segunda-feira, novembro 23, 2020

As missas e a azeitona

Este domingo duas das minhas igrejas estavam a meia ocupação, mesmo descontando a meia ocupação da pandemia. Tal como eu já adivinhava, porque esta região vive rodeada de olivais. As pessoas têm de apanhar a azeitona, dê por onde der, seja em que dia for. Não é só a missa que faz parte das suas vidas. Também a azeitona faz. E por isso há épocas do ano, tal como a época das vindimas, em que as igrejas desta região se despovoam um pouco. Assim, no final das missas que ali celebrei, rezando também por aqueles que estavam na “apanha”, desejei boa azeitona, expressão típica de quem sabe o que é “andar à azeitona”. 
Já no regresso a casa, veio-me à memória um colega que, há uns anos, embora poucos, numa dessas celebrações um pouco mais vazias, por causa da azeitona, passara grande parte da homilia, zangado e a esbracejar, criticando quem tinha ido à azeitona. A parte da homilia que ainda hoje me custa mais a engolir, foi aquela parte em que ele deixou no ar o desejo de que alguns caíssem de alguma oliveira e partissem uma perna, para aprenderem que não deveriam ter faltado à missa. Ainda hoje não entendo como é possível fazer afirmações deste tipo, mesmo que nos custe presidir a uma celebração para meia dúzia de pessoas. Como se a bondade de Deus só devesse existir para com os que vão à missa. No que a mim diz respeito, eu rezo para que não caiam das oliveiras e possam voltar rapidamente à missa.

5 comentários:

Ailime disse...

Bom dia Senhor Padre,
É tudo uma questão de usos e costumes.
Na minha aldeia natal, apesar de não ser maioritariamente católica, basta existir lá há mais de cinquenta anos uma igreja evangélica, ao domingo ninguém ia para o campo.
Mas concordo que temos que respeitar e entender essa forma de proceder dos seus paroquianos.
Ailime

Confessionário disse...

Por estas bandas há vários tipos de pessoas no que a este assunto concreto da apanha da azeitona concerne (note-se que não me refiro a ir para o campo, pois por aqui as pessoas também não costumam ir para o campo aos domingos):
- há quem evite, de todo, faltar à missa, mesmo que tenha de ir a outra comunidade;
- há quem não tenha outros dias para o fazer, por causa do emprego que têm durante a semana;
- há quem vá nestes dias, porque consegue juntar mais gente disponível;
- há também quem vá nestes dias porque a missa não lhes é importante (mas também não costumam ir muito)
Ou seja, a maior parte das pessoas que vai à “azeitona” aos domingos, fá-lo porque dificilmente tem outra opção!

JS disse...

Se o padre contemplar as palmas das suas mãos, e recordar e sentir a unção nelas recebida no dia da sua ordenação...
Se o padre olhar a sua fronte ao espelho e nela vislumbrar o selo do Espírito Santo, o Dom de Deus para a missão...
Se o padre reparar no seu polegar direito, imergido dezenas, centenas de vezes nas âmbulas para ungir as crianças no baptismo, ou os enfermos na sua fragilidade...
Se o padre evocar o tempo em que, como acólito, na paróquia ou no seminário, se ocupava de preparar a lamparina do sacrário, a mais inútil das luzes...
Então só poderá ver a apanha da azeitona como uma graça de graças, uma bênção que há-de significar bênçãos infinitamente maiores.
E cantará uma e outra vez: O Redemptor sume carmen...

Confessionário disse...

Gostei, JS.
Vou acrescentar às minhas orações destes tempos da "azeitona".

JS disse...

Pode ser fundamento para a oração.
Pode ser fundamento para catequeses, desde o lugar da oliveira (e outras fruteiras) na Bíblia até ao tradicional uso pela Igreja do azeite nos exorcismos e combate contra as forças malignas.
Pode ser fundamento para alguma acção litúrgica, como o rito de acolhimento dos óleos santos (https://liturgia.pt/pontificais/Oleos_Rito_acolhimento.pdf).
Pode ser fundamento para alguma ágape, como, por exemplo, uma degustação de azeites no fim de uma missa, ou uma vendinha de bolos de azeite para juntar uns cobres para alguma actividade da catequese ou do grupo de jovens.

Saber casar natureza, cultura e religião; saber celebrar a vida.