segunda-feira, setembro 26, 2022

Os pecados simplesmente

A senhora Antónia, que o nome me parece bem para a circunstância, faz parte do grupo de pessoas que tem medo de Deus por causa de achar que Deus castiga quem peca. No mínimo com o inferno. Por isso anda de roda dos padres à procura de sítio para entrar no céu, presa a alguma batina. E não se cansa dessa missão. Volta e meia, volta à carga com a sua aflicção. 
O pecado, minha estimada senhora Antónia, não existe para termos medo de viver. Existe como forma de ser pedra no caminho, e tanto pode servir para asfaltar a estrada, como pode servir para tropeçar na estrada. Viver o pecado com medo é o mesmo que ter medo da criação de Deus e do projecto de Deus para a criação. Como se Deus inventasse a criação de forma errada, por engano ou lapso. Como se Deus quisesse humilhar a sua criação imperfeita e assim deixasse claro quem mandava e quem tinha de obedecer. Como se Deus tivesse criado a humanidade para ter pena de nós. Não. Os pecados não são uma muralha. São uma ponte. São a humanidade que caminha na direcção do Deus perfeito e feito de amor. Perfeito no amor. O Deus que nos criou imperfeitos para nos amar como somos, na necessidade de caminhar para ser melhor. Esse caminho a que chamamos caminho da santidade.

A PROPÓSITO OU A DESPROPÓSITO: "Sinto-me uma pecadora"

5 comentários:

Cisfranco disse...

Caro Padre do Confessionário
A srª Antónia vive cheia de medo porque no passado lhe ensinaram que o Inferno é o castigo dos pecadores. As pregações sobre o pecado e o Inferno enchiam as pessoas de medo. Também a ideia do Deus castigador está presente em todo o Antigo Testamento. Foi Deus que arrasou Sodoma e Gomorra. Deus é terrível e castigador. Havia (e ainda há) pregadores que fazem filmes de terror que amedrontam alguns e afugentam a maior parte. Há textos aterradores da Bíblia que ainda são lidos nas leituras da Missa apesar de todas as reformas. Quando isso acontece fico sempre com a ideia de frustração e quando o leitor termina dizendo "palavra do Senhor" vejo isso como fantasia dos homens, muito distante daquilo que Jesus ensinou. Contudo também há pregadores que falam do Inferno de forma cativante como presenciei ainda no domingo passado em que foi lida a parábola do rico faustoso e do pobre Lázaro. Foi tão cativante ouvir esse pregador (um padre já idoso duma instituição missionária) que no fim da Missa, estando eu nos últimos lugares da igreja, fui por ali acima até à sacristia e, pedindo licença para o cumprimentar disse-lhe que tinha feito um grande sermão. "Eu fiz um sermão?!" - diz-me ele. Foi uma homilia simples mas cativante que não se encontra todos os dias.

Anónimo disse...

"Os pecados não são uma muralha. São uma ponte."

muito bom

Ailime disse...

Boa noite Senhor Padre,
Gostei da forma brilhante como explicou o pecado e os três últimos períodos do texto resumem de forma sublime o que também penso sobre o assunto.
Ailime

Anónimo disse...








São Jerônimo, Doutor da Igreja dos primeiros tempos, viveu no século IV e é conhecido pela tradução da Bíblia e por seus muitos escritos pastorais, que foram transmitidos às gerações futuras. Ele morou dois anos em Belém, perto da Igreja do Nascimento de Jesus. Nesta Igreja, no local onde hoje se encontra a grande estrela no chão, indicando o lugar que Jesus nasceu, havia naquele tempo uma manjedoura com uma imagem do Menino Jesus.

 

São Jerônimo ia muitas vezes nessa Igreja para meditar. Numa dessas meditações pouco antes do Natal, ele contemplou, por muito tempo, o Menino Jesus na manjedoura. Ele viu que a imagem tornou-se viva e sorria. Então, São Jerônimo lhe disse: “Menino Jesus, logo farás aniversário e eu gostaria de dar-te um presente!”.

O Menino Jesus lhe respondeu então: “Se queres presentear-me algo, então, deve ser uma coisa pessoal!”.

 

São Jerônimo encheu-se de alegria e disse: “Quero presentear-te todos os livros que já escrevi sobre tua pessoa”. O Menino Jesus respondeu: “Jerônimo, isso não é pessoal. De quem recebeste os pensamentos para escreveres tanto? Esses pensamentos te foram dados por meu Pai!”.

Jerônimo refletiu e reconheceu que era verdade. Depois de um tempo, disse: “Então, quero presentear-te a minha alegria em poder visitar-te aqui”. O Menino Jesus disse: “A tua alegria é amor de meu Pai. Foi ele quem te deu a alegria e o amor!”.

 

Como ainda não tivesse acertado, Jerônimo disse: “Então, quero dar-te minha amabilidade para com os outros”. Mas nem com isto o Menino Jesus estava contente. Ele disse: “Ser amável é uma graça que meu Pai te concedeu. Nada disso quero receber de ti!”.

Por fim, Jerônimo disse: “Menino Jesus, então, vou presentear-te as minhas doenças e todas as dificuldades da vida diária!”. Ele olhou, seriamente, e respondeu: “Reflete se teus cuidados, doenças e sofrimentos não são permissões e disposições que te conduzem mais profundamente no amor e na bênção de meu Pai!”.

 

E Jerônimo refletiu, refletiu para acertar. Se tudo isso é um dom de Deus, o que me pertence pessoalmente, o que não pertence a Deus e aos outros? De repente, lembrou-se: “Sim, tenho uma vontade livre, posso decidir-me livremente”. Então, ele disse: “Presenteio-te a minha liberdade!”. Mas o Menino Jesus ainda não estava contente: “A vontade livre também foi meu Pai que te deu, mas estás perto para reconhecer o que o meu Pai não te deu!”.

 

O que darei então?

Jerônimo disse, em voz baixa: “Mas eu me sinto envergonhado em dizer que nem sempre causei alegria com a decisão da minha vontade livre!”. O Menino Jesus sorriu e exclamou: “O fato de sentires vergonha também é uma graça de Deus. Mas atrás da vergonha existe algo que não queres mostrar e é isto que pertence a ti!”.

 

Jerônimo enrubesceu e perguntou: “Mas minhas culpas e pecados podem causar-te alegria?”.

E o Menino Jesus respondeu: “A maior alegria que podes causar a mim e ao meu Pai é presentear-me todos os teus pecados, pois o amor misericordioso de meu Pai é tão grande que ele me mandou ao mundo para libertar todos os pecadores da sua culpa. Foi dado a mim fazer expiação, pelo sofrimento e morte na cruz, para que teu coração se tornasse mais aberto e amplo para o amor de meu Pai. Lembra-te que “na cruz está a salvação!”.

 

Então, Jerônimo escreveu esta meditação a todos os que querem alegrar o Menino Jesus com seus presentes. A propósito ou despropósito, amanhã não é Natal mas é dia de São Jerónimo e esta história ajuda a entender o teu texto, Padre Confessionário.

Anónimo disse...

Corrijo, disse história mas na verdade é uma homilia de S. Jerónimo. Interessante, ele tinha cá um feitiozinho... mas tinha a capacidade de ficar bem pequenino diante do Deus Menino. Acredito que foi o seu espírito de criança que conquistou o Céu. "Se não vos tornardes como crianças, não entrareis no Reino dos Céus!"