sexta-feira, dezembro 31, 2010

O instante que passa num instante

Cada ano é mais um ano. Disso ninguém duvida. Até aos dezoito somam-se numa lentidão que até custa. A partir dos dezoito, a velocidade é aquela que as multas permitem ou impedem. A partir de uma certa idade, que nem vale a pena explicar ou definir, os anos somam-se a correr. Já não olhamos o presente. Temos apenas olhos para o passado que já foi e o futuro que está tão perto. E depois ainda existem alguns dias do ano em que tudo passa com a velocidade do sol. São os dias que acabam e começam os anos. São aqueles dias em que agora é um ano e num instante, que é um segundo, já é outro ano. É aquele instante que teimamos em contar com doze segundos e doze passas. É aquele instante em que as doze passas têm de ser engolidas a correr e a saltar de alegria. Uma alegria que contrasta com a sensação de envelhecer. É aquele instante que passa num instante.
E é nesse instante que a vida passa na nossa frente cheia de desejos, de intenções, de vontades, de promessas, de esperanças. Não temos tempo suficiente para pensar na vida, mas cuido que ninguém ousa passar este instante sem pensar na sua vida. Recordo que no ano em que a minha mãe faleceu, passei vinte minutos em silêncio numa varanda aberta para as luzes da noite. O silêncio natural das lágrimas. Era com a minha mãe que costumava passar aquele instante famoso do agora é um ano e agora já é outro. Já lá vão umas décadas. A pele ainda era macia. Ainda não tinha sido endurecida pela vida. A penugem começava a parecer-se com uma barba. Devia ter uns dez, onze, doze anos. Já andava no Seminário. Já sabia muitas coisas e faltavam-me saber milhares. Mas levava tudo a sério. E recordo que na passagem de ano toda a gente lá de casa saía para a noite. Conhecia o significado da noite, pois também saíra algumas. Mas na passagem de ano não. Ficávamos apenas eu, meu pai e minha mãe. Uns minutos antes da hora marcada para mudar de ano, já a minha mãe estava na cama, sentada, passando as contas do terço. Nalgumas dessas ocasiões o meu pai também estava com ela. Eu vestia o meu pijama verde-claro, entrava dentro dos seus lençóis, e sentava-me a seu lado. Pegava no meu terço, igualmente verde-claro, aquele que no escuro ficava iluminado, e contava ave-marias com minha mãe. Passávamos aquele instante com a oração do terço. Não imaginam o que eu sentia. A alegria que era poder partilhar aquele instante com Deus e com a minha mãe. Parecia que o ano seguinte se enchia deles os dois. E com eles, os desejos, as intenções, as vontades, as promessas, as esperanças tornavam-se certezas.
Com os anos, aquela forma de passar aquele instante passou ao esquecimento, porque as passas dos amigos caíram-me nas mãos e deixei-me levar pela corrente do engole passas, berras naquele segundo, bates nos tachos, beijas toda a gente, ligas aos mais chegados, e ponto final.
Por isso hoje não vou pegar nas passas. Vou pegar nos amigos que estiverem ao meu lado. E vou levá-los comigo a rezar uma pequena oração. Talvez o Pai Nosso porque gosto muito dele. Preciso de um ano cheio de certezas.

terça-feira, dezembro 28, 2010

O Alcindo que não pode entrar no cemitério

O Alcindo é um bom rapaz. Pode não ir à missa, mas não falta aos funerais. Pode não querer nada com Deus. Mas faz tudo pelos amigos. Por isso não falta aos funerais. E costuma ir até ao cemitério, ficar perto da urna e só sai depois do caixão ter sido coberto com a terra. Faz parte do seu ritual. E que ninguém lhe diga que está errado. Pois é assim que ele sente. É assim que ele acha que Deus quer. É assim que ele julga que tem de ser a sua vida.
Porém, no dia treze, encontrei-o à saída do cemitério, depois das exéquias de um amigo. Eu vinha a sair e ele não ia a entrar. Estava estacionado ao portão. Cumprimentámo-nos. Como estamos à vontade um com o outro, indaguei. Então hoje ficas por aqui? Não entras? Nem pareces tu. Ao que ele respondeu com uma convicção que quase me convenceu, e com uma seriedade que ainda agora me perturba. Hoje não posso. Fui operado anteontem e não posso. Dizem que isto pode infectar. Perguntei-lhe se tinha sido proibido pelo médico e disse que não, padre. Toda a agente sabe disso. Respondi que eu não sabia. E preferia não saber. As coisas que as pessoas sabem e as coisas que não sabem!
Mas já que toda a gente sabe, alguém me pode dizer como aparece a infecção!

quinta-feira, dezembro 23, 2010

E o Menino fica esquecido entre as palhas de um presépio pequenino por debaixo de uma árvore grande enfeitada

Piscam as luzes. Piscam as vitrinas. Piscam os hiper-mercados. Piscam as árvores. Piscam as igrejas. Piscam as pessoas em correrias com sacos na mão. Piscam as frigideiras, as rabanadas, as filhoses. Tudo pisca à nossa volta em época de Natal. As cores misturam-se de uma maneira que não se vê durante todo o ano. As conversas são ligeiramente mais solidárias. Há sempre uma parte de nós que quer fazer algo de bom nesta altura. As prendas são disso exemplo. Apontamos no bloco de notas todas as pessoas a quem temos dever de comprar. Para não esquecer ninguém. É a época das mensagens de telemóvel. Toda a gente envia a toda a gente. Repetem-se as frases, os desejos, as brincadeiras. Há gente com pouca criatividade. Cá para mim, a TMN deve ter uns relações públicas a criar mensagens para esta altura. O açúcar esgota. O bacalhau quase esgota. O peru sai dos supermercados às toneladas. Este ano vou para a sogra. Este ano estaremos todos juntos. A irmã mais velha não pode vir. Trabalha até tarde. Todos querem sair mais cedo dos empregos. O patrão ofereceu um bolo-rei a cada um. Mais uma garrafa de vinho do Porto. Pai Natal nas varandas. Menino Jesus nas janelas. É um rebuliço que só se vê uma vez por ano. O Natal faz destas coisas.
E tudo isto porque um menino nasceu há cerca de dois mil anos. E tudo isto por causa deste Menino Deus que nos quer salvar. E tudo isto porque é mesmo Natal. No entanto, o rebuliço desta época encosta a um canto o Menino Deus. Diga-se. O rebuliço do Natal esconde o verdadeiro Natal. E o Menino fica esquecido entre as palhas de um presépio pequenino por debaixo de uma árvore grande enfeitada.
Por isso é que este ano pedi aos meus paroquianos para, no meio da azáfama da noite de Natal, pararem o rebuliço do Natal num breve minuto. E nesse instante rezarem em família, com os que estiverem ao seu lado, um Pai Nosso a agradecer a este Menino ter vindo ao mundo para salvar cada um de nós. É pouco. É apenas um Pai Nosso que dura um minuto. É apenas um minuto do verdadeiro Natal.
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Este é o meu desejo de Natal para todos vós: um Natal cheio de Jesus!

segunda-feira, dezembro 20, 2010

Faltam personagens no presépio da paróquia _ sondagem

Na paróquia estão a faltar algumas personagens para o Presépio deste ano. Como não sabemos quem há-de fazer esses papeis, decidimos pedir-te auxílio. Destas figuras públicas que seleccionei sem grandes motivos de relevância, tentando apenas destacar alguns dos que se destacaram em 2010, ou que se destacam nas suas áreas de representação, a saber, Desporto, Música, Política, Igreja Católica, Cinema/teatro, Comunicação Social, Economia, mundo Vip, quais convidarias para fazer parte do nosso Presépio? Todos são portugueses, porque a língua que se vai usar no presépio é mesmo o português. Queres dar-nos ajuda? Então vota nas duas sondagens que encontras no sidebar, e indica-nos quem poderia ou deveria ser o "Menino Jesus" e o "Rei Herodes".
Claro que esta é uma brincadeira que não pretende ter consequências nocivas ou nefastas. Nem queremos denegrir a imagem destas figuras públicas. Muito menos ainda confundir coisas sérias. É tão só uma forma de sorrir!
Se acaso acharem que outras figuras públicas portuguesas deveriam constar nesta lista, façam favor de indicar num comentário. Nunca se sabe se ainda iremos precisar mais alguma personagem. Ouvi dizer que José estava tão ocupado na carpintaria que não tinha a certeza de poder ir. A estrela disse que também estava com frio. Só Maria garantiu que ia. Ela não podia faltar mesmo. Por isso, amigos, digam lá qualquer coisinha que o Natal está á porta.

quinta-feira, dezembro 16, 2010

A terapia dos pobres

Numa hora estive com uma dezena de pessoas, mulheres de cabelo branco ou tapado com o escuro de véu à antiga. Gente cheia de problemas. Os problemas da idade e da vida que não teve oportunidade de ter mais oportunidades. Na sua maioria viveram toda uma vida na mesma terra, na mesma casa, com os mesmos vizinhos e familiares, com o mesmo quintal. Nem a televisão deixou passar outras vidas ou outras formas de vida. Mas precisam falar. Precisam mais falar que confessar-se. E falaram. Falaram. Tanta história cruzada com nomes que eu nunca iria fixar. A sua história numa conversa. Os seus conflitos interiores e exteriores. Os pequenos ou grandes problemas. As suas depressões, se é que sabem o que são ou que as têm. E depois de uma dezena de pessoas que só precisavam falar e sentir que tinham alguém que as escutasse, eu pensei para comigo. Será este o consultório de Deus, a terapia clínica dos pobres?

domingo, dezembro 12, 2010

Os padres também erram

Estou sentado, mas já remexi a cadeira umas poucas de vezes. Parece que não consigo estar nesta posição. Levantei-me três vezes e fui à janela. Fui procurar uma resposta para a minha atitude. Fui procurar a senhora no meio daquela nuvem escura que avisto daqui. Eu tinha o portão aberto. Estava com umas pessoas debaixo do telheiro, na entrada da porta que dá para o quintal. O quintal da casa paroquial é grande e rodeado por um muro alto. A altura que possa trazer alguma discrição ao padre. Não tenho nada semeado. Não tenho tempo nem jeito. A conversa estava interessante e, repito, o portão do quintal estava aberto. Seriam umas dezoito horas, as suficientes para que o escuro impedisse a boa visibilidade, mas permitisse que nos apercebêssemos do vulto que entrou pelo quintal adentro e estagnou diante das paredes do muro que ficavam no sentido inverso ao portão. Ninguém percebeu o que se passava, nem de quem se tratava. A conversa parou. Uma das pessoas ainda falou em receio ou medo. Não me lembro que termos utilizou e para quê. Recordo que pensei. Deve ter receio do que podem querer ali àquela hora. Mas agora penso que poderia querer referir-se a outra coisa. Ao receio do que podia acontecer ao vulto estranho do muro do quintal. Levantei a voz para que o vulto me ouvisse e nada. Não reagiu. Tive de aproximar-me. Era uma senhora de cabelo branco. Não consegui ver melhor e não a reconheci. Lembrei que podia ser do lar e estar perdida. Só podia. Lembro que me mostrou umas coisas e que disse que andava às flores. Àquela hora! Ela não estava boa. Agora é que penso nisso. Perguntei se estava no lar e disse que sim. Foi a única coisa que fez sentido na conversa. Por isso encaminhei-a para o portão e indiquei-lhe a direcção do lar que fica a uns vinte metros à direita. Tinha missa dali a instantes e tinha alguma pressa. Convenci-me que ela tomaria a direita. Nem confirmei a direcção. Fui à minha vida. Mas passada uma hora e meia soube que tinham encontrado uma senhora no cimo de vila, na estrada, perdida. Se porventura não a tivessem reconduzido ao lar, não se sabe o que teria sucedido. Pedi que me explicassem melhor a história e como era a senhora. E expliquei o que sucedera comigo. Bati no peito e contei repetidamente. Contei para as senhoras que estavam na sacristia. Mas acho que era sobretudo para eu me ouvir. Bati no peito. Ainda agora bato. Eu devia não penas tê-la conduzido ao portão, mas ao lar. Devia certificar-me de que ela lá chegava. Eu devia muitas coisas, mas não o fiz. E agora estou para aqui à procura da senhora e de mim. Os padres também erram. Se erram.

sexta-feira, dezembro 10, 2010

A maior dificuldade da catequese hoje é _ resultados

Ultimamente não costumo postar as sondagens. Porém, achei oportuno postar esta, pois estou convicto que ela pode ajudar-nos a reflectir mais. Para mim a Catequese é o coração de uma paróquia. Do seu palpitar resulta a vida de toda a comunidade.

  1. a crise de fé na família: 70 (32%)
  2. a falta de formação dos catequistas 59 (27%)
  3. os pais não acompanham a catequese: 23 (10%)
  4. a catequese está desactualizada: 17 (7%)
  5. o esquema da catequese não funciona: 15 (6%)
  6. o comportamento dos miúdos: 8 (3%)
  7. são muitos anos de catequese: 7 (3%)
  8. os conteúdos são enfadonhos: 4 (1%)
  9. os miudos precisam mais incentivos: 4 (1%)
  10. é difícil arranjar catequistas: 3 (1%)
  11. excesso de actividades extra-curriculares: 2 (0%)
  12. outra: 2 (0%)
  13. os horários da catequese inadequados: 1 (0%)
  14. os catecismos não são apelativos: 1 (0%)
Considerações
  1. As opções mais destacadas são a crise de fé na família e a falta de formação dos catequistas. Isto demonstra como a formação dos cristãos é uma das maiores carências da nossa Igreja.
  2. A primeira opção (a crise de fé na família) e a terceira (os pais não acompanham a catequese ) mostram igualmente como o papel da família é sempre fundamental. Daí que muitas das apostas pastorais devam iniciar-se na família.
  3. A quarta (a catequese está desactualizada) e a quinta opções (o esquema da catequese não funciona) mostram como há ainda muito a reelaborar e a inculturar nos esquemas e nos conteúdos da catequese. Nos últimos anos, apesar de se terem renovado quase todos os catecismos, denota-se que há ainda muito a fazer nesta área.
  4. Partindo dos resultados obtidos, parece-me que as restantes opções são apenas circunstanciais. Umas mais que outras. Umas a terem-se mais em atenção que outras. Porém, não parecem ser fulcrais para o bom funcionamento ou bons resultados na catequese hodierna.

quinta-feira, dezembro 02, 2010

A lição da São

A São, diminutivo de Purificação, é daquelas mulheres normais que numa paróquia tentam levar a fé a sério. Não falta a uma celebração, a uma oração do terço, a uma responsabilidade. Assume tudo como boa cristã. Eu penso que até é daquelas pessoas que tem sempre uma palavra a dizer e a ser ouvida. Levam-na a sério tantas vezes quantas a acham inoportuna. Poderá ser fruto da postura ou do incómodo. Mas acontece. E no dia dez veio a minha casa com a lágrima no canto do olho. Olhe, senhor padre, preciso desabafar. E desabafou. Começou numa história e cruzou-a com milhares de histórias. Já pelo final que tive de engendrar porque as histórias eram muitas, abordou-me sobre outra senhora que a tinha feito sofrer. Ela apresentava as suas razões. Eu ouvia. Ela falava. Eu escutava. Percebi que procurava respostas no meu rosto. Só percebi quais quando foi direita ao assunto. Ela fez-lhe queixinhas de mim, padre? É óbvio que, tivesse ou não feito, eu não iria revelar. Não é meu hábito, nem seria bom hábito para um padre, cuido. Não lhe respondi e ela insistiu. Já tinha a porta aberta quando ela quase afirmou que não saia sem eu lhe dizer. E foi nessa altura que aproveitei para dar uma lição de vida e de fé. Sabe, tal como eu nunca direi a ninguém o que a senhora me contou, também nunca direi a si o que outras pessoas me possam contar. Afinal, não é assim que um padre deve ser?

sexta-feira, novembro 26, 2010

A fissura do braço de Cristo

Ande cá, senhor padre, que lhe quero mostrar uma coisa. A Cidália não é mulher de intrigas. Por isso não fiquei intrigado. Somente curioso. Levou-me pela porta lateral da igreja. A porta costuma estar aberta para que o Senhor possa ser visitado pelos seus amigos. A Cidália tem uma hora certa para fazer a sua visita. A seguir ao almoço, que é uma hora de pausa na sua vida, mas não na sua forma de viver com Deus. Entrámos. Depois das devidas vénias em silêncio, encaminhou o meu olhar para a cruz que está num pedestal de granito. Repare no braço, senhor padre. O braço esquerdo de Jesus tinha uma fissura que ainda não dava para colocar um dedo que fosse. Mas era perceptível para quem estivesse mais que um minuto a contemplá-lo. Ficámos assim os dois. Pensei que a Cidália me queria chamar a atenção para o braço que necessitava uma conservação. Mas ela olhou para mim e disse Não lhe parece que Jesus quer desprender este braço? Diga-me, padre, se vê o mesmo que eu. Prendi-me, primeiro, na fissura. Depois no braço que, de facto, parecia querer deslocar-se. Por fim no rosto de Jesus que esboçava um sorriso e, ao mesmo tempo, um ar para o triste. E falei assim como quem está apenas a tentar raciocinar. Vejo um Cristo que se quer solidarizar com as vidas partidas das pessoas. E mais, padre, e mais. Insistiu. O mais da sua insistência e da repetição fez-me pensar que Jesus me ama, por mais que eu não queira prestar-lhe atenção. Ficámos mais dois minutos a olhar. Eu diria, a contemplar. Sabe, padre, a mim parece-me que este Jesus quer desprender o Seu braço para poder tocar-nos. Para afagar-nos. Para abraçar-nos. Para que sintamos que está vivo. Retirei o meu olhar do braço e pousei-o na Cidália. Ó Cidália, só os que amam podem dar conta do Amor de Cristo. Deixe-o ficar assim, respondeu-me. Não o mande arranjar. Eu preciso de sentir que este braço é para mim.
Coloquei o meu braço à volta do seu pescoço e pensei. Há tantos Cristos que não devíamos arranjar!

domingo, novembro 21, 2010

preservativo _ sondagem

Hoje acordei com uma notícia-sensação. Pelos vistos, o Papa vai dizer ou disse, pela primeira vez, que o preservativo pode ser um mal menor. Transcrevo:

Pela primeira vez um papa, Bento XVI, admitiu a utilização "em certos casos" do preservativo "para reduzir os riscos de contaminação" do vírus da SIDA, segundo um livro de entrevistas que será publicado terça-feira.
Segundo a AFP, à questão "A Igreja Católica não é fundamentalmente contra a utilização de preservativos?", o líder da Igreja Católica respondeu: "Em alguns casos, quando a intenção é de reduzir o risco de contaminação, isso poderá ser um primeiro passo para preparar o caminho para uma sexualidade mais humana".
(DN)

Pensei que a notícia trazia alguma novidade. Mas a novidade que a notícia me trouxe foi a comunicação social achar que era uma novidade. De facto a doutrina moral da Igreja tem dito, através dos seus "catedráticos", que o "preservativo" pode ser algo necessário numa relação matrimonial onde o bem maior da saúde de um dos parceiros esteja em causa. Recordo-me de o ouvir no meu tempo de estudante. Já lá vai algum tempo. Porém, quando o assunto vem à baila, há sempre quem destaque o aspecto negativo das afirmações ou não queira reflectir o essencial das mesmas. Por isso, achei interessante saber a opinião dos meus "penitentes". O que pensamos nós disto? Desta vez, coloco a reflexão em duas questões:
1. "Para ti, o preservativo é..."
2. "Para ti, o preservativo tem a ver com..."
A primeira pergunta serve para tratar o assunto em geral, e a segunda em particular.
Podem expor aqui as vossas opiniões, razões, argumentos, acrescentos ou emendas.

terça-feira, novembro 16, 2010

As histórias que são anedota

O padre faz parte das notícias que correm, de boca em boca, nas nossas terras. É um assunto que vende. Vende palavras, escritas ou faladas. Vende histórias. Vende anedotas. E há histórias que são verdadeiras anedotas. Anedotas no sentido em que não podem existir. Como quando dizes a alguém Tu és uma anedota. E no sentido do riso mais rasgado. Como quando não consegues suster a respiração e de tanto rir ficas com dores de costas ou de cabeça. A última trouxe-me essas dores. Da cabeça às costas, e chegou-me aos rins. Foram necessários os rins para a ouvir. O colega que a contou também teve a sua dose de dores de rins.
Sabes, dizia, incomoda-me que as pessoas deixem bancos vazios á frente da igreja durante a missa. O povo tem tendência a ocupar os últimos lugares e ponto final. Por isso, no início da Eucaristia, insisto e torno a insistir para se chegarem à frente. Digo-te que já o fiz umas quatro vezes. E algumas pessoas lá aceitam o meu pedido. Sobretudo mulheres. Pois são elas que mais vão à missa. Pois são elas que aceitam com mais facilidade estas coisas. E o que me chegou aos ouvidos nem ao menino Jesus lembra. Vê lá do que se lembraram para justificar a minha insistência. Então não é que agora comentam que o padre chama para a frente as pessoas para ver melhor as mulheres.
Ele há cada uma. Ele há cada argumento. Ele há cada anedota.

terça-feira, novembro 09, 2010

A estatura do verdadeiro amor

O senhor Emanuel anda na casa dos sessenta. Mas nos últimos tempos o rosto tem traçado anos atrás de anos, como se cada minuto fosse uma semana de vida e cada segundo lhe desenhasse uma ruga. Quem olha para aquele homem de pequena estatura, sem querer concentra-se apenas no rosto. Um rosto que anda na casa dos setenta.
A esposa tem estado fora, lá para os lados da capital, numa clínica. A saúde dela exige cuidados que o senhor Emanuel já não possui para dar. Aguentou enquanto as forças físicas o permitiram. Hoje restam-lhe as forças anímicas ou afectivas. A doença de Alzheimer faz destas coisas. Tira muita coisa a quem padece dela. Mas tira outras tantas a quem está próximo dela. Eu sei que o senhor Emanuel tornou-se incapaz de fazer mais do que sentir. E andava mais triste ainda porque ela estava longe.
Há dias encontrámo-nos no meio do acaso da rua e no meio da sorte de Deus. Correu para me contar. Padre, ela já está aqui no lar da paróquia vizinha. O sorriso era grande, e contrastava com o rosto que lhe conheço dos últimos tempos. Por isso lhe perguntei porque estava feliz. O sorriso alargou-se e respondeu que agora podia ir todos os dias vê-la. Fiquei contente pelo sorriso. Mas, como sabia que ela estava num já quase estado de inconsciência, a curiosidade levou-me a perguntar se ela ainda o reconhecia. O senhor Emanuel baixou a cabeça e abanou-a, respondendo que não. As rugas voltaram. A minha curiosidade aumentou e, por isso, insisti. Então se ela já não sabe bem quem é o seu marido, porque está tão feliz, senhor Emanuel? Não acha que, com tanta visita, ainda sofre mais? Ao que ele respondeu, levantando de novo a cabeça e o sorriso. Ela pode já não saber quem eu sou. Mas eu sei quem ela é.
Abraçámo-nos com verdade e eu fiquei a saber que o senhor Emanuel é um homem que, de pequeno, só tem a estatura.

quinta-feira, novembro 04, 2010

Água benta

Ó padre, deixei cair o meu frasquinho de água benta e agora preciso que me dê alguma. Pedia com lágrimas nos olhos e o rosto envolvido pelas minhas mãos. Para que precisa dela? Perguntei. Olhe que não é para bruxarias. É que já me caiu um pedaço da chaminé e eu não queria que caísse mais. Ande lá, senhor prior. Preciso dessa aguinha em minha casa para Deus me abençoar o lar. A senhora Carma, que é viúva há quase trinta anos e mora sozinha no cimo da paróquia, fez-me lembrar a Carina. A Carina era uma jovem que tinha muitas dores de barriga e se queixava imenso delas. A gente dava-lhe um copo com açúcar dissolvido. E a coisa passava.

quarta-feira, outubro 27, 2010

Um grande padre

Há tempos escreveu-me falando sobre a sua atracção pelo padre da paróquia e sobre a dúvida em contar-lhe tudo. E a minha opinião foi que não contasse. Que tentasse ultrapassar sem nada revelar. Dizia que talvez fosse melhor para ambos. Que talvez fosse mais fácil para ele não perceber. Que talvez e outro talvez e outro, nas certezas ou dúvidas que tinha no que estava a dizer-lhe. A certeza do que seria melhor para a Igreja, para o sacerdote, e a dúvida do que seria melhor para a mulher e para o homem. Mas disse o que se me ofereceu dizer no momento. Ela deu-me, depois a razão, e agradeceu. De facto não tinha sequer coragem para enfrentar as consequências desse amor.
Ontem escreveu-me assim e eu copio quase na íntegra e com autorização.
Hoje vou revelar como o tempo passou e o sentimento não passou. Antes cresceu ao ponto de não conseguir contê-lo. Por e-mail contei-lhe tudo. Ao que ele me respondeu. Não é pecado se apaixonar. É uma coisa que não se pode evitar. Pecado é ir contra a vontade de Deus. Por isso, temos de perguntar a Deus para que suscita estas coisas, e estar atentos para não escolher o caminho errado, que não faria nenhum dos dois felizes. Por isso acho que a distância pode ser útil. Com o tempo, tudo ficará claro. Depois voltaremos a falar. Cuida-te. Um beijo. Deus te abençoe.
Perguntava no final o que eu achava. Eu não achei muitas palavras para dizer. E escrevi-lhe com poucas. Esse padre é um grande padre!

quinta-feira, outubro 21, 2010

As desavenças entre a Senhora de Fátima e a Imaculada

Trazia o avental à cintura. Entrara pela porta lateral, porque estava entreaberta. Cuido que se estivesse aberta, não entraria, pois o mistério da porta aberta não se compara com o mistério da porta entreaberta. Entrou, disse Bom dia, viu e retorquiu. Olhe que Nossa Senhora de Fátima não pode ficar ao lado da Imaculada Conceição.
A capela tinha estado em obras e tínhamos decidido recompor algumas das coisas, nomeadamente a posição e localização das imagens. As obras são sempre ocasião para recompor coisas.
Intrigado e, digamos, aborrecido pela intromissão de quem só tem opiniões para dar mas não para fazer, perguntei. Porquê, senhora Ascensão? Ao que me respondeu Porque elas não podem uma com a outra. Não se dão bem. Se dissesse que não ficam esteticamente bem uma ao lado da outra, até poderia aceitar. Mas que não se dão bem!
O senhor João, que estava ao meu lado, e por seu lado, soltou-se, no meio de uma gargalhada, Então o padre não sabia que a Nossa Senhora de Fátima não quer nada com as outras, porque ela é portuguesa e as outras não? E contou-me que as desavenças eram antigas e não se resumiam a estas duas, mas a uma série de nossas senhoras. Ao raciocínio acrescentei aquela de que a Senhora do O não podia estar ao lado da Senhora do Ai porque ainda estavam uma série de letras do alfabeto no meio. Rimos despregadamente.
A senhora Ascensão não entendia. Por isso acrescentou. Olhe que já no tempo de minha avó já diziam que colocando uma ao lado da outra, alguma poderia cair do trono e era certo e garantido um ano de desgraças.
Não coube mais em mim, e entendi donde vinham as desavenças antigas. Vinham da cabeça de alguns cristãos que mais nada sabem do que viver a fé com superstição.
Expliquei-lhe que eram a mesma e que por isso não se iam zangar consigo próprias. Mas ela não entendeu e saiu deixando a porta aberta. Quando estamos zangados, ou batemos a porta ou a deixamos aberta. Nunca a deixamos como estava.
É por estas e por outras que não deveríamos dar tantos nomes a Nossa Senhora.

sexta-feira, outubro 15, 2010

Procissão da conversa

Estava em Fátima, num daqueles dias em que a procissão das velas não se faz no recinto, mas a caminho dos Valinhos. A procissão demorou bem umas duas horas. Diga-se àqueles que gostam de procissões que aquilo é que é uma festa rija. Não há filas, porque as pessoas são muitas. Vão umas atrás das outras, com a sua vela na mão e, presumo, o terço na outra.
Fiquei para trás mais um colega. Rezava-se o rosário. Bastou sair do Santuário para não mais se perceber o que se estava a fazer. O ruído era tanto, as conversas paralelas eram tantas, que tivemos de avançar para a frente. De novo o mesmo. E de novo, repetida a movimentação, o mesmo. Por mais que quisesse rezar, encontrava sempre alguém a importunar. Por fim, já no grupo que seguia o altifalante, era eu que me importunava de pensamentos.
Que veio esta gente fazer aqui? Centenas de pessoas a seguir as palavras do terço, a imagem de Nossa senhora, e apenas se faz aquilo que apetece fazer, conversar. Bem dizem as sondagens. Somos cristãos porque sempre seguimos esta fé. O que eles não sabem é que a fé não se segue, mas vive-se.

quarta-feira, outubro 13, 2010

A maior dificuldade da Catequese hoje é...

No início de um novo ano pastoral, e enquanto os párocos, no meio de tantas dificuldades, tentam organizar a Catequese na Paróquia, veio-me à cabeça uma questão de todo pertinente. Gostava, pois, de saber a vossa opinião indicando qual a maior dificuldade que enfrenta a Catequese dos nossos dias. Refiro-me em concreto à Catequese da Infância e Adolescência, que vai do 1º ao 10º ano. Se acaso a tua resposta não se encontra assinalada nas opções, deixa aqui a tua opinião. Mais, poderás explicar aqui o motivo ou motivos para essa opção.
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deixei algumas pequenas observações às sondagens anteriores que agora estão aqui

quarta-feira, outubro 06, 2010

As dicas e tricas de uma paróquia

Vem uma, e faz queixinhas da outra. Vem a outra e faz queixinhas de outra. Temos de medir todas as palavras, porque senão justificam-se que o padre disse aquilo. Mesmo quando não disse, sujeita-se a que se convençam que disse. Quando não gostam da pessoa A, não se coíbem de inventar que disse ou fez. Derrubam-se uns aos outros com as verdades que sonham. E cruzam dados. E cruzam ses e pois e claros e já desconfiava. Quanto menos têm que fazer, mais têm que imaginar e dizer. Se trabalham numa fábrica e não têm com que ocupar a boca, usam a língua o mais afiado que podem. Se vêm à rua e encontram a vizinha, dão largas à amizade com uns dedos de conversa a apontar para onde calhar. Se passam o tempo no café e não têm dinheiro para mais uma bica ou uma cerveja, têm de arranjar um trago de maldizer para que a garganta não seque. Os cafés são geralmente os antros de maior maldizer. Qualquer pessoa fica sujeita a estas dicas. Porque hoje são uns e amanhã outros. Todos passam pelo crivo das tricas. Mesmo os que têm a língua maior. No final da missa trocam cumprimentos. Parece que a missa cumpriu o seu papel de comunhão. Mas nesse mesmo abraço vai muitas vezes o Se te apanho. Ou então o Já viste aquele ou aquela. E assim vive uma comunidade. Seja paroquial ou não. Quanto mais pequena, mais sujeita fica às dicas e tricas. Em cada semana aparece novo assunto. Assim se alimentam as dicas e tricas. A paróquia, o paroquiano tal e o padre são sempre alvos para as setas afiadas das dicas e tricas. Temos de ser fortes. Digo aos mais atingidos. Temos de pensar em Deus e que a Ele temos de agradar. Temos de ter compaixão pelos que falam. Rezar por eles. Porém, às vezes, até essas palavras têm de ser medidas, porque o padre disse aquilo que eu agora quero dizer.
Um dia Jesus disse que um profeta não era bem-vindo na sua terra, e na ocasião, conta o Evangelho, deixou de fazer muitos dos milagres que queria, porque não era bem interpretado. Às vezes os nossos padres e muitos dos nossos leigos deixam de fazer muita coisa porque não querem alimentar as dicas e tricas de uma paróquia.

sexta-feira, outubro 01, 2010

A minha tarefa

(IN)COMPLETA 1
autoria Alexandra
Bateu à porta dez vezes seguidas. Ou por falta de respeito, ou por pressa, ou por acumulação de nervos. Abri a porta de rompante. Não conhecia o rapaz. Teria os seus dezoito anos. Cabelo desgrenhado, à moda. Calças rasgadas no joelho, à moda. Piercing na sobrancelha, à moda. O suor aparentava a corrida. Preciso falar, padre. Preciso que alguém me ouça. Ao primeiro olhar, apeteceu-me dizer que estava ocupado. Não era pela apresentação, mas pelo tom da voz. E foi o mesmo tom que o deixou entrar para o escritório. Imaginei tudo e mais alguma coisa. Álcool. Droga. Sexo. Fuga de casa. Falta de dinheiro. Mas o tom da voz fez-me pensar naquele Cristo que nós queremos ser. Entra em minha casa. Procurai e abrir-se-vos-á. Sentou-se logo, sem pedir licença. Sentei-me também. E disse para mim. Confia em Deus. Disse-lhe o mesmo. Confia em Deus. Sabe, vim agora de estar com outro padre que me fechou a porta. Não me deixou entrar em sua casa. Quis esquecer o tom de voz, mas ela ecoava nos meus ouvidos. Por momentos fechei os olhos... Pensei no outro. Na porta fechada. Estremeci e abri os olhos. Continuava ali sentado. O seu rosto tornava-se inexpressivo. Apenas umas lágrimas silenciosas iam caindo. Olhei-o sem o ver. Hesitei e duvidei. Fiquei parado, impotente. Aquela expressão de infinita solidão, de abandono, fez-me lembrar Ele. Lentamente levantei-me. Ele assustou-se. Não me mande embora. Não, só te quero abraçar. Estendi os meus braços fortes para aquele corpo frágil. Compreendi que aquela também era a minha tarefa: a mesma que escolheste para Ti. Dar a vida pelos outros. Os minutos passaram. Não ouve palavras... fiquei ali parado simplesmente a abraça-lo. Fiquei no mesmo lugar depois de ele sair. As minhas pernas quebraram, lentamente os meus joelhos tocaram o chão. Uma lágrima desceu pelo meu rosto. Uma lágrima de gratidão. Obrigado por me fazeres semelhante a Ti.
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E aqui está a minha escolha. Foi difícil efectuá-la, dada a diversidade de assuntos, conlusões, reflexões e escritas que aqui colocastes. Escolhi a da Alexandra (A Minha Tarefa) pela identidade e personalidade do confessionário captadas. Gostei que me colocasse assim. Tomara ter sido verdade.
Gostaria de mencionar honrosamente a TiAna (Corda Bamba) e a Joana (Nossa Igreja). Não escolhi a Joana porque assumi que apenas escolheria um texto. Não escolhi a TiAna por uma questão de escrita, pois eu não costumo usar muitas reticências. Além disso falta um final que seja resposta.
Acrescento ainda que alguns dos textos necessitariam, a meu ver, deste tipo de final que fosse resposta ou que obrigasse a uma reflexão mais profunda ainda. Porém, gostei muito do que li. Espero que o resto dos meus "penitentes" também tenha gostado. Há por aí muita gente a pensar parecido comigo, a sentir parecido comigo, a escrever parecido comigo. E foi muito interessante perceber como é possível conduzir um texto para muitos sentidos e sensações. Obrigado a todos. Qualquer dia repetimos a experiência.
Abraço amigo a todos os que contribuiram para a (In)completa 1

sábado, setembro 04, 2010

(in)completa 1

Bateu à porta dez vezes seguidas. Ou por falta de respeito, ou por pressa, ou por acumulação de nervos. Abri a porta de rompante. Não conhecia o rapaz. Teria os seus dezoito anos. Cabelo desgrenhado, à moda. Calças rasgadas no joelho, à moda. Piercing na sobrancelha, à moda. O suor aparentava a corrida. Preciso falar, padre. Preciso que alguém me ouça. Ao primeiro olhar, apeteceu-me dizer que estava ocupado. Não era pela apresentação, mas pelo tom da voz. E foi o mesmo tom que o deixou entrar para o escritório. Imaginei tudo e mais alguma coisa. Álcool. Droga. Sexo. Fuga de casa. Falta de dinheiro. Mas o tom da voz fez-me pensar naquele Cristo que nós queremos ser. Entra em minha casa. Procurai e abrir-se-vos-á. Sentou-se logo, sem pedir licença. Sentei-me também. E disse para mim. Confia em Deus. Disse-lhe o mesmo. Confia em Deus. Sabe, vim agora de estar com outro padre que me fechou a porta. Não me deixou entrar em sua casa. Quis esquecer o tom de voz, mas (...)
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Se queres ser tu a decidir o rumo das histórias e textos deste "Confessionário", então o "(in)completa" é para ti. Terás oportunidade de imaginar o final do texto e seres o seu autor. Aliás, o melhor final será publicado como post. Considero que esta é uma nova etapa do Confessionário, pois o "(in)completa", como lhe vou chamar, pretende ser um novo espaço para uma participação mais activa de cada "penitente". Ao mesmo tempo, servirá as ocasiões ou épocas em que a minha disponibilidade for menor, como é agora o caso, dado que vou estar de férias.
As regras são simples:
  1. Para participar, deves enviar o teu texto como "coment"
  2. deves dar um nome ao texto (com maiúsculas)
  3. deves repetir a última frase na íntegra, retirando as reticências.
  4. deves assinar no final, mesmo que seja com pseudónimo
  5. deves esforçar-te por não alongar muito o texto (no máximo 600 caracteres, isto é, cerca de 125 palavras)
  6. deves respeitar o espírito e personalidade do "Confessionário dum Padre"
  7. se o texto for, de alguma forma, abusivo, não será publicado
  8. podes participar com o máximo de 3 textos

N.B. Também poderás comentar nos coments os textos dos participantes; se achares necessária mais alguma regra, informa-me!

Obrigado, amigos. E boas férias!

sábado, agosto 14, 2010

Que dizer quando apetece berrar ou calar?

Caminho a passos largos, desconcertados e rápidos. Vou ao confessionário falar com o padre. Entro e bato a porta. Não é com força, mas ouve-se bem a inquietação. Estou dum lado para falar. Estou do outro para ouvir. Dirijo-me a mim próprio e digo como é isso? Que dizer daqueles que vão acompanhar o falecido no funeral, mas que ficam do lado de fora da Igreja, acompanham o caminho até ao cemitério em amenas cavaqueiras com os parceiros que se colocarem ao lado e que precisam por as conversas em dia. Ou as mexeriquices. Chegam ao cemitério. Encostam às boxes. Do lado de fora do muro. Continuam a cavaqueira. Acabam as exéquias e regressam com a consciência tranquila para casa. Que dizer?! Que dizer daqueles que enchem as igrejas na bênção dos ramos, mas são capazes de sair após a bênção. Ou vão naquele dia e não aparecem em outro. Que dizer daqueles que querem e exigem baptizar os seus filhinhos queridos, de preferência quantos antes. O antes que aconteça algo. E não colocam sequer a hipótese de casar com a bênção matrimonial de Deus. Que dizer daqueles que enchem a praça para ver a procissão passar, porque tem de passar, e eu tenho de estar para ela passar. Tão só isto, que eu não preciso caminhar na procissão e muito menos ir à missa. Gosto mais dos santinhos a passear do que Deus lá na missa. Que dizer daqueles que batem no peito porque têm um peito do tamanho da religião, mas depois vivem apontando os dedos, atirando nos outros com os seus murmúrios e comentários?
Como é isso?! E como é aquilo?! E aqueloutro ou aqueloutra coisa?! Que cristãos são?! Que amigos são?! Que gente é?! Que respeito possuem?! Que rituais cumprem?! Que orações cumprem?! Que enganos professam? Que vida vivem?! Que fé é essa?!
Acho que a palavra Fé soou mais alto porque do lado de dentro dei um salto na cadeira. E, do lado de fora, esperei pela minha resposta. O que obtive? Um longo silêncio.

sexta-feira, agosto 06, 2010

Estou a ficar velho

Olho para o meu pai e penso. Estou a ficar velho. E depois penso na vida que não tem tempo. Ou tem um tempo que se vive, mas que não é a vida. Engraçado que fazemos tudo para medi-lo como se fosse a vida. Medimo-lo com segundos, minutos, horas, dias, semanas, meses, anos, mas ele é sempre um algo que está a passar. Ainda agora era e já não é. Por isso apenas dou conta que deve existir um tempo, mas que a vida não anda com ele. A vida é mais do que o tempo. Está para além do tempo. Depende mais de nós do que do tempo. Depende mais de Deus do que do tempo. Depende mais da intensidade que da longevidade.
Estou a ficar velho. Aliás, estamos sempre a ficar velhos. E ponto final. Mas até aqui não pensava nisso e agora penso. Essa é que a é a diferença. Aqui há uns anos atrás, sentia que ainda tinha muito para viver e não pensava senão em viver. Ou melhor, nem pensava que tinha muito para viver. Simplesmente vivia. Agora começo a pensar que rapidamente a vida corre e nós somos apenas quem a vive neste tempo que, constantemente, ainda agora era e já não é.
Não tenho medo de morrer. Já há muito que tenho a certeza de que esse momento é a plenitude da vida e do amor. A plenitude do encontro com Deus. Mas existe algum temor dentro de mim perante aquilo que posso perder entretanto. As forças, as capacidades, as energias, a memória, a elegância, a sensatez. Resta-me a certeza de que as virtudes não se perdem. Porém, quando estiver reduzido às virtudes e àquilo que os outros podem fazer por mim, que será desta missão que Deus me entregou? Que será da minha vida? Como me poderei ainda gastar nela? Que me pedirá Ele que eu faça ou seja nessa ocasião? Que tempo será o meu?
Olho para mim e penso. Estou a ficar velho.

sábado, julho 31, 2010

O caso descaso!

Dirijo-me à conservatória do registo civil. Vou apressado porque é o último dia para entregar a acta do casamento de sábado. Temos três dias úteis para o fazer. Esqueci de retirar os óculos de sol. Está um calor insuportável. Entro e tudo se faz escuro. Continua, porém o calor. Estavam várias pessoas na fila de espera. Os padres já são conhecidos por tantas actas que entregam. Apesar de ser uma entrega simples e rápida, não quis ultrapassar ninguém da fila. Porém, de entre o escuro reconheço uma paroquiana. Olhamos um para o outro. Por aqui, padre? E tu também por aqui, Sofia? São as perguntas óbvias, como se não tivéssemos percebido que estávamos lá. Eu tinha a desculpa dos óculos escuros. Ela tinha a desculpa de estar de costas. Mas fizemos a aproximação normal das pessoas que se conhecem bem. Então que faz? Perguntou. Trago uma acta de casamento. Por acaso é do casamento deste sábado na paróquia. E tu? Trabalha num escritório de advogados e trazia um pedido de divórcio. Fiquei incomodado. Mas está a tornar-se normal e, sem querer, tentamos que seja normal para nós. Conheço? Tornei. São o José e a São, padre. Os do supermercado. Os meus olhos estavam cobertos pelos óculos e foi o que valeu. Mas fez-se ainda mais escuro e mais calor. Enquanto acrescentava um casal ao número dos casados, na mesma hora ela acrescentava um casal ao número dos divorciados. Não era propriamente novidade que as coisas não andavam bem, pois já os tinha escutado a ambos. Mas não pensei que as minhas palavras e orações não tivessem o efeito desejado. O diálogo gerou-se a partir do caso e descaso das pessoas. O caso hoje e descaso amanhã. A admiração dos que duram mais de dez anos. A admiração pelos que duram dezenas de anos. O conservador explicava que ganhava mais com os divórcios. E eu disse que as famílias, os filhos, a sociedade perdiam. Olhe que se calhar temos mais divórcios por ano que casamentos, padre. Acrescentou. A conversa prolongou-se. Mas fugi dali assim que consegui. Pena que não deixei lá a conversa. Entrei no carro. Continuava muito escuro e muito calor.

sábado, julho 10, 2010

Cumpri tudo

O Afonso veio de fora. Veio para marcar o casamento com a Susana. Apresentaram-se-me os dois à porta de casa para por os pontos nos is, que é como quem diz, para acertar o que houver de acertar. Queriam casar e precisavam saber o que era preciso. Cumpri tudo, diz o noivo. Referia-se ao baptismo, à primeira comunhão, à profissão de fé, ao crisma. Escrevo com letra pequena porque me pareceu que ele falou com letra pequena. Fiz a catequese até ao décimo ano. Faz parte deste grupo que, cada vez, se torna mais minoritário. Por isso, sorria. Cumpri tudo, padre. Ao que eu perguntei se não faltava alguma coisa. E ao que ele respondeu que tinha razão. Faltava o casamento.
E com a resposta, com tudo o que cumpriu, e com o significado da palavra cumprir, fiquei sem saber se tinha aquilo que deve ter um cristão que decide realizar este sacramento do matrimónio, ou outro, com verdade.

sábado, junho 26, 2010

Hoje entrou Deus em minha casa

Sacudi a lama das botas no tapete da entrada. E a porta abriu-se, apressada, para que eu entrasse. A filha mais velha de dez irmãos procurara-me na noite anterior para dar lá um salto a casa. O pai estava de cama, a última cama que o vai receber, de certeza, padre. Está deitado nos últimos lençóis que vai usar. Pressinto-o. Pode lá dar um salto? As palavras não eram directas, porque não queriam ser assumidas. Não queriam ser verdade no seu coração. Por isso dizia o que queria dizer sem que dissesse o que pensava dizer.
Seriam umas dez horas quando bati à porta. Sacudi a lama porque o tempo na rua nunca é igual ao tempo por dentro da nossa casa. Ela não tinha avisado o pai, para que ele não pensasse que ela pensava que ele precisava. Recordo que na rua estava frio e escuro. Nublado. Mas em casa havia um ambiente quente, claro, terno. Entrara noutra realidade. Olhe, pai. Disse a filha. Olhe quem o veio ver. Abriu os olhos, vivos, ao contrário de quase todo o corpo. Olhe. Olhou. Sorriu e disse Hoje entrou Deus em minha casa.
Não consigo descrever-vos o que senti, porque as emoções fortes, mais do que escrevê-las, vivem-se. Porém, posso garantir que naquele dia senti que valia a pena ser padre. Nem que só por uma vez na vida reconhecessem que nós éramos um caminho que Deus atravessa para chegar ao homem, já valia a pena. Não estava em causa ser confundido com Deus, porque de Deus não tenho senão o que Ele quis. Esteve em causa sentir que, independentemente do barro com que somos feitos, Deus usa-nos e molda-nos para se manifestar ao homem.

Na tua opinião, os padres são necesários?

Terminou o ano sacerdotal. Entre muitas perguntas e questões que se levantaram e levantam, achei oportuno fazer nova sondagem com a pergunta: Na tua opinião os padres são necessários para o mundo?

Para a maioria dos meus "penitentes", pelo menos 70%, a vinda do Papa a Portugal foi muito importante, como vimos em anterior sondagem. Ele é, portanto, muito importante para um país, para uma Igreja, para o mundo. Mas até que ponto os padres o são também, independentemente das suas fragilidades?

Fica a questão para reflectirmos.

Depois de responderes na sondagem do sidebar, podes deixar aqui mais clara a tua opinião.

quarta-feira, junho 09, 2010

A menina que era para ficar à porta

À hora marcada lá estavam. Ela de vestido bege, com alguns folhos mas simples, com um ramo de rosas na mão e uma fita na cabeça. Ele de fato e gravata azuis. Tinham decidido casar e baptizar a sua filha que, apesar de ir ao colo, já mexia e esbracejava. Como a circunstância era peculiar, a criança estava no colo da avó, a mãe da mãe. Poucos convidados. Muita simplicidade no acontecimento. Uma beleza de simplicidade que me agradou, e por isso, já paramentado, fui à porta recebê-los, conversar, combinar. A avó não saia do guarda-vento, a antessala da igreja, aquela parte da entrada da igreja que ainda parece ser fora da igreja. Pensei que queria acompanhar a filha e o genro. Entretanto, distraída por alguém que a chamava de dentro da igreja, a avó ia avançar em direcção ao altar quando a filha, portanto a mãe da criança, gesticula uma expressão de susto, de receio, de aflição, e quase grita para que a mãe não avance. Mãe, não passes daqui com a menina. A mãe, portanto a avó, pede desculpa e regressa ao lugar do guarda-vento. Percebi a aflição, o receio, o susto. Como percebo as confusões que muitos dos nossos ditos cristãos ainda têm na cabeça. Como percebo a mistura confusa que fazem de superstições, bruxarias, comezinhas, benzelhices e a fé, os sacramentos, a vida. Ou melhor, não percebo.
Perguntei à mãe da menina se queria ausentar a filha da sua cerimónia de casamento. Se iam separar-se naquele momento, pais e filha. Se não tinha mais sentido participar em tudo, já que era um dom de Deus. Depois expliquei que não é o lugar que faz a vida, mas o amor de Deus. Expliquei em palavras mais simples. E disse que Deus ama também os que ainda não estão baptizados ou que nunca se vão baptizar. E que o mal acontece no mundo independentemente de estarmos baptizados ou não. O que interessa é a fé com que fazemos as coisas, o amor com que celebramos os sacramentos. Expliquei em palavras mais simples para que entendessem. E entenderam.
Convidei-os então a subirmos ao altar e lá fomos os cinco, padre, pai, mãe, filha, avó e a menina que era para ficar à porta.

sábado, junho 05, 2010

Na tua opinião, o celibato dos padres...

Nova sondagem. Relacionado com o post anterior, surge a hipótese de continuarmos a reflexão, dando-lhe uma outra vertente. Será oportuno ou não o celibato dos padres? Será imprescindível ou não o celibato dos padres? Radicará ou não na sua vocação ministerial?

Podes comentar aqui as tuas respostas ou as votações que forem surgindo, depois de responderes na sondagem do sidebar!

sexta-feira, maio 28, 2010

As mulheres que se apaixonam pelos padres.

Padre, não sei que sinto, mas sei que sinto algo pelo padre da minha paróquia. Por mais que me esforce em ver nele o sacerdote, não consigo deixar de pensar nele como homem. Já tentei afastar-me, mas procuro-o na confissão, na Eucaristia, nas palavras que diz e nos apertos de mão que faz. Vejo em cada um dos seus apertos de mão um aperto no meu coração. Pior que isso é imaginar que em cada aperto está um beijo discreto. Ele cuida a distância com o aperto de mãos. Mas sentir a sua mão na minha, no meu tacto, pesa mais que um beijo na face, porque este passa mais rápido e não me demora nos pensamentos. O senhor é padre. Sabe, de certeza como pensam os padres, como sentem, como amam, como se apaixonam, como são fiéis ou não, como conseguem ou não viver o celibato. Diga-me. Será que ele me pode amar um dia. Será que devo deixar crescer em mim este desejo? Eu não quero afastá-lo de Deus. Mas também não queria que Deus o afastasse de mim.
A conversa aconteceu por email, num anonimato que entendo. Da mesma forma respondi, não tanto pensando no padre que se pode apaixonar ou no padre que pode discordar do seu celibato. Antes no padre que quer ser fiel nesta forma de entrega a Deus. No padre que não quer pensar em viver de outra forma. No padre que está distraído e não deu conta que a sua vocação está atraindo alguém de forma mais intensa que a intensidade de Deus. Não sei se fui correcto, porque a vontade de Deus é que todos sejamos felizes, quer nas nossas opções, quer na nossa forma de deixar que a vida aconteça. Mas depois de carregar na palavra “enviar”, não consegui deixar de me questionar. As mulheres que se apaixonam pelos padres sentem-se atraídas pela pessoa ou pelo padre? O que as seduz é o gesto do padre ou o carinho do homem? O padre ou o homem que está dentro do padre? E caso os padres correspondam, fá-lo-ão pelo vazio que têm ou pelo amor que têm? Para viver a sua afectividade ou para a sossegar?

quinta-feira, maio 20, 2010

O senhor que agradece tudo

O Francisco mora numa quinta ao lado da paróquia. Era pastor. Agora está reformado. Reformou-se do trabalho, das forças, das vidas. Passa a maior parte do tempo sentado, pois as pernas não ajudam. Usa muletas. Estas deviam servir para andar, mas servem mais para suportar o peso. Por isso tem dificuldade em ir à missa. Demora mais de uma hora para lá chegar. Já não tem dentes. Mas isso não impede de sorrir, de me sorrir, e de acenar com a cabeça várias vezes durante a homilia. Há dias saiu-se com É assim mesmo. E ria. É daqueles com quem o diálogo acontece com mais frequência nas homilias, porque está atento e não se coíbe de responder, mesmo que eu não tenho feito perguntas. Então quando temos um dos evangelhos que fala do Bom Pastor é que é vê-lo dizer Sim, senhor. É mesmo assim. Digamos que é uma pessoa cansada, sofrida, doente. Mas para quem a vida tem sempre um paladar especial.
Há dias cruzámo-nos à entrada da Igreja. Eu apressado. Ele com a calma das muletas. Perguntei-lhe como estava. Abriu a boca sem dentes e sorriu. Muito bem, senhor padre. Eu tenho sempre muito que agradecer. Digamos que passo a vida a agradecer. Acredite, padre, agradeço-lhe tudo. E eu, pela idade avançada e pelas limitações, pensei que se referia á vida que tivera. Por isso perguntei-lhe se agradecia a vida que tivera. Ó, padre, agradeço a vida que tenho. Agradeço tudo, tudo. E não se cansava de repetir. Tudo. Tudo

sexta-feira, maio 14, 2010

Que achaste da vinda do Papa a Portugal?

Nova sondagem. Nova reflexão. O objectivo é pensar quer nas consequências quer nas possibilidades que esta viagem trouxe ou vai trazer a Portugal. A ideia é deixar que o nosso coração se explique, que a nossa fé fale, que a nossa comunhão transpareça.
Como classificarias a viagem do Papa a Portugal?
Podes comentar aqui as tuas respostas ou as votações que forem surgindo!

terça-feira, maio 11, 2010

Se eu fosse Papa

Não me perguntem se a pergunta tem alguma pretensão, porque não tem. O barro com que se fazem os Papas não é de certeza o barro de prato onde como ou onde comi. Não me perguntem se é uma pergunta, pois pode ser apenas uma afirmação.
Quando era pequeno, aí com os meus oito anos, imaginava que os Papas e os bispos não podiam senão ser santos. Hoje sei que é a missão de cada cristão. Imaginava-os sem limitações, defeitos ou pecados. Hoje sei que não há ninguém no mundo que não os tenha. Há apenas aqueles que se esforçam mais para alcançar a santidade, aqueles que não estão para aí voltados, aqueles que não se esforçam e aqueles que se esforçam, mas não conseguem. Sem dúvida que faço parte do último grupo. Vale-nos o Amor de Deus que será bem maior que a nossa vida. Quero crer que os bispos e os papas fazem parte do primeiro grupo. Mesmo que, muitas vezes, pense diferente do que creio ou quero. Mas isso é a Igreja de Cristo, santa e pecadora, feita de humanidade. Mas isso somos todos nós, homens que não somos deuses. Mas isso faz parte do sonho de Deus que nos ama acima de tudo nas limitações e fragilidades. Mas isso faz parte das afirmações de Jesus que disse vir para os pecadores.
Por tudo isto sei que os Papas são como os outros seres humanos. Por isso sei que os bispos são como os outros seres humanos. Por isso sei que os padres são como os outros seres humanos. Por isso sei que somos Igreja. Por isso sei que os Papas não são mais do que eles próprios. O que os faz diferentes não é a vida, mas a missão. O que nos faz diferentes não é a vida, mas a missão. O que nos faz de Cristo não somos nós, mas é Cristo. O que nos faz cristãos é Cristo.
Por isso se fosse Papa, era apenas eu.

sexta-feira, maio 07, 2010

Hoje não faz escuro aqui, mas cinzento

Tinha saído de casa porque não estava lá muito bem. O dia estava frio. Eu também. Era daqueles dias em que vejo muita televisão. Quer dizer, olho muita televisão. E mudo de canais. São quatro. Mas parecem-me vinte e um. Não sei o que está a passar. Olhos fixos nos pontinhos do écran. Tenho o casaco comprido vestido porque não o despi. E o cachecol. Era um desses dias. Daqueles em que vejo muita televisão porque não vejo mais nada. Na rua fazia um escuro danado. Não o distinguia. Como se houvesse um lado de lá e um lado de cá e ambos estivessem pintados com a mesma cor, o escuro. Não havia ninguém àquela hora. Mesmo que houvesse, acho que não ia dar por isso. Percorria a rua do cemitério, a pé, quando me pareceu, Não. Não pareceu. Era mesmo a sonhar. Estava ali sozinho.
Entro na Igreja. Entro no confessionário. São 03 horas da manhã. Está apertado e sinto-me sufocar. Hoje não faz escuro aqui, mas cinzento. Nublado. É um daqueles dias em que me sinto sozinho. E nem tenho vontade de falar comigo. Os padres têm dias assim. Se calhar todos temos dias assim. Por isso, volto-me para Deus e murmuro: “Estás a ouvir-Me!”

sexta-feira, abril 30, 2010

o chocolate

Depois de desfiar um sem número de conflitos interiores, de infelicidades, de situações e problemas, acabou por dizer que a sua vida não tinha sentido algum. Que era completamente infeliz. Já não acreditava nas minhas palavras da homilia do outro dia, quando eu afirmei que Deus nos queria felizes e que a salvação prometida não era outra coisa senão a felicidade. Então porque Deus não interfere nas nossas vidas a fim de nos fazer felizes, padre? Se Ele nos quer felizes, porque permite que não o sejamos? Enquanto falava, remexia os dedos uns nos outros, revirava os olhos para a porta, como se tivesse medo desta se abrir e trazer mais um problema. Apesar de zangada com deus, como ela afirmava, no fundo, esperava Dele, através de mim, uma resposta, um sinal, uma forma de descobrir o que é isso da felicidade.
Expliquei que devemos viver felizes com o que temos e não com o que não temos. Mas isso não chegou. Ela era demasiado jovem para aceitar aquilo que tem, quando ainda deseja tanto da vida. Por isso acrescentei. Não há gente feliz e gente infeliz. Não há felizes e infelizes. Há é quem consiga olhar as coisas, mesmo as adversas, com olhos de quem quer encontrar a felicidade. E há quem só veja infelicidade nas coisas. Há quem fique preso nas adversidades que acontecem, impedindo que o seu coração perceba a quantidade e a qualidade das coisas belas que acontecem nesse mesmo tempo. Assim nunca há espaço para ser feliz. Olha a vida como quem quer ser feliz e não como quem quer a felicidade dada. A felicidade existe em si, mas tem de procurar-se.
Tudo depende da forma como olhamos as coisas. Nunca ouviste dizer que o sabor do chocolate depende da pessoa que o saboreia? O chocolate só é chocolate porque alguém o saboreia. E pode haver mesmo quem não goste de chocolate. Ou pelo menos deste chocolate. Ou daquele. Ao que ela, trocista, como que delambendo os lábios, disse. Nunca tinha pensado nisso, padre. Tem por ai um chocolate para mim?
Meti as mãos ao bolso. Fiz o gesto de retirar algo. Levantei o braço com a mão fechada. Aproximei a mão dos olhos dela. Abri. O sorriso trocista passou a sorriso de expectativa. E o meu, de expectativa, passou a malandrice. A mão não trazia nada. Estava vazia. Olhou para mim e eu disse Consegues olhar para este chocolate e saber-lhe o sabor?

domingo, abril 25, 2010

As flores que valem vidas

Tenho na minha mão direita dois ramos de flores. Na esquerda outro. Não me perguntem que flores são. São flores. Sei-lhes a cor. Amarelo e branco. Laranja. Assim meio lilás e meio amarelo. Sei-lhes o cheiro. Mas não sei dizê-lo. Sei-lhes o tamanho, que é maior que o seu tamanho real. Sei-lhes a alma, porque, dizem, ela fica no fundo de cada um e faz cada um ser o que é. Sei que cada flor costuma ter um significado, mas para mim estas flores de cores variadas significam o mesmo. Afinal não sou apenas o pastor que carrega as ovelhas, que vive a vida a curar-lhes mazelas, a gritar-lhes para que o ouçam. Sou o seu pastor. Não sei quem os lembrou, ou se calhar sei. Mas quero pensar que foi a verdade e o coração que lembraram os meus paroquianos, no seu conjunto, hoje, dia do Bom Pastor, da importância do seu pastor, isto é, eu.
Longe da minha imaginação e do meu ram-ram, a meio da eucaristia, numas paróquias a seguir à homilia, como quem diz Agora que o ouvimos, ouça-nos; noutras, no momento da acção de graças, que é como quem diz Temos muito a agradecer. Em cada uma delas eu tive a mesma sensação de não saber que dizer ou fazer. Deixar-me apenas encantar. Aqui tens, nosso pastor, estas flores, para te recordar como és importante para nós. Queremos ser o teu rebanho. As palavras não foram bem estas, mas estou a resumir as folhas que leram. Pareciam mesmo combinados. Na primeira eucaristia tive de esconder o meu rosto por entre o ramo das flores, respirar fundo, e cortar a força das lágrimas. Nas outras, apesar da surpresa ter sido igual, reconheço que a força foi mais forte e a emoção mais controlada. Fiquei sempre sem palavras em segundos. Depois falei, falei. Deixei que a minha alma falasse. Nalgumas paróquias as flores deram lugar a outras recordações. Tiveram o mesmo sabor e cor das flores.
Nesta hora, uma hora em que acontece a celebração do sacerdócio e no mesmo minuto acontece a sua acusação desmesurada, vale a pena sentir que somos importantes para alguém. Apesar das nossas fragilidades, dos nossos pecados, das nossas limitações, Deus pode usar-nos e usa-nos para se encontrar com os seus.
Ó meu único e eterno Bom Pastor, hoje senti que valia a pena ser pastor destes rebanhos que me entregaste. Deste teu rebanho. Deste meu rebanho. Estas flores valem tanto!
Amanhã vou levá-las à minha mãe. Ela entende-as tanto como eu. Ela sabe se eu as mereço ou não. E pela mesma razão, eu sei que ela também as merece.

sexta-feira, abril 23, 2010

Vais participar na visita do Papa?

Está é a nova sondagem do Confessionário. E aqui podes comentar as tuas respostas ou as votações que forem surgindo! Aproveita para reflectir sobre a importância do Papa na Igreja, na sociedade portuguesa e na tua vida.

terça-feira, abril 13, 2010

O Américo

O Américo é um homem discreto. Veste discreto. Vive discreto. Na missa senta-se nos primeiros bancos, de preferência na ponta virada para o corredor. Tem quase sempre o rosto levantado na direcção do que se passa. Os seus olhos acompanham os meus movimentos. Pode dizer-se que arregala todas as minhas palavras. Mas é discreto.
Há dias fez-se peregrino para Fátima, juntamente com outros paroquianos e paróquias e eu. Eu integrei-me, com o meu ministério, nas celebrações. Ele, com o ministério dele. Às páginas tantas somos convidados e encaminhados em procissão da capelinha das Aparições para a Igreja da Santíssima Trindade. Padres em fila, por dentro. Restantes fiéis, por fora, a acompanhar. Os padres eram o centro das atenções, logo a seguir à imagem da Senhora. Só o branco dela se impunha sobre o branco das nossas alvas e estolas.
Qual não é o meu espanto, quando, no meio de todo aquele cortejo, o Américo se aproxima de mim. Agacha-se para pegar nas bainhas das minhas calças, que entretanto se haviam descosido e estavam agora debaixo do sapato, a arrastar e a descompor a minha bela compostura. Pega nelas para as compor. Eu estático, a olhar para ele. Envergonhado. Dizia-lhe que estávamos a interromper o cortejo. Que toda a gente olhava para nós. Ele impávido, apenas afirmou. O senhor estava desarranjado e era o que me faltava que o nosso padre não andasse arranjado. Compôs a bainha e saiu da fila. Continuámos os dois, eu na minha e ele na dele. Entrei na Santíssima Trindade a sorrir. Se antes escondia o rosto com vergonha, agora levantava-o com orgulho nos meus. Afinal na paróquia somos comunidade. Uns para os outros.

segunda-feira, março 29, 2010

As lágrimas da vida

Há lágrimas que descem do rosto, percorrendo alguns sinais da cara, dos lábios, do queixo. E há aquelas que descem do mesmo rosto, caem na nossa mão, e chegam ao mais íntimo de nós. Há lágrimas que se moldam e nunca as tocamos, por mais que gostemos de quem as deita. E há lágrimas de pessoas que quase nada nos dizem, mas que tocamos como se fossem nossas. Há ainda outros tipos de lágrimas. As que mostram dor. As que escondem emoções. As que são apenas formas de dizer coisas, boas ou más. Há tantos tipos de lágrimas quantas pessoas existem no mundo. E cada lágrima conta uma vida ou uma forma de viver. As lágrimas são a sombra de quem vive. Andam sempre atrás, mais discretas. Têm a mesma silhueta das pessoas. Mas são mais escuras. Só aparecem por detrás do sol ou da luz. Estão sempre lá.
Falo delas porque hoje não as tenho, mas vejo-as. Porque ontem vi-as e fizeram-me pensar na forma como subsistem, como teimam em congelar-se a toda a hora e em desfazer-se nas horas mais partilhadas, nas horas em que se desfazem máscaras de vida, como é o exemplo das horas das confissões, sejam elas da vida ou do sacramento.
As lágrimas mais dolorosas são aquelas que se vêem no rosto de alguém que não a consegue limpar ou de alguém a quem não se consegue limpar. Tenho-me sentido muito tocado com dezenas de lágrimas que não consigo limpar do rosto de muitas pessoas que tenho confessado. Há dias foi-me mais fácil contabilizar as pessoas que as conseguiam suster do que aquelas que não o conseguiram. Senti cada uma delas, impotente, tocando-me o mais próximo possível do coração. Como se me restasse apenas beber cada uma delas, participar delas, e não pudesse secar a fonte de onde elas brotam. Quisera eu ser uma outra fonte ou ser sinal de outra fonte, a Fonte da Vida. Há tanta gente que precisa dela. Porque fizeste as lágrimas, meu Deus?

terça-feira, março 23, 2010

A faladeira

Falou. Falou. Falou. Ouvi. Acenei que sim. Que não. Sorri. Sorri mais aberto. Concordei que sim ou que não. Quase me limitei a ouvir. E foi assim que aquela confissão começou, se desenvolveu e acabou. Aliás, quase não acabava, porque a sua vontade de falar, contar, explicar, era tanta que se não fosse o adiantado da hora e da espera, ali permaneceríamos, emissor completo e receptor atento. Era o que precisava a senhora de lenço ao pescoço. Doutorada. Culta. Utilizava expressões medidas. Utilizava-as com educação, mas com a mesma vontade dos outros que têm menor educação. Faz parte daquele grupo de pessoas que usam a confissão, não porque tenham pecados para confessar, graça para obter, perdão para alcançar, mas porque não têm com quem falar verdadeiramente de si, sem esconder e mentir, sem resguardar ou esquivar. Faz parte daquele grupo de pessoas que precisam de falar ou de ser ouvidas. Faz parte daquele grupo de pessoas anónimas, que vivem anónimas e não conseguem ser anónimas. Faz parte daquela sociedade que tem tempo para tudo menos para as pessoas. Faz parte daquele grupo enorme de pessoas que aparecem nas nossas igrejas, nas nossas confissões e para as quais a nossa resposta quase nunca consegue ser diferente da resposta da sociedade, porque também nós, padres, fazemos muitas vezes parte desses grupos e dessas sociedades.
Meu Deus, temos tanto para aprender com estas conversas sem tempo e horas!

O que pensas quando pensas na Páscoa?

Está é a nova sondagem do Confessionário. E aqui podes comentar as tuas respostas ou as votações que forem surgindo! Aproveita para reflectir na tua Páscoa!

quinta-feira, março 18, 2010

Os bens que se têm ou não

Conheço uma senhora simpática. Bem arranjada. Cabelo sempre pintado e escovado. Mora numa casa grande, de pedra. Granito, para ser mais correcto. Daquele granito que se herda. Daquele granito que guarda as mobílias século dezanove ou quase. Daquele granito que protege as jóias da avó e da bisavó. Uma senhora simpática, bem arranjada, e que participa activamente na comunidade. Uma senhora que não se dedica apenas a ir ao hábito da missa, mas que activamente a vive ou tenta viver, desde o início, passando pela homilia, e continuando depois do fim.
Há dias ralhei na homilia com as pessoas que têm muito. Barafustei umas verdades que Jesus um dia barafustou. Referia-me àqueles que vivem para ter e para ter mais. Expliquei que me referia a esses. Mas a senhora simpática ficou com uma nódoa no seu entendimento, e decidiu que só eu a poderia limpar. Padre, aquilo que falou hoje inquietou-me. E fiquei a pensar que toda a gente estava a olhar para mim. Eu, pelo menos, olhei. O senhor conhece-me. Acha que eu sou dessas pessoas que precisa rever o que tem? A conversa realizou-se na sacristia, mas separada do sacristão e dos habituais amigos das risadas após a missa. Mesmo assim decidi escrever, porque aquilo que se escreve fica guardado na mão e esta pode abrir-se as vezes que quisermos, ao passo que aquilo que se diz nem sempre tem onde ficar guardado. Peguei numa caneta. Rasguei uma folha do meu bloco de apontamentos e escrevi. Não interessa os bens que tens, mas o que fazes com eles. A pessoa de fé vive com o que tem, valoriza o que tem. A pessoa que não tem fé vive com o que lhe falta, valoriza o que os outros têm.

sexta-feira, março 12, 2010

As cores de Deus

Dispostos uns atrás dos outros, sentados, com o bispo à frente, contava uns trinta padres. O tema da palestra era Fidelidade a Deus. Nada melhor para pensar na minha fidelidade ao Deus que amo. Enquanto o homem falava, eu pensava. Devia pensar no que ele gesticulava. Mas reconheço que pensava apenas no significado das roupas dos padres. Nas cores dos padres. Nas cores de Deus. Estava nos bancos do meio, mais para o fundo que para o cimo. Dava para ter um panorama geral do ambiente e da sua cor. Cinzas, pretos, azuis-escuros, um branco ou outro. Suponho que destoava com o meu vermelho. Desta vez não quis pensar mal dos que vestiam diferente de mim. Afinal eu é que era o diferente. Quis pensar que cada um veste como quer. Quis respeitar as cores diferentes da minha. Quis pensar que cada um deve ser ele próprio. Que devemos viver à nossa maneira. Mas não consegui deixar de me perguntar sobre as cores de Deus. Quais Lhe agradariam. Quais vestiria. A quais daria mais brilho. Quais teria escolhido para serem mais vida, mais alegria, mais amor, mais esperança, mais ressurreição, mais verdade. Imaginei o céu de cor cinza. Não resultava. Preto só à noite. Por isso a noite é noite. Do branco lembrei a Ressurreição. Mas à Sua volta, num céu brilhante, apenas consegui vislumbrar as cores do arco-íris, bem vivas, a sorrirem umas para as outras. E depois apresentamos esse mesmo céu, essa mesma vida, essa mesma Ressurreição, envergados de cores cinzas, pretos, escuros. Ainda desculpei os escuros, porque no meio da cor passam despercebidos e dão lugar à cor mais brilhante. Ainda desculpei os escuros com a humildade, o desprendimento, a austeridade. Mas desculpem-me estas desculpas. O Deus que eu amo pode até ser discreto, mas não se esconde no escuro. Pode ser humilde e desprendido, mas é também aquele que dá a felicidade plena ao homem. Aquele que vive uma eternidade para dar a felicidade ao homem. E não o deve fazer com pouca cor. Se Ele criou tantas cores, porque teremos nós, seus ministros, de as apagar?

terça-feira, março 09, 2010

O olhar ferido

A Manuela é catequista do terceiro ano. Boa catequista e boa mãe. Simples. Tímida. Mas nas coisas da catequese sente-se a fazer algo de Deus e por isso entusiasma-se. Ontem estranhei a sua pressa em falar-me. Preciso desabafar consigo. Imaginei que viria repetir-me aquelas que ultimamente são as reclamações habituais dos meus catequistas. Os miúdos estão insuportáveis. Não querem nada. Não os vemos na missa. Faltam muito. Distraem-se e faltam ao respeito. Usam tudo para implicar connosco. As reclamações dos catequistas estão como o tempo. Frias. Ásperas. Caem como chuva, a desoras e em enxurradas. Mesmo as pequenas tempestades, de abundantes, soam a grandes temporais. Tento pensar que é ocasional. Que a seguir vem lá o sol e que esqueceremos depressa este frio. Por isso dispus-me, com alguma displicência, a ouvir a Manuela. Como estava com as mãos ocupadas, continuei a movimentá-las, seguindo-as com os olhos. Sabe, padre, ontem uma mãe veio ter comigo com um ar muito zangado, e a primeira coisa que me disse foi A senhora feriu o meu filho!
As minhas mãos pararam e eu parei também. Continuei com os olhos nelas. Mas o pensamento voou para a Manuela. Que teria acontecido? Perguntei. Ela respondeu com a pergunta que fez à dita mãe. Como, se eu nem lhe toquei? Ao que se seguiu a resposta da mãe. Feriu-o com o olhar.
Neste momento, os meus olhos e o meu olhar deixaram as mãos e voltaram-se completamente para a Manuela. As mãos ficaram desamparadas. Não sei sequer onde as coloquei, de tão estranha me ter parecido a reclamação daquela mãe. Aos tempos a que chegámos, onde já nem com o olhar podemos fazer educação!
Garanto que a Manuela é boa catequista e não vai desistir de olhar quem quer que seja. Mas são muitas as pessoas que querem fechar os olhos ou mantê-los fechados.

quarta-feira, março 03, 2010

A senhora do xaile

O confessionário era de madeira de carvalho. Uma cortina vermelha separava-me da realidade fria da Igreja. O padre José convidara-me para confessar e acedi com amizade. O que não sabia é que me enviaria para dentro da madeira de carvalho. De cada lado estavam uns buraquinhos para se ouvir a confissão, e pouco mais. Da pessoa que ficava do lado de fora apenas se percebiam escassas formas de rosto. Nem a idade se percebia, a não ser pelo teor da confissão. Confesso que prefiro um cara a cara. Mas a experiência não estava a ser má, até que chegou uma senhora da qual percebi apenas a silhueta de um xaile pela cabeça. Começámos. Mas a senhora falava extremamente alto, de forma que a dez metros seria possível perceber cada palavra que proferia. Pedi três vezes para baixar o volume da voz. Mas a senhora do xaile possuia, supostamente, uma audição fraca ou exígua. Por isso decidi, com toda a amabilidade e caridade possíveis, até para evitar comentários impróprios dos outros penitentes, sair do confessionário e abordar a senhora cara a cara, que é como quem diz, boca a a ouvido. Assim fiz. Dei a volta. Aproximei-me dela. Toquei-lhe no ombro. Ela virou-se. Olhou-me com ar mais zangado que espantado, e prontamente falou num tom de voz ainda mais elevado. Tenha paciência. Espere pela sua vez, que agora estou eu a confessar-me. Ora uma destas!

terça-feira, fevereiro 09, 2010

Estou vivo

Olá, amigos.
A pedido de alguns, venho apenas dizer que estou vivo. hehehe.
Só não tenho tido a disponibilidade mental e espiritual que escrever neste espaço me exige!
Mas não vou abandonar-vos.
Em breve - o que o breve me exigir - aparecerei em força, a força de Deus!