terça-feira, novembro 28, 2017

Será o padre um homem como os outros?

É hábito que, sobretudo em ambiente de café, quando aparece um padre e se senta numa mesa tal como os outros circunstantes desse espaço, se façam afirmações do tipo O padre é um homem como os outros. É a frase típica quando se quer dizer que o padre também pode cometer excessos, beber uns copos, participar numas farras, bailar ou divertir-se. É curioso que, em muitas destas ocasiões, o padre é, como se costuma dizer, mirado e remirado com desconfiança. Mas mesmo assim dá origem à famosa expressão que serve como justificação para dizer que o padre também pode ter os seus deslizes ou fragilidades. Preferia pensá-la como se fosse o mesmo que dizer O padre é cá dos nossos. Mas até isso é excessivo, se for para exprimir que faz parte do grupo dos boémios. Melhor seria que fosse para dizer que é um dos nossos no sentido em que é o nosso padre. 
Na minha modesta opinião, um padre não é propriamente um homem como os outros. É homem como os outros. O que é substancialmente diferente. Aliás, ninguém é igual a outro. Não queremos que o padre seja igual a qualquer outra pessoa, e se o fosse, que essa pessoa fosse Cristo. Mas até isso poderia também ser excessivo, porque não há outro Cristo que não o próprio Cristo. A nossa almejada configuração a Ele nunca poderá ser uma transformação na sua pessoa. Isso mesmo me diz que é arriscado dizer que o padre deveria ser um outro Cristo, ou como alguns documentos da Igreja referem, um alter Cristo. A configuração com Ele, une-nos a Ele, coloca-nos no seu íntimo, tal como o colocamos a Ele no nosso íntimo, mas nunca nos transformará n’Ele. Bom, mas parece que me estou a distanciar do que queria dizer sobre O padre é homem como os outros. Dizia eu que não me parece uma afirmação acertada. Não significa que eu não queira que os padres sejam homens. Mal deles, se fossem anjos ou um outro ser divino que não tivesse os pés na terra. Não são seres sobre-humanos ou dotados de uma qualquer forma que não seja humana. São seres humanos, que, tal como todos os seres humanos, têm debilidades. Do mesmo modo, têm gostos, pensamentos, sentimentos, opiniões, formas de viver como toda a gente. Mas um padre não tem de ser igual aos outros, tanto como não tem de ser diferente. Tem de ser tão só um padre que é homem como os outros.

sexta-feira, novembro 24, 2017

coração de Deus [poema 162]

Aperta-se o coração, por não respirar
Cada vez que o nó mais se aperta em si
Míngua e desaparece, por falta de ar
Quando não se encontra dentro de ti

Ó Senhor deste coração, que aparentas fugir
Quando parece que não há mais para onde ir

Não venhas a mim, mas ao que é meu
Coração encarnado de tanto sangrar
Quando a noite cai sobre o céu
E deixa de ser para te poder amar

Todo teu, no teu que ser mais especial,
O Coração

terça-feira, novembro 21, 2017

Relações pré-matrimoniais e o pecado

Não interessa propriamente o teor da conversa, que ocorreu ao telefone. Mas interessa referir que, entre outras coisas, falámos sobre as relações pré-matrimoniais. Como se sabe, grande parte dos jovens que decidem casar pela Igreja, hoje, já vivem uma vida em comum e possuem uma vida sexual activa. Por muito que possa custar, é um dado adquirido, perante o qual nem sempre se sabe que pensar. Neste sentido, ouvi do lado de cá da linha de telefone, o que a pessoa do lado de lá disse sem constrangimentos. A relação sexual de quem se ama, mesmo antes do casamento, é menos pecado que andarmos zangados uns com os outros. Porque a primeira, em princípio, é feita com amor, e o segundo é feito sem amor. Eu não sei se concordo com uma afirmação assim tão arriscada. Mas é inegável que o pecado é uma ausência de amor, e o que é feito com amor, em princípio, não é pecado.
A conversa deixou-me a pensar. Deixou-me a pensar sobretudo numa Igreja que, às vezes, concentra demasiadas energias nas questões morais ou sexuais. Para mim, a Igreja não é um conjunto de regras, mas uma forma de viver, tal como a fé não é um mero assentimento a determinados dogmas ou virtudes, mas uma configuração com uma pessoa, Cristo. É preciso humanizar mais a Igreja. Não no sentido de que seja mais mundana, mas no sentido de que seja mais de Deus. O Reino de Deus não é uma construção religiosa para uma conduta religiosa, mas uma dinâmica para um mundo mais humano. Creio que precisamos de uma pastoral humanizadora, não tanto no sentido filosófico, antropológico ou sociológico, mas no sentido cristão da palavra, isto é, uma pastoral que humanize a vida para a levar à plenitude de sentido e de felicidade que o Pai nos concede. Talvez assim, comecemos a olhar-nos uns aos outros com menos olhares reprovadores e com o olhar misericordioso de Deus. Talvez assim a Igreja pudesse explicar aos jovens que as melhores relações são aquelas que, por amor, conseguem trazer mais felicidade à nossa vida.