sábado, outubro 12, 2024

todos são tão Igreja como aqueles que são a hierarquia da Igreja

A segunda fase da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, sobre a sinodalidade, está a decorrer em Roma, com a participação de 368 membros, dos quais 96 não-bispos também têm voz e voto. Mais de metade destes são mulheres. A primeira fase foi como que uma libertação para expressar muitas preocupações que existem na Igreja. Em resultado das muitas auscultações pelo mundo, surgiram questões importantes, muitas delas fracturantes: a possível ordenação diaconal e sacerdotal das mulheres, o celibato dos padres, o cuidado pastoral com pessoas de diferentes orientações sexuais, a maior participação do Povo de Deus na escolha dos novos bispos, a revisão da forma como os futuros sacerdotes são preparados nos seminários, entre outras. Curiosamente, o Papa decidiu enviar este tipo de assuntos para dez grupos de estudo, com o objectivo de analisar estas questões em profundidade e lançar propostas. Para a assembleia que está a decorrer, parece-me que sobrou o essencial: como mudar mentalidades e levar a sinodalidade à prática diária na vida eclesial. Como já o disse, a mim bastava-me que a maioria daqueles que formam a hierarquia da Igreja fossem reconhecendo que não se é Igreja senão em caminho de mãos dadas com todos, e que todos são tão Igreja como aqueles que são a hierarquia da Igreja.

A PROPÓSITO OU A DESPROPÓSITO: "Igreja clericalizada"

11 comentários:

JS disse...

O uso da palavra "hierarquia" acaba por desmentir o que a frase final pretendia afirmar.

Confessionário disse...

Entendo porque soa a "desmentido", mas a afirmação dirige-se aos que fazem parte da hierarquia, para que entendam que os outros são tão Igreja como eles e que eles não são mais Igreja que os outros.

Anónimo disse...

O termo "tão" é que passa quase despercebido!

Anónimo disse...

Ó JS, não percebi muito bem o comentário.
Não quero defender, de maneira nenhuma, o padre.
Mas não entendi.

JS disse...

"Não quero defender, de maneira nenhuma, o padre." Caramba, até fico com pena do Confessionário... :)
Mas esta frase acaba por demonstrar o que estava por detrás do meu primeiro comentário: as palavras têm peso, sobretudo na escrita; o seu uso tem importância, devem ser utilizadas com precisão. Elas têm uma ideia, um conceito agregado para comunicar; podem ir além ou até trair o pensamento da própria pessoa que as emprega.

JS disse...

Regressando então à palavra «hierarquia» e ao seu uso pelo Confessionário na tal última frase (que foi até escolhida para título do texto). A problemática pode ser equacionada nos seguintes pontos :
- o significado corrente de hierarquia remete para a ordenação do poder, a sua estratificação em diferentes níveis ou graus de subordinação. Numa hierarquia, por inerência, não há igualdade ou equidade (a não ser dentro do mesmo nível ou patamar).
- aparentemente, o Confessionário usa o termo como sinónimo de clero, pela maneira como dá a entender que existem membros da Igreja que não fazem parte da hierarquia, não são hierarquia. Ora, essa distinção implica também uma noção de desigualdade no que se refere ao acesso ao poder e ao seu exercício.
- por fim, temos a etimologia da palavra e o seu historial: na origem, significa ordem sagrada, poder divino, com uma fronteira ténue entre a descrição e a justificação. É facto que o conceito foi instrumentalizado como meio de blindagem dos detentores do poder, apresentado no seu zénite como intocável, incontestável, absoluto. Aí, o desequilíbrio revela-se um abismo.

JS disse...

A revolução eclesial (a reforma, a renovação) passa também pela linguagem.
Lembro-me, por exemplo, do evangelho do passado domingo, em que Jesus recusa ser tratado por bom. Ou do que o Papa escreveu aos novos cardeais: que o título de “servidor” ofusque cada vez mais o de “eminência”. Há palavras que precisam de entrar em desuso.

Confessionário disse...

A Igreja, mesmo nos seus inícios, sempre foi, de certo modo, hieraquica, isto é, os cristão não eram todos iguais e havia uma certa hierarquização de funções. Com o tempo, o termo "hierarquia" foi sendo assumido, dentro da Igreja, como a estrutura eclesial da qual faz parte o clero. Nesse sentido, e apesar dos muitos avanços da teologia, continua a falar-se de hieraquia da Igreja quando se fala dos clérigos.
O que deveria ocorrer, na minha humilde opinião, numa Igreja que se quer sinodal, não é que se acabe, pura e simplesmente, com todo o tipo de hierarquização, que essa existirá naturalmente, mas que se dê uma desclericalização.
Para isso é fundamental que a tal hierarquia da Igreja, ou seja, os clérigos, assumam uma mentalidade, uma forma de entender e viver, em que todos os cristãos, pelo seu baptismo, tenham igual dignidade e possam sentir-se verdadeiramente irmãos a caminho.

JS disse...

Desclericalizar, sim, abandonando esse regime de poder sagrado (sacralizado) monopolizado por homens celibatários. E interpretando o conceito de hierarquia sempre com chave evangélica: o primeiro será sempre o último de todos e o servo de todos. É tempo de arrumar a pirâmide e substituí-la pelo poliedro.
Que os (ainda classificados como) clérigos assumam uma nova/renovada mentalidade, sim. Serão capazes de o fazer por livre iniciativa ou de boa vontade? Duvido. O caso dos abusos sexuais mostra como a mudança só ocorre depois de uma forte pressão externa (exterior à classe e até à própria instituição) e no meio de muita resistência. Mas lá chegaremos.

Anónimo disse...

A revolução soviética em marcha na Igreja. Já vimos estas utopias noutras paragens... Todos iguais...mas uns mais iguais do que os outros. Conformemo-nos ao Evangelho autêntico, isto é, como veiculado pelo Magistério e a Tradição da Igreja.

Anónimo disse...

"desigualdade no que se refere ao acesso ao poder e ao seu exercício."

Bem vindo ao direito natural e divino e à natureza politica do homem.
Todo o poder vem de Deus, ele dá-o aos que quer e não a todos. Uma sociedade não hierarquica não existe.