quarta-feira, maio 13, 2020

A Igreja que faz o mesmo de sempre

Temos continuado, nestes tempos de pandemia, a fabricar uma Igreja centrada no padre, ou seja, clerical, e nos sacramentos, nomeadamente a missa, ou seja, sacramentalizadora. Com tudo o que isso tem de bom e de preocupante. Chegamos a transformar o meio num fim. Abusamos um pouco multiplicando celebrações e sinais de que, com boas intenções, conseguimos transformar o invisível e escondido das nossas igrejas fechadas, vazias e silenciadas, num certo produto de consumo e num certo proselitismo, ainda que inconsciente. O objectivo parece passar por mantermos as gentes e os crentes connosco. Com a Igreja dos padres. E nós funcionamos, mesmo sem querer, como funcionários de uma Igreja aparentemente aberta, mas realmente fechada. Ou seja, uma Igreja com cheiro a mofo, porque fechada, e em ruínas, porque não tem crentes. 
É o problema de sempre na Igreja dos últimos tempos, aquele para o qual o Papa Francisco tanto tem alertado. É o problema de uma Igreja em constante manutenção. Conservando-se. Fazendo o mesmo de sempre, embora com novos meios.

A PROPÓSITO OU A DESPROPÓSITO: "O papa e os padres"

10 comentários:

Anónimo disse...

Padre comento o teu post com uma pergunta: se te fosse dada a possibilidade de mudar a Igreja, de a transformar, de a pôr mais ao jeito do que te parece ser a vontade de Deus, como seria ela?
Diz, em gestos concretos do dia a dia, o que farias?
Maria Ana

Anónimo disse...

Bom dia Sr. Padre,
Gostei desta análise que faz, que é bem real.
Mas porque será que a Igreja tem receio de se modernizar, de se adaptar aos novos tempos?
Porque insiste ainda em usar o Latim, que ninguém entende, nas celebrações? (Eu tinha que falar nisto).
Talvez este tempo da Pandemia, fosse uma boa altura para se repensar e reinventar uma nova forma de ser Igreja.
Ailime

Confessionário disse...

Ailime,
Tenho pensado muito, como deves imaginar, nestas coisas.
E, às vezes, começo a pensar que mantemos o latinório (o que eu entendo como linguagem demasiado clerical), porque, se calhar, não sabemos fazer de outro modo. Fomos formatados nesta forma de ser e não conseguimos sair desse "sempre se fez assim".

Confessionário disse...

Maria Ana
a tua pergunta é muito interessante e a minha possível resposta completa tardaria horas e muitas linhas de texto.
Venho fazendo esta reflexão há vários anos e escrevendo sobre isso, aqui neste espaço, e noutros meios.
Sou muito favorável ao espaço dos leigos. Dar-lhes espaço e tarefas, evitando centrar em mim as coisas. Claro que tb não é fácil. Mas, pouco a pouco, tenho tentado imprimir isso nas minhas comunidades. Vou-as formando para outras perspectivas com mais espírito de “comunhão”, mais “cristocêntricas” (menos centradas na Igreja como instituição), com mais espaço à Palavra de Deus... sei lá, são tantas as tentativas de fazer diferente do “mesmo de sempre” (não porque queira ser diferente, mas porque me parece necessário não fazer o “mesmo de sempre”, tal como o Papa Francisco diz), de não concentrar tudo em missas, casamentos, batizados, funerais e festas populares!
Repara que nós, padres, criticamos que as pessoas nos peçam sempre as mesmas coisas e geralmente sem uma fé comprovada. Mas depois, em pandemia e confinados em casa, que lhes damos? Procissões de "atrelado" (desculpa a expressão). Queremos sair do ritmo das muitas missas dominicais, mas depois que lhes damos em tempo de pandemia e confinados em casa? Multiplicação de missas por internet.
Graças a Deus que tem havido quem procure dar às pessoas mais leitura da Palavra de Deus, mais contacto verdadeiro (mesmo à distancia), mais espiritualidade, mais oração, mais atenção ás necessidades, e mais espaço para serem elas próprias, criativas da sua caminhada de fé.
Eu não sou melhor que ninguém. Nem sou exemplo para ninguém. Mas sofro interiormente e, na minha luta por uma Igreja que não seja de "manutenção", encontro mil e uma barreiras que nem sempre consigo superar!

Rezemos juntos!... e também pela minha conversão!

Anónimo disse...

Obrigada por perder o seu precioso tempo a responder á minha pergunta.
A resposta foi uma lufada de ar fresco, foi como um abrir a janela e deixar entrar a brisa fresca e salutar!
Se me permite vou dar-lhe o meu testemunho.
Quando começou o confinamento senti a necessidade de rezar mais.Mas ao contrário do que fazia antes em que rezava, por exemplo pelas vitimas do mundo inteiro, passei a rezar por aquela pessoa ,que embora eu não conheça pessoalmente, mas que alguém conhecido me dizia que estava infectado. E rezei sempre até que soube que estava curada.
E passei a rezar pelo empregado que me vendeu a carne no supermercado, ou pelo que cozeu o pão que comi nesse dia, ou pelo que me atendeu no posto de combustível … pessoas cocretas que nunca vão saber que eu pedi por elas.
Não sabe o quão gratificante passou a ser a minha forma de rezar!
A Eucaristia é importante? Sim. Muito.
Para mim é como um almoço de família em que quem convida é o próprio Deus, e fico triste quando vejo pessoas que ao domingo preferem outros afazeres.
Mas como diz, há outras formas de ser Igreja.
Maria Ana

Anónimo disse...

Gostei do seu testemunho, Maria Ana. Viver como cristão no dia a dia, para mim é viver assim, não é preciso procurar coisas novas! As pessoas por quem rezou podem não a conhecer, mas, acredito, que sentiram a força da sua oração. Isto é 'comunhão dos santos". A santidade não consiste em fazer coisas grandes, mas em pôr alma nas coisas pequenas do dia-a-dia.

Anónimo disse...

Querido Confessionário,
Desculpe, mas discordo totalmente. Nesta pandemia, a Igreja não está a fazer o mesmo de sempre. Eu até ando espantada e fascinada com a criatividade demonstrada pelos Padres para animarem as Igrejas domésticas que abriram quando as Igrejas templos fecharam. À noite, quando vou rezar o terço com a minha Paróquia, estou sempre na expectativa "o que é que eles irão inventar hoje?". Há sempre uma novidade que nos ajuda a rezar e não deixa a monotonia instalar-se.
Nestes dois meses, houve muitos momentos divertidos e especiais. Fiquei comovida com as crianças a fazerem enormes cruzes de lego na Páscoa e a enviarem mensagens de dia da mãe durante o terço. Diverti-me com o despique dos concursos do oratório doméstico mais bonito, e gostei mesmo muito das procissões de atrelado (desculpe lá outra vez). Não me passa pela cabeça que a Igreja seja um mero show ou que se resuma a um conjunto de atividades lúdicas. Mas é muito claro para mim que todas estas iniciativas me ajudaram a rezar, a sentir-me apoiada pela Igreja e próxima de Deus. E quando a pandemia acabar vou ficar muiti triste se o meu Pároco deixar de cantar "Boa noite, boa noite Maria" antes de ir dormir.

Anónimo disse...

Primeiro que tudo, mudar de padres. Ar Fresco!!!

Segundo: espírito de síntese.

Terceiro: comunicação.

Quarto: saltar este, traduzindo: silêncio.

Quinto: Voltar ao primeiro.

E é isto.

Anónimo disse...

Gosto de "passar" por este blog sempre que me é possível. Até porque a personagem misteriosa do autor do mesmo, o Confessionário, torna este espaço ainda mais cativante! Pois gostaria de dar sugestões sobre como tornar a Igreja mais ativa neste mundo actual, em que uma boa parte a humanidade perdeu o gosto pelas coisas de Deus. E muitos dos mais jovens, nem sequer perderam wsse gosto porque já não lhes foi transmitido. Em consequência temos a ausência de valores. Os relatos de violência que entram pela nossa porta dentro, através dos meios de comunicação social e que nos deixam em estado de choque, são prova disso mesmo. Ficar sentado no confessionário (com letra minúscula) como fez o Santo Cura de Ars, hoje já não chega. É necessário trabalhar as "igrejas domésticas" como? É uma pergunta que me coloco todos os dias. Se por um lado, uma boa catequeze nas crianças faz nascer pequenos apóstolos, que nos deixam naravilhados. Por outro, eles deveriam ter a vida mais facilitada, os pais a que deveriam ser os principais transmissores da fé. Então deveríamos começar por eles. Hoje, Dia Internacional da Familia, somos convidados a rezar e colocar uma vela nas janelas das nossas casas. Com essa luz deixo a minha sugestão de pedir ao Espírito Santo que nos mostre que caminho, como Igreja, devemos fazer neste sentido.

Confessionário disse...

15 maio, 2020 00:14
Fico muito contente por essa partilha que dá conta do lado positivo no meio de tudo isto.
Também eu conheço muitos casos similares e positivos, que tentam formar, alimentar e celebrar a fé nas Igreja domésticas… mesmo de forma comunitária, mesmo que com uma certa distância física. É o que tento fazer, sem cair no excesso de fazer depender tudo das redes sociais.
Porém, no texto que escrevi, não falo de casos particulares. Há, de facto, muitas coisas positivas, fruto de uma enorme criatividade, nestes tempos. E isso alegra-me. A experiência que relata dá-nos conta disso. Mas também há o outro lado. E esse lado preocupa-me.
Se são coisas más? Não. Não são. Mas serão boas? Não sei.
E obviamente que não gostaria que a Igreja não aproveitasse este hora para encontrar um rumo mais em concordância com o evangelho e a fugir do “sempre se fez assim”. Mas temo, por isso escrevi, que não vá acontecer. A ver vamos.
Sou muito favorável à revalorização das igrejas domésticas como espaço privilegiado para formar, alimentar e viver (até celebrar) a fé. E depois, que haja uma família maior, a comunidade, que ampare essas igrejas domésticas.