Chorei. Chorei porque as palavras me tocaram naquela parte de nós mesmos que chora, aquela parte íntima que não tem como se dizer. E depois chorei, ao pensar que na minha partida, os meus filhos não se vão despedir de mim, não me farão cartas bonitas destas.
Era uma carta de despedida de um filho ao pai que partira por causa daquela maldita doença do cancro. A mesma que seis meses antes lhe levara a mãe. Gente com idade pouco acima dos cinquenta. Tudo ocorreu demasiado rápido, para que pudesse assimilar tanto sofrimento. Por isso descarregava na sua carta de despedida o que sentia. Passados três meses da mãe partir com muito sofrimento, os médicos haviam dito que o pai não tinha escapatória. Mas o filho tivera a oportunidade de dizer adeus ao pai naquela hora em que lhe apertou a mão e partiu. Fui tudo, apesar de doloroso, muito bonito. A beleza das coisas que nos ultrapassam no mistério. Vinham do médico e faziam uma série de quilómetros para chegar a casa. O pai estava, obviamente, esgotado e à base de morfina. Como dormia, não pararam na estação de serviço, como tinham previsto. O pai dera conta e pediu que parassem na seguinte. Esperou uns bons cinquenta quilómetros, e quando pararam, enfim, para descansar, o pai chamou os dois filhos que iam no carro, e disse o adeus mais bonito, ao agradecer o que eles tinham sido para ele. E partiu. No final da carta, o filho dizia, como testemunho de quem sofreu tanto em tão pouco tempo: “Não se zanguem. Não odeiem. Perdoem. Sorriam. Dêem. Partilhem. Digam que gostam. Abracem mais. Amem mais”.
Grande filho que presta uma homenagem tão bela aos pais. Chorei. Por eles. Por tantos como eles. E por mim, porque gostaria de que um dia, alguém como um filho, me homenageasse de igual modo.