sábado, maio 23, 2015

As leituras da dona Constância

A Constância é, como o próprio nome indica, constante. É constante na sua fé e no seu querer a fé. Não faz parte do grupo daqueles que nada procuram na fé. Por isso lê coisas de Deus e tem na cómoda do seu quarto uma resma de pequenos livros. Pequenas sumas de doutrina e palavras que quase as decora para ter fé. É uma fé genuína. É uma Constância genuína. Mas apenas lê esses pequenos livrinhos, que embora bons e úteis, somente alimentam aquilo que muitos denominam de beatice. Que não aprofundam. Que não fazem reflectir. Que pouco fazem meditar. Talvez sejam a leitura que tantos anos lhe ensinaram a ler. Talvez façam dialogar com Deus. Talvez sejam a leitura que Deus quer que eles façam. Talvez, mas também talvez não.
Ela levou alguns dos seus livros à sacristia para eu ver, e aprovei-os, como se ela precisasse essa aprovação e eu fosse dono de aprovações. Dei-lhe, porém, outra sugestão. Leia a Bíblia, dona Constância. Gaste-a nas mãos, no pensamento e no coração. Leia livros com mais páginas e mais profundidade, alguns documentos do magistério quiçá. Leia para além de uma leitura que pareça fácil. Leia Deus em cada leitura.
São assim os nossos cristãos. São bons, são genuínos, têm fé. Às vezes são constantes. Falta-lhes, ou talvez não, ser mais profundos no aprofundar do mistério. É quase como amar sem aprofundar o amor.

13 comentários:

Emmanuel disse...

também num registo de "talvez" arrisco uma provocação;

a Bíblia é para os protestantes

a nós, católicos, deveria bastar o único mandamento que Jesus nos deixou (o resto são histórias)

ah, e, claro as encíclicas dos últimos três papas, sobretudo dos dois últimos que nada mais são do que desenvolvimentos pedagógicos do único mandamento

God bless you!
Immanuel

Confessionário disse...

Imannuel, diz assim o último documento do Papa, que cuido teres lido: "é preciso voltar à fonte e recuperar a frescura do Evangelho" (Evangelii Gaudium 11).
Poderia fazer mais citações onde ele fala da importância da Sagrada Escritura, vulgo Bíblia...
Assim como qualquer outro documento dos papas que referes. Por exemplo recordo um documento do Papa bento XVI que fala todo ele disso: "Verbum Domini"...

E onde encontrarias tu o tal "único mandamento" senão na Sagrada Escritura?!

Emmanuel disse...

continuando no mesmo registo "provocatório":

sim, o único mandamento vem na Bíblia e é esse o valor dela

mas bastaria pegar em João 13:34, afixá-lo, e arrumar as Bíblias na prateleira (e tirá-las de lá apenas quando quiséssemos ler umas histórias)

e quando quiséssemos aprofundar o mandamento novo ler as encíclicas e outros documentos papais mais recentes

tenho dois problemas com a Biblia: o primeiro é não ser um biblista, isto é, não saber muito do contexto histórico e simbólico da Biblia, e, o segundo, decorrente do primeiro, é pensar que essa dificulade interpretativa da Biblia pode tornar-se num instrumento do mal em certas mãos mal intencionadas ou simplesmente apressadas...

Anónimo disse...


Ó Emmanuel, apetece-me dar-te uma tareia!

Bruno disse...

Apesar de ter um conhecimento um pouco mais aprofundado do que muita gente acerca da Bíblia (li-a uma vez), não me considero um biblista. Mas um comentário como esse último é quase semelhante a dizer "afixemos a frase "um por todos e todos por um" e podemos deitar o livro "os três mosqueteiros" ao lixo".
Em primeiro lugar, esse mandamento que Jesus nos deixou "Amai-vos como eu vos Amei", decorre do dois mandamentos-"resumo" que aparecem nos Evangelhos "amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo". O problema é que este 2º mandamento já está no livro do Levítico (cap. 19).
A Bíblia é de facto uma leitura simbólica, que nem sempre é fácil (e talvez não seja de todo para pessoas se iniciarem, dada a sua complexidade), mas toda ela é Palavra inspirada por Deus (Dei Verbum nº11). Tanto no Antigo, como no Novo Testamento (aqui de forma óbvia) há referências diretas a Jesus ("E, começando por Moisés e seguindo por todos os Profetas, explicou-lhes, em todas as Escrituras, tudo o que lhe dizia respeito." Lc 24, 27). Dizer que a Bíblia se resume a um versículo é negar a importância da Páscoa/Ressurreição, dos sacramentos (todos eles instituídos por Jesus... noutros versículos), do nosso mandato de anunciadores, etc.
Apenas para finalizar, dois comentários, porque acho (não tenho a certeza que o Emmanuel se contradiz). 1 - o contexto histórico/simbólico da Bíblia conhece-se... lendo a Bíblia. 2 - Diz que a dificuldade de interpretação da Bíblia pode tornar-se num objeto do mal... tal como diz que a Bíblia é para os protestantes. A ideia que eu tenho é que nas traduções católicas há bastantes notas de rodapé para ajudar o leitor a superar essas dificuldades interpretativas, enquanto nas Bíblias protestantes não há qualquer explicação (e aqui repito que posso estar enganado). Cada um interpreta como consegue, porque se considera que tudo deveria ser interpretado de forma mais "literal". Ou seja, a Bíblia deve ser também para os católicos... e tanta falta nos faz não conhecermos aquilo que professamos e que leva a que tantos erros se ouçam nas nossas paróquias...

Anónimo disse...

Noite de sábado. Deito-me inquieta com os meus problemas. Problemas que não são diferentes dos da maioria. Excesso de contas a pagar, fantasmas do presente e do passado, saudade de quem já partiu… Amanhã é domingo. Dia em que me encontro de forma especial Contigo Senhor! Adormeço mais tranquila.
8h00 da manhã, acordo com a ânsia de saber como me Vais tocar hoje Senhor. Com ânsia de buscar força e ânimo para as cruzes que, como todos, carrego… Hoje é um dia especial. Uma pequena semente foi lançada no domingo passado, uma semente que espero ver brotar…A minha filha recebe Cristo comigo.
Reconheço e peço perdão pelas minhas fraquezas e preparo-me para ouvir as leituras – a Bíblia. Melhor do que as leituras: a Homilia. Hoje, sobre o Espírito Santo, sobre a sua universalidade, como nos toca e como nos desafia. E como eu preciso de ser tocada e desafiada por ti Senhor!
Início da oração dos fiéis e reparo que até agora só pensei em mim, nas minhas inquietações… E quero sair daqui de coração cheio não só por mim, mas também para e pelos outros. Respondo “ouvi-nos Senhor” mas penso ajuda-me Senhor a ser, nas pequenas coisas dos meus dias, para o outro.
Durante a celebração reza-se o Credo que eu não sei de cor, tal como outras orações que um católico supostamente deve saber… Não que tenha algo contra ou que tenha falta de respeito. Simplesmente não consigo decorar, nem sinto vontade de o fazer. Questiono-me muitas vezes de que forma ou se de alguma forma estou inserida na Igreja Católica.
É-me, no entanto, muito agradável de vez quando começar a ouvir as leituras e aperceber-me que conheço aquela Palavra e que sozinha consegui interpretá-la, sendo que a minha Bíblia não tem notas de rodapé…
Voltando à D. Constância e desconhecendo de que forma sente a doutrina, mas fazendo votos que a sinta de coração e como tal esteja bem mais perto da perfeição do que eu, consigo encontrar, no que foi descrito no post, uma ponto em comum com ela: a vontade de ter fé.
Nenhuma fé é inabalável e muito menos a minha…Chego muitas vezes a questionar-me se tenho realmente fé ou se tenho apenas vontade de a ter. No entanto, só quem conhece o seu verdadeiro poder tudo faz para que ela se mantenha.

SL

Anónimo disse...

"Leia Deus em cada leitura."

É exatamente disso que se trata ler Deus em cada "leitura".

Mas não foi assim, não é assim que a igreja católica romana indicou e indica... começará agora timidamente a fazê-lo porque não tem outro "remédio".
Face à proliferação de inúmeras organizações/seitas religiosas que interpretam a bíblia de acordo com os princípios e regras pelos quais se regem também esta organização terá que orientar os seus fiéis dessa forma.

A tua Constância é o produto final de uma igreja que não hesita em manter-se centrada no clero.
Uma igreja que não hesita em proteger padres corruptos.

Ontem depois de algumas horas a trocar ideias com um ex-seminarista e porque no momento apareceu o padre lá da paróquia, perguntei-lhe se sabia que o jovem tinha desistido do seminário, respondeu que sim e não disse mais nada, perguntei-lhe ou afirmei-lhe em tom de desafio e apesar do que se tem passado lá dentro nada vai mudar pois não? O bispo nada vai fazer?

Ficou calado.

Depois de refletir sobre os desabafos do jovem creio firmemente que nada vai ser feito e o comportamento menos próprio da equipa formadora vai continuar até os restantes desistirem.
O jovem dizia-me que houve várias coisas que aprendeu no seminário, aquela equipa formadora valoriza muito quem mais generoso é a nível de ofertas monetárias, depois em tom de ironia comentam à mesa que acham que vão comprar o céu, aprendeu pelo exemplo dos padres que ser servido e bajulado é ótimo, aprendeu também que é muito importante expor à mesa os pecados dos padres colegas não vão os seminaristas pensar que só eles serão exemplos aberrantes do que que é ser cristão.

Aconselhei o jovem a elevar o assunto à opinião publica, apesar desta, a maior parte das vezes não se preocupar em que algo mude, e sim em lavar roupa suja na praça publica.
Se ele avançar apoiá-lo-ei correndo o risco da excomunhão.

Estás à vontade para não publicar este comentário.

Confessionário disse...

25 maio, 2015 09:43

Não é a praça pública que resolve o assunto. Nem é a denúncia sem mais que resolve o assunto. É o diálogo libertador e, deixa passar a expressão, profético.
Não é fácil fazer isto e somos menos ouvidos do que quando vamos à praça pública. Mas Jesus transformava por dentro e não por fora!

Confessionário disse...

25 maio, 2015 09:43

Não é por necessidade em relação com outras igrejas ou profissões religiosas que a Igreja católica deve valorizar a Sagrada Escritura...mas porque ela é a fonte da nossa fé!
Durante muito tempo, numa igreja clericalizada e em confronto com a sola scriptura de Lutero, a Igreja não a valorizou. Hoje percebe-se claramente que foi errado e que se deve revalorizar... não contra, mas a favor!

Confessionário disse...

Emmanuel, depois de ler o teu 2º comentário-resposta, dei por mim a pensar nessa tua fragilidade que é ainda estares agarrado ao magistério, dispensando-te da fonte!
A Igreja não é um conjunto de normas ou doutrinas ou leis, mas um caminho que nos leva à plenitude da vida (que nós chamamos salvação). Nós só conheceríamos Jesus, que é o centro da nossa fé, a sua morte e ressurreição que é a base da nossa fé, através do relato bíblico. Por isso é necessário voltar lá!
Se me dissesses que há livros difíceis na Bíblia e que nem todos têm a mesma importância de leitura e para o nosso caminho, até concordaria. De resto, parece-me (e não leves a mal, pois não sou ninguém para ajuizar), que deves rever algumas coisas. E o que me entristece deveras é que cites os documentos dos papas, o que inclui a Evangelii Gaudium, e parece que não a leste ou se a leste não entendeste... pois nela está claro este voltar á fonte que é o Evangelho.
Um abraço muito amigo

Anónimo disse...

"É o diálogo..."
O diálogo aberto e frontal foi o primeiro passo.

"Jesus transformava por dentro e não por fora!" Uma resposta politicamente correta :( Lembremo-nos que os sinais eram visíveis, mudavam-se atitudes e comportamentos, neste caso em concreto os comportamentos mantêm-se, as atitudes continuam deploráveis.
Não se trata de julgar trata-se de alertar para a mudança de comportamento.

Emmanuel disse...

Ó Padre, não se entristeça que me inibe :)

eu estou só num registo provocatório, brainstorming, digo o que penso sem reflectir em profundidade e sem ter a certeza daquilo que digo

abraço

PS (uma última provocação): é claro que as encíclicas citam a Bíblia. O catolicismo (e eu, quanto mais não seja enquanto católico) continua a considerar a Bíblia a palavra de Deus. O meu problema é que me parece que Deus falou demais. Contou muitas histórias, algumas bem interessantes e outras nem por isso. Mas isto sou eu a falar. Quando falo nas palavras da Igreja não estou a pensar nas normas, doutrinas ou leis. Estou só a pensar naquelas palavras que desenvolvem e concretizam o mandamento novo. Finalmente, ainda sobre o mandamento novo, talvez o mais importante nele seja o silêncio. Halik desenvolveu este tema. Termino citando a este propósito (nem de propósito:)) um protestante: O primeiro serviço que alguém deve ao outro na comunidade é escutá-lo em silêncio.

Pena eu ser tão incapaz de escutar em silêncio... :)

Confessionário disse...

Emanuel, penso que já te entendi... estavas a tentar pensar alto, em busca de alguma resposta!

Mas ainda te queria dizer que as encíclicas não apenas fazem citações da Bíblia, como a propõem como a melhor leitura, mais urgente e mais necessária aos cristãos...