programas em geral” e a sua “duração (10 anos)” (11%). Postas estas informações, constata-se que, de forma transversal, se torna importante rever a estrutura que está por detrás da catequese e da sua organização em Portugal, além de uma aposta grande em formação. Hoje, dado o novo ano e o novo aspecto do blogue, lançamos nova sondagem relacionada com o novo aspecto geral do blogue. Que achas do novo aspecto geral do blogue?
 

sexta-feira, janeiro 03, 2014

rever Confessionário Dum Padre em 2013

Seleccionei grande parte dos meus textos preferidos publicados ao longo do ano 2013, e agora peço a vossa ajuda para seleccionar aqueles que considerais ou considerastes como os melhores ou os mais tocantes. Indica o nome ou os nomes dos teus preferidos nos comentários. Agradeço desde já a tua participação e colaboração. Tenciono posteriormente colocar os melhores à votação.
 
Janeiro
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