Li há días uns artigos que falavam da famosa enciclica “Humanae Vitae”, de Paulo VI, sobre os seus avanços ou recuos na moral sexual. Li também que antes desta encíclica ser publicada, o Papa tinha encomendado uma outra, com o nome "De nascendae prolis", e que ia no sentido contrário ao da “Humanae Vitae”, sobretudo no que se refere ao uso de contraceptivos que não apenas os naturais. Também me recordo de, em tempos, ter lido qualquer coisa sobre uns meandros obscuros no processo que levou à luz a “Humanae Vitae”. Uns textos que falavam de interesses e de desinteresses. Não me recordo de tudo agora. A minha memória nunca foi fecunda.
Primeiro informo que sou a favor da vida, de todos os modos e feitios, com todas as dificuldades e sofrimentos. O maior dom que Deus nos dá a cada um não deveria ser tratado como algo descartável. Nesse mesmo sentido, sou favorável a que o acto sexual esteja sempre aberto ao dom da vida. Mas dentro da consciência das pessoas, e dentro das camas dos casais, e dentro do modo como as pessoas geram uma paternidade responsável, creio que devemos ser mais inclusivos que exclusivos. Afinal, aquela encíclica, que foi muito fracturante na altura (recorde-se que estávamos nos anos 60), que verdadeiras repercussões tem hoje, quando cerca de 98% dos católicos (refiro-me aos verdadeiros católicos que têm e vivem uma fé em caminho) usam estes métodos contraceptivos como se isso não importunasse a sua fé? É que se calhar não importuna mesmo.
8 comentários:
Muito bem lembrado. PE. MAS infelizmente o ser humano ainda usa a ingratidão.
Confessionário, sempre me interroguei como é que um padre que suposta não dorme acompanhado, se sente credenciado para aconselhar um casal a nível sexual.
Esta observação não tem nenhuma carga negativa, antes pelo contrário.
Os conselhos são sensatos mas escapa-lhes muito, são pouco abrangentes, falta-lhes a experiência por detrás de cada um.
A tua igreja deveria rever esses e outros pontos, para dignizar um pouco mais a figura e a vida do padre abrangendo dessa forma a vida dos que a vós recorrem.
"O maior dom que Deus nos dá a cada um não deveria ser tratado como algo descartável."
Uma frase que pode parecer algo estranha na boca de alguém chamado a testemunhar o dom do celibato e da castidade.
Este texto levou-me a um proverbio..."Diz o roto para o nú...
Depois de ler e reler os comentários, bem como ler e reler o texto que escrevi, fiquei com a sensação de que poderia não ter sido claro no que escrevi. A última frase é fundamental, mas pode ser entendida em tom de ironia no sentido errado. O que eu quis dizer e que reafirmo (até com base na grande maioria de paroquianos sérios e comprometidos das minhas comunidades) é que se calhar este pormenor da moral não interfere com a verdade da fé das pessoas.
Honestamente, acho que não interfere mesmo quase nada na minha fé, pois a fé para mim é muito mais que este "pormenor".
Quando Deus disso, crescei e multiplicai-vos, concerteza também queria dizer, com alguma responsabilidade de cada um de nós, e só porque eu não "concordo" com Ele neste pormenor,sobre o qual ja conversei muitas vezes com Ele sobre isso, a minha fé continua firme, e continuo a tentar que ela fique cada vez mais forte.
"Não interfere". Infelizmente, é bem pior do que isso.
Os católicos mais sérios e comprometidos tiveram de fazer uma opção; e a grande maioria escolheu ignorar a proposta doutrinal/moral da Humanae Vitae em nome da razoabilidade, do bom-senso e do pragmatismo. A situação fez grande mossa na fé católica, colocando-a num plano de descridibilidade e de irrisão que continua a deixar marcas significativas hoje, 50 anos volvidos. Os inquéritos realizados por ocasião dos Sínodos da Família foram de uma clareza terrível, se dúvidas houvesse, deste divórcio instalado no interior da Igreja.
Sim, sabemos que o tema é complexo, e que continua ainda refém do debate ideológico; sim, o estimado Paulo VI passou noites sem dormir angustiado com a decisão de publicar ou não o documento; sim, a Igreja não deixa que sejam modas ou maiorias a definir o seu caminho, nem pode deixar de apontar a meta da perfeição/santidade. Mas houve de facto um erro: não cabia ao Magistério fazer aconselhamento sobre métodos contraceptivos; e fê-lo baseado em pressupostos filosóficos desajustados da realidade.
Entretanto, tarda-se em corrigir o tiro. E o documento vai-se mantendo como vade-mecum: não faltam padres, nos cursos de noivos, no acompanhamento de casais e nos confessionários a moerem o juízo das pessoas com este fardo. Revoltante.
Concordo, JS
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