domingo, setembro 06, 2009

O motor

Mora sozinha numa casa de pedra e a sua idade gastou-se com o tempo, como as pedras. Pequena, curvada, de lenço preto na cabeça. Mas nem a idade nem a aparência a impedem de ainda fazer uns trabalhos na quinta.
Foi com essa genica que veio ao meu encontro antes da missa. Padre, peça pelo meu motor na missa. Eu não entendi e perguntei o que pretendia. Respondeu que queria colocar nas intenções da missa o seu motor. Nem imaginem a contenção do meu riso despregado. Expliquei que não era um pedido comum. Continuou. O malandro, não tem funcionado. Por isso peço ao senhor que faça com que ele funcione. Respondi que o que ele precisava não era da missa, mas do mecânico. Que o levasse a compor. Disse que já o tinha feito e que nada. Trabalhou apenas uns dois dias. Então que comprasse um novo ou que o levasse de novo ao mecânico. Que não. Que era muito caro e naquela idade já não valia a pena. Que já tinha posto duas velas aos santinhos. Ia colocar a terceira. Mas nada. Devem estar distraídos, concluiu. Agora recorria à missa. Só eu lhe podia valer. Faça lá isso, padre, por alminha da sua mãe, que eu preciso do meu motor.
Eu ri da situação. Ela riu de satisfação. Mas o motor ainda deve estar parado. Será que Deus também se riu?
_________________________
Amigos, vou de férias. Estive no Simpósio do Clero, em Fátima, o que me fez muito bem, e agora vou descansar algum tempo. Se vos lembrardes, fazei uma pequena oração por este servo de Deus. Em breve voltarei. Até lá, que a vida seja uma alegria. Por isso sorriam. Por isso vos deixo este texto. Um grande abraço.

sábado, agosto 22, 2009

Uma noite em Fátima

Estava em Fátima e, como sempre, aproveitei para dar uma saltada ao Santuário na hora do terço. Vinte e uma e trinta. O tempo estava nublado. Eu também estava. Digamos que o cansaço ruíra sobre mim e precisava de um conforto espiritual. Tudo se conjugava para uma noite com Maria. Coloquei-me debaixo da capelinha, mas ao fundo. Curiosamente de cima da passadeira. A famosa passadeira que sempre me costuma incomodar. A passadeira das senhoras e senhores que cumprem promessas de joelhos, a arrastar vidas, dificuldades, problemas, e muitas vezes, crendices. Nunca aceitei bem, como espero que Deus não aceite bem, estas promessas que fazem do sofrimento gratuito um negócio com Deus, como se a este agradasse o sofrimento por si. São estas as mesmas pessoas que, muitas vezes, põem em causa o sofrimento que Deus permite acontecer no mundo e que, ao mesmo tempo, se infligem, sem necessidade, sofrimentos fortuitos. Não sei nunca como explicar estas dicotomias que as pessoas vivem ou pensam.
Estava eu nas minhas respostas do terço quando me tocam no ombro para me afastar. Não entendi logo o que se passava. Mas depressa percebi, quando uma senhora passa a poucos centímetros de mim, a arrastar-se na passadeira. Mesmo que a promessa fosse oportuna, a hora não o era de certeza. Olhei-a bem no fundo dos olhos procurando uma resposta. Curiosamente ela não escondia o rosto. Antes me parecia que gostava de o ostentar. Por isso tive oportunidade de a olhar nos olhos. Mais pessoas foram distraídas da sua oração para dar lugar à promessa. Eu quase que interroguei a senhora. Ainda me inclinei para o fazer. Não tive coragem, ou desfaçatez. Justifiquei-me, imaginando que até podia ser estrangeira e não entender a minha linguagem. Não entenderia, de certeza.
Não consegui rezar mais, porque a cabeça perguntava-me, mil e uma vez, porquê.
Desta vez a promessa foi mais forte que a oração. Quantas vezes é até mais forte que a fé!

sexta-feira, agosto 07, 2009

A comunhão do casamento

Era gente simples, a daquele casamento. Gente da terra. Gente tão simples que, às vezes, não sabe comportar-se. Gente que aparece pouco. Gente de casamentos, baptizados e funerais. Gente de ficar à porta de entrada para poder atender telemóvel ou falar com o vizinho. Gente que veste a melhor roupa nestas ocasiões porque a ocasião merece. Mas no fundo, uma camisa sem mangas e umas calças de ganga era mais o seu género. Gente que não tem grande mal. Pelo menos quero pensar assim. Mas que não tem consciência dos pequenos males que podemos cometer na vida com a nossa ingenuidade ou negligência. Digo tudo isto para tentar justificar o que se passou naquele casamento. Justificar nem que seja só à minha consciência.
Já não era a primeira vez que ouvia uma voz a fazer comentários durante a cerimónia. Não conseguia perceber as palavras. Mas percebia que não eram apropriadas. Fiz sinal com os olhos. Mas não devem ter sido vistos. Nem os olhos nem o sinal.
Chega a hora da comunhão, e como habitualmente, levo aos noivos a comunhão sob as duas espécies, o pão e o vinho. Entrego o cálice ao noivo e explico. Comunga. Passa-me o cálice, volta-se para trás, para o seu público, os convidados, e diz: É boa esta pinga. Desta vez os meus olhos foram mais sintomáticos. Ele sorriu, mas engasgado. Entretanto já a noiva estava a comungar, quando ouço, ou o pai ou o padrinho dele, que não dei bem conta. Devagar, não te engasgues. Não deve ter dado conta dos meus olhos. O pessoal, os convidados, o público, ria-se. Eu fazia esforço para não me irritar e para não me rir. Que confusão! Se calhar devia ter tomado outra atitude. Mas não consegui. Continuei a missa com normalidade. Só no final, no momento das assinaturas, expliquei aos noivos e aos padrinhos presentes, que não tinha sido muito correcto.
Mas enquanto assinavam, eu perguntava-me o que andávamos nós, padres, a fazer com sacramentos de circunstancia.

quarta-feira, julho 22, 2009

Procissões cheias de gente

O António tem uma aversão às quatro paredes da Igreja. Digo eu. E ele diz que não é por mal. Que gosta muito de Nossa Senhora. São palavras dele. Mas não gosta de ir à missa. Quer-se dizer, não é por mal, repete. Mas não me puxa, padre. Até gosto de o ouvir nas suas palavras. Mas não me puxa. A minha São vai sempre. A Sarita, a minha neta, adora o senhor padre. É daqueles que vai todos os anos a Fátima e se gaba disso. Ó padre, este ano ainda não fui. Arranje-me lá lugar na camioneta. Houve um ano que foi a pé. Ó padre, o que me custou! Cheguei lá rotinho de todo. Mas Nossa senhora ajudou-me. Gosto muito de Nossa Senhora. Mas, ó senhor António, e então porque não há-de ir à missa? E lá volta a resposta. Não me puxa, padre. Já lhe disse. Não me puxa.
Já o tenho visto antes da missa, quando vou tomar um cafezinho rápido ao Central. Se for preciso paga-me o café. Ou eu a ele. Não é má pessoa. Mete-se nos copos, mas não incomoda ninguém.
E foi num desses dias que nos encontrámos no Central. Eu corria e bebia o café à pressa. Ele bebia o branquito traçado nas calmas. Eu lembrei. Olhe que a missa hoje é ao meio dia. Ó padre, já lhe disse. Interrompi-o para dizer Não lhe puxa, já sei. Estávamos na nossa conversa habitual do deve ir ou do fazia-lhe bem, ou do então não é amigo de Deus, quando, às tantas interrompe a dita conversa para me perguntar. É verdade, ó padre, hoje tem festa lá em cima, na anexa. Tenho. E a que horas é a procissão? É as três e meia. É boa hora. A ver se não falto, que eu não costumo falhar nenhuma das procissões das festas aqui à volta da terra.
Eu já estava de costas e a sair porta fora quando ele repetiu para o dono do café que não costumava falhar as procissões. Entrei no carro. Não tinha muito tempo para pensar porque estava com pressa de chegar cedo à primeira missa. Mas de facto, temos procissões cheias de gente que não costumamos ver na missa!

sábado, julho 11, 2009

O telefone e os colegas

Ligou-me para falar. O colega X vinha de umas confissões, e foi dizendo que era bom quando éramos úteis para alguém, quando conseguíamos levar a paz a alguém. Vinha cheio de Deus e o seu entusiasmo transbordava do outro lado da linha. Eram umas doze horas da manhã.
Não passaram muitas horas quando me liga o colega Y para desabafar. Faz isso muitas vezes. Não aguenta mais. Não consegue celebrar com gosto. Parece que toda a gente o persegue. Não aguenta o celibato. Sente-se só.
Por volta das vinte horas, depois de uma das minhas missas, ligo ao colega Z porque precisava pedir-lhe um favor, combinar com ele umas coisas. Não atende. Ligo segunda e terceira vez. Acaba por ligar ele, cerca das vinte e uma horas. Estava ocupadíssimo. Pediu desculpas. Não sabia se ia dar. Não sabia para onde se virar. E ainda tinha uma reunião às vinte e uma e trinta.
Acabada a nossa conversa e, para cúmulo do dia, liga-me o colega V. Digamos que o telefone, hoje em dia, pode ser o nosso ponto de encontro, o nosso instrumento da fraternidade. Atendo. Que fazes? Pergunta. Eu trabalhava. Sou mais como o Z. Não queres ir dar um passeio amanhã? Insiste. Eu bem queria. Mas amanhã também tinha o dia cheio. O colega V dedica muito tempo ao passeio. Sabe que é saudável ter tempo para isso. Faz lembrar aquelas pessoas que dizem que os padres apenas trabalham aos domingos. Não condeno nem julgo.
Não quero mesmo fazer isso. Mas penso, e aproveito para pensar alto como somos sacerdotes e todos diferentes. Penso igualmente a quem me gostava de assemelhar mais. Penso no modelo ideal do sacerdote. Penso no Bom Pastor. Penso que haveria muita coisa para reflectirmos em conjunto, os bispos, os padres, a Igreja, os cristãos.
Ontem foi um dia de pensar no meu sacerdócio a partir dos colegas.

quinta-feira, junho 25, 2009

O sonho dos funerais

Os funerais têm o condão de me tirar do sério. Eu acredito intensamente na Ressurreição, no valor do sofrimento, e também não sou insensível à dor e ao outro. Mas os funerais tiram-me do sério. Quando me questionam sobre o que me custa mais na minha missão sacerdotal, digo sem hesitação, que é presidir aos funerais. Por muitos motivos. Inclusive porque me desorganiza a vida, os esquemas, os projectos de trabalho ou descanso para cada dia. Mas sobretudo porque não encaro com facilidade o rosto, as palavras, as atitudes, os gritos, as lágrimas, de quem sofre a partida das pessoas amadas. Coloca-me o coração ao rubro. Parte-se-me tudo, mesmo quando evito contacto claro com essas pessoas. Daí que use muito a homilia para me aproximar deles. Trata-se da minha limitação, e pronto.
Por isso a minha limitação anda feroz. Em cerca de mês e meio a média dos funerais anda nos três, quatro por semana. Já nem sei o que dizer nas homilias sem repetir-me. Não me apetece escolher leituras. Vou porque não me posso escapar. Durmo e acordo a pensar em funerais. Não dá para imaginar. E tenho de conviver com isso.
E assim ontem aconteceu-me o inesperado. Acordei pelas quatro horas da manhã, assustado, com um sonho estranhíssimo. As coisas que transparecem nos sonhos! Tinha uma arma na mão direita e andava aos disparos. Ora bem, perguntava eu. Quem está para morrer na paróquia? Aquele e aquela? Sim? ok. Ora bem, outra vez. Como amanhã tenho tempo, podemos tratar já das coisas. Pum, pum, trás, trás. Dispara aqui e para ali. Trata-se do assunto numa rapidez de um sonho.
Claro que precisava saber o significado deste sonho e por isso dirigi-me a Deus para obter a resposta. Em vez de ouvir que os mortos sepultem os mortos, como diz lá a Escritura e eu gostava de ouvir, Ele disse-me assim: Eu escolhi-te para levares o Reino de Deus aos homens.
Por isso lá vou eu, que isto de ser padre não é em part-time nem é coisa de sonhos.

quinta-feira, junho 18, 2009

Quem der mais que cinco faltas sem justificar, fica para trás

Acabou a catequese. Por este ano. Revi todas as Fichas da Catequese. Memória das presenças e faltas do pessoal. Alguns. Dois ou três ficaram para trás. Não como quem fica de costas voltadas para Deus. Mas para serem mais assíduos e a formação cristã ser mais séria. Dói. Não é fácil. Se calhar é mais fácil faltar do que dizer a alguém que não pode continuar sem levar a sério. Reunião com os pais. Final de ano. Repito. Festas: Pai Nosso, Palavra, Vida, Profissão de Fé, Envio, Primeira Comunhão, Confirmação. Todas abordadas. Preparadas com os pais. Os que apareceram, claro. Nalgumas paróquias, metade ou menos. Mais mães que pais. Isto é coisa de mulheres, dizem. Como se a educação fosse apenas para as mães gerirem. Já sabiam o que avisara vários Domingos em Outubro. Uma reunião no início do ano. Palavras na Folha Paroquial. Quem der mais que cinco faltas sem justificar, fica para trás. Não pode ser só andar atrás das festas. Da Primeira Comunhão e da Confirmação em especial. Isto não é negócio, mas quem quer, tem de mostrar que quer. Levanta-se então uma senhora de cabelo encaracolado. Quer dizer, levanta a voz. Senhor padre, o meu filho faltou muitas vezes. Mas também com a catequista que tinha!
Fica complicado gerir a boa vontade dos catequistas com a sua formação pedagógica. Nem sempre coincidem. Reconheço. Porém acredito que Deus consegue o que quiser através de quem quiser. Explico a boa vontade daqueles que se oferecem para ajudar a crescer a fé dos filhos dos outros. Disponibilidade. Tempo. A dificuldade hodierna de educar crianças, adolescentes ou jovens. Educar sem magoar. Sem levantar o dedo para admoestar. Cativar sem cartola. Sem coelhinho na cartola. A senhora continua a falar mal da catequista. A razão das faltas do filho é a catequista que exige demais. Marca numa hora que não dá para a mãe do seu filho. Nunca o explicou à catequista. Só se lembrou ao trovejar. Se o me filho não leva o catecismo é porque não o encontra! A mãe está muito atenta, penso para mim.
E depois de uma enxurrada de argumentos, saio em defesa da catequista. Minha senhora, no próximo ano conto consigo para dar catequese.

sexta-feira, junho 12, 2009

sondagem_ “Acreditas na Ressurreição?”

Passados que vão mais de dois meses da última sondagem, e, estranhamente, mais de 2.000 votos, chegou a hora de avaliar a sondagem que estava no lado esquerdo, no sidebar e acrescentar uma nova. A proposta era muito directa:
“Acreditas na Ressureição?”

E os resultados são:
1. não acredito _ 46 %
2. a 100 % _45%
3. acredito, mas não entendo _7%
4. Tenho dúvidas sérias _ 2%
5. não quero pensar nisso _ 1%
_________________________________

pequenas considerações:

  1. Recordo que retirei 750 votos no dia 17 de Abril, na opção “não acredito” porque a votação aumentara consideravelmente num dia, sem explicação aparente. Não passou muito tempo para que algo semelhante acontecesse, e quase em simultâneo na opção “a 100%”. Deixei ficar como estava. Porém, esmoreceu-se a minha vontade para fazer uma análise a esta sondagem, e deixo a outros as grandes considerações. Saliento e depreendo desta situação estranha que alguém (uma pessoa ou várias) teve interesse particular em fazer ganhar a todo o custo uma das opções. Fica no ar a pergunta: que terá motivado este interesse?
  2. Em tempos, descobri que nem sempre os ditos católicos acreditam nas verdades fundamentais da sua fé, o que me surpreendeu. Foi por isso que coloquei esta sondagem online. Assim, num estudo de 1995, feito pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, que abordou o tema “Gerações e valores na Sociedade Portuguesa Contemporânea” verificava-se que na faixa etária dos 15-24 anos, por exemplo, 85,5% diziam acreditar na existência de Deus, mas apenas 84,1% diziam acreditar em Jesus, e quanto à vida para além da morte apenas 43,0%. Já no que toca à Ressurreição o número descia para 37,0%. Hoje essa gente deve ter entre 29 e 38 anos, constituindo a faixa etária que predomina na sociedade. Que pensar disto?
    Para mim pode haver diferentes formas de sentir, intuir ou viver a fé ou os dogmas de fé. Mas há coisas fundamentais, sem as quais tudo pode perder o sentido. Para mim a Ressurreição é uma dessas. Acredito a 100% na Ressurreição. Posso até não saber explicar. Mas é ela que dá sentido a tudo o que faço. E não digo mais.


    Hoje surge nova sondagem, resultado de alguma preocupação que me tem ocorrido, quer pelo que sinto, quer pelo que me contam que sentem alguns colegas. E a pergunta é:

    Na tua opinião, o que causa maiores problemas aos párocos de hoje?

sábado, junho 06, 2009

A lente boa e a lente má

Esta é a história da lente que resistia a ler a Palavra de Deus e a história da lente solícita que, apesar de sozinha, não tinha medo de ler a Palavra de Deus. Eram as duas do António.
O António tem 65 anos e usa óculos. Pequeninos, bem ao jeito do nariz. Por azar da hora, os óculos andavam um pouco desconjuntados. Mas o sino tocara para a missa. Ainda teve tempo dos cumprimentos habituais na sacristia. Mostrou-me os óculos. Não os troco, que gosto muito deles. São especiais. Vou remendar o que houver para remendar. Quando ia voltar-me as costas, lembrei-me. Olhe, se não houver ninguém, vá ler a leitura. Acenou prontamente que sim. Chegada a hora, lá vai ele sorridente com os óculos na mão. Deita ambas mãos a cada uma das hastes dos óculos e dirige-os para cima do nariz. Porém, quando lá chegam, uma das lentes decide desistir. Cai. Espalha-se em frente ao ambão. O António olha para mim. Rimo-nos. E embora uma das lentes tenha desistido, o António nunca desiste. Se uma lente não quer ler, a outra há-de fazê-lo. E vai um par de óculos para cima do nariz apenas com uma lente. A leitura fez-se na mesma, por entre os sorrisos dos presentes, e o presidente da cerimónia demorou ainda bastante tempo a recompor-se. Raios partam as lentes, pensei. Ups. O que eu pensei! Pelo menos não se partiu a ingrata lente.

segunda-feira, junho 01, 2009

A música litúrgica

Aproveitou experimentar outra opinião, para justificar a dela. Lá na terra faz parte do grupo de jovens e cantam na missa. Tudo certinho e direitinho, porque o padre só gosta assim. Podemos dar notas ao lado, que o importante são os cânticos litúrgicos. Queríamos colocar guitarra. Grita impossível, e a gente sente o impossível bem no fundo de cada um de nós. Entretanto, quando há casamentos e nos pedem para os animar, a gente desforra-se um pouco. Até há uns dias atrás, em que ouvimos o que não queríamos. Estamos impedidos de cantar na missa. E agora diga-me o senhor o que havemos de fazer? Deixar de cantar? Deixar de ir à missa? Deixar de ser cristão? Na minha paróquia quem manda sou eu, disse. Eu não sabia que dizer, pois sou de opinião que a música litúrgica é aquela que se adapta à liturgia e não aquela que com sonoridades exclusivas e características, nos é proposto alindar a Eucaristia. Também não gosto de canções de ir à erva, um pouco apimbalhadas, imitações baratas de artistas conhecidos como os Abba ou por ai fora. Mas gosto de uma viola, de um bom ritmo, de uma canção que faça sorrir e faça festa, uma canção que incentive todos a cantarem. Para mim, a música litúrgica é aquela que acompanha, que sustenta a liturgia. Não pode ser um espectáculo, e deve servir para que toda a gente cante na assembleia. Recordo como o meu mestre no Seminário nos ensinava aqueles temas cheios de vozes e harmonias que ninguém cantava senão nós, e que depois dizia serem litúrgicos. Por tudo isto, pedi à jovem que encontrasse naquilo tudo um equilíbrio. Que falasse de novo com o pároco e que tentasse encontrar o tal equilíbrio juntos. Mas, ó padre, então eu para cantar a Deus não hei-de poder cantar com as minhas palavras e melodias? Sou obrigado a cantar o que não gosto? Então como posso gostar daquele a quem canto se não gosto do que canto?