As conversas particulares ou são segredos ou são receios ou são confidências. Às vezes são as três em simultâneo. Por isso entrámos no escritório para uma conversa particular. Eu sentado e ela em pé, como que para fugir na primeira dificuldade sem que eu tivesse oportunidade para agarrá-la, e como se a conversa não pudesse ser demorada.
Os pobres de hoje vivem assim, em pé para fugir, para não perder tempo, para não demorar a sensação das dificuldades, para não assumir que se precisa, para que ninguém possa murmurar a pobreza dos seus. Os pobres de hoje, que aumentaram em número e diminuíram o da classe média baixa, têm vergonha de precisar de ajuda.
O sorriso era forçado. Ter de justificar a sua necessidade precisava de um sorriso. Assim como precisava de sorrir para que os filhos sorrissem. Precisava de ajuda. Eu ouvia sem falar. Às vezes não conseguimos mais que ouvir, porque não sabemos as palavras ou gestos certos. E enquanto ela me falava das dificuldades da vida, lembrei-me de um jovem que, em tempos, decidira entrar no Seminário. Lembrei também as minhas gargalhadas quando me contaram que este, questionado sobre os motivos pelos quais queria ingressar no Seminário, respondera que assim tinha a certeza de arranjar emprego. Nada mais desapropriado, mas nada mais acertado. Emprego garantido. Trabalho sem horários definidos, mas sempre garantido. Remuneração indefinida, mas sempre garantida.
Por isso ao ouvi-la, senti-me atado. Estranhamente atado entre uma vida que escolhi por causa de Deus, mas que me facilita a causa dos homens. Reconheço que perante o meu trabalho, esforço e responsabilidade, a remuneração não é a suficiente. Mas perante a vida, os encargos e os outros, sinto-me um privilegiado. Não tenho nada. Porém, não me falta nada que, de facto, faça falta.
Escondi as mãos nos bolsos porque não sabia onde as colocar. Não fazia sentido ter uma mão aberta ou fechada. Não fazia sentido ter uma mão que não pudesse apertar outra. Era mais fácil escondê-la, atá-la, cerrá-la. Quando nos despedimos, retirei-a do bolso e mais o que lá estava. Mas o que é um peixe num mar imenso?! Sobretudo quando não se tem cana de pesca, rede ou barco?!
Claro que ser padre não é um emprego no verdadeiro sentido da palavra. É uma vocação, algo que se vive inclusive durante o sono. Ser padre define-me. Não é um atributo. Mas hoje, ao olhar aquele sorriso forçado, senti-me um privilegiado porque nunca senti o que é não ter emprego.
Os pobres de hoje vivem assim, em pé para fugir, para não perder tempo, para não demorar a sensação das dificuldades, para não assumir que se precisa, para que ninguém possa murmurar a pobreza dos seus. Os pobres de hoje, que aumentaram em número e diminuíram o da classe média baixa, têm vergonha de precisar de ajuda.
O sorriso era forçado. Ter de justificar a sua necessidade precisava de um sorriso. Assim como precisava de sorrir para que os filhos sorrissem. Precisava de ajuda. Eu ouvia sem falar. Às vezes não conseguimos mais que ouvir, porque não sabemos as palavras ou gestos certos. E enquanto ela me falava das dificuldades da vida, lembrei-me de um jovem que, em tempos, decidira entrar no Seminário. Lembrei também as minhas gargalhadas quando me contaram que este, questionado sobre os motivos pelos quais queria ingressar no Seminário, respondera que assim tinha a certeza de arranjar emprego. Nada mais desapropriado, mas nada mais acertado. Emprego garantido. Trabalho sem horários definidos, mas sempre garantido. Remuneração indefinida, mas sempre garantida.
Por isso ao ouvi-la, senti-me atado. Estranhamente atado entre uma vida que escolhi por causa de Deus, mas que me facilita a causa dos homens. Reconheço que perante o meu trabalho, esforço e responsabilidade, a remuneração não é a suficiente. Mas perante a vida, os encargos e os outros, sinto-me um privilegiado. Não tenho nada. Porém, não me falta nada que, de facto, faça falta.
Escondi as mãos nos bolsos porque não sabia onde as colocar. Não fazia sentido ter uma mão aberta ou fechada. Não fazia sentido ter uma mão que não pudesse apertar outra. Era mais fácil escondê-la, atá-la, cerrá-la. Quando nos despedimos, retirei-a do bolso e mais o que lá estava. Mas o que é um peixe num mar imenso?! Sobretudo quando não se tem cana de pesca, rede ou barco?!
Claro que ser padre não é um emprego no verdadeiro sentido da palavra. É uma vocação, algo que se vive inclusive durante o sono. Ser padre define-me. Não é um atributo. Mas hoje, ao olhar aquele sorriso forçado, senti-me um privilegiado porque nunca senti o que é não ter emprego.