domingo, setembro 12, 2021

Nunca pensei em ser padre para ser um padre

Nunca pensei em ser padre para ser um padre. É certo que a imagem do padre da minha terra, um homem carinhoso e com algum carisma, marcava os meus tempos de criança. Hoje, porém, não lhe sei mais as feições nem as marcas. Recordo que na catequese me distinguia por ser um petiz que sabia coisas e gostava de saber, que dizia coisas de coração sem as pesar. E dizia coisas bonitas de Deus que começava a amar. Aliás, que tinha começado a amar em casa. Recordo também que olhava para os padres como se todos fossem santos. Como se não existisse neles nenhuma marca de impureza. Ainda me lembro – e agora rio-me - de ter pensado que os padres não iam à casa de banho, porque esse era um lugar de imundície. Muito menos os bispos. E o papa seria imaculado. Contudo, nada disto me iludiu a ser padre. Nunca quis ser padre para ser assim. Foi apenas uma voz que ouvi por dentro e que não sei definir. Muito menos na altura. E essa voz era fantástica. Queria-me e pronto. Uns anos depois dei-lhe o nome de vocação. E aceitei que assim fosse nos tempos de Seminário, à procura da voz e da vontade que, tinha a certeza, vinha de cima. Ainda não sabia os meandros do clero, que fui descobrindo aos poucos. Sempre gostei mais da voz. Muito mais. Sempre a achei mais verdadeira que tudo o resto. E ainda acho. Ou tenho a certeza. Ao longo da minha história a caminho, o que sempre quis foi fazer a vontade dessa voz. Desse por onde desse. Como padre ou como ela quisesse. Hoje, olhando para trás, dou por mim a magicar a certeza de que decidi ser padre, não para ser padre somente, como algo que se faz, como uma função, como um emprego ou ganha-pão, mas como a forma de escutar constantemente a voz que me diz que me quer e pronto. 
 
A PROPÓSITO OU A DESPROPÓSITO:  "Ser padre como um cireneu"

8 comentários:

Zilda disse...

Nossa que bênção grande este texto, bom eu bem sei o que é carregar uma CRUZ. Sou caminhante...neste mundo com a minha.

Anónimo disse...

Pois é Padre Confessionário para mim vocação é isso mesmo. Na tua caminhada revejo a minha. Seguir Jesus Cristo, ou a voz de que falas, não nos desilude nunca, porque só há desilusão depois da ilusão. Ao longo da vida vamos encontrando tantos "pedregulhos" que dariam para construir uma catedral. Mas com perseverança vamos ultrapassando todos os obstáculos porque temos uma meta a atingir.Aquele que nos chamou é fiel, esta é a única certeza que temos.E a mim, até agora, foram os momentos mais dolorosos que mais me fizeram crescer na fé e no amor àquele que ne escolheu. Na experiência de humilhação Deus nunca se deixou vencer em generosidade na recompensa. Gostei muito de saber um pouco da tua história. Temos estrada estreita para chegar à meta mas vale a pena. Obrigado pela partilha e um bom início de semana. Paz e bem!

Anónimo disse...

Uma vez padre, pra sempre será padre. Padre. Mas pode ser um excelente administrador deuma comunidade em outras situações de trabalho. Mas jamais deixará de ser um abençoado padre.

Confessionário disse...

13 setembro, 2021 06:01
... pois eu penso que sou apenas mais um a caminhar, só que faço o caminho como padre!

Ailime disse...

Boa tarde Senhor,
Tão belo o seu testemunho.
Ser padre, porque ouviu a Voz que o interpela constantemente. Isso é vocação, nessa escuta atenta e permanente.
Uma enorme bênção.
Ailime

Anónimo disse...

Ola! No que e reli o seu relato, o que deu pra perceber, que o encanto esta no meio do caminho. Mas, como existe o mas, a vida e uma roda. Tudo pode ser modificado pela vida. Deixe DEUS agir em ti. Tu busca algo para ser mais util a humanidade? Vero? Tem outros caminhos a serem trilhados, pense nisso e encontrará, tu és uma jóia pra Deus, Ele precisa de ti, observe nos teus lados. Onde tem uma brecha na lei Divina, que não é bem uma brecha, e um raio imenso de luz. Abcs

Anónimo disse...

Pensa em tanta coisa, diria que o Sr. Padre é um poço de reflexão e sobretudo, um campo de inacção. Acompanho o seu pensamento à tantos anos através deste blogue e atraveria-me a dizer que está sempre na mesma, com as mesmas dúvidas, evasivas, puxa para um lado, depois para o outro, e há sempre quem o ajude nestas deambulações. Um fraco homem de Deus.
Não fora eu dar para a inacção e estat amarrada por elásticos (po vontade própria clara que à o tinha mandado dado uma curva.
O Senhor é o Senhor Padre das Promessas, Joelhos e Contrições. Um modo de estar na política. Pena que não vá a votos, porque tem uma atracção por urnas.

Da sua devota,

Perpétua

Confessionário disse...

Olá, Perpétua.
Foi imensamente agradável ler o teu comentário. Entre gargalhadas e seriedade, foi-me muito agradável. Sobretudo porque me fez pensar.

É uma batalha por cumprir. Uma batalha que é mais interior que exterior, de facto, e que às vezes me tolhe o entusiasmo.Mas não a fé e a esperança. Quanto mais amadureço, mais certezas tenho no meio das incertezas. E mais amo o Senhor e o coloco na minha vida. Também amo a Igreja, mas sofro com a forma de ela se "dizer" e se "viver". E sofro. Não escondo. Vivo nalguma inacção, não tanto por acomodação (aliás, algumas "queixas" são exactamente a prova de que não há inacção nem acomodamento), mas porque nem tudo depende de um pobre padre que gostaria de ser mais forte a remar contra ventos e marés, tanto exteriores como interiores. Talvez mais exteriores, não sei. O padre inativo é aquele que se contenta com o que tem. Eu não me contento. Serei um eterno insatisfeito a caminho. Porque acredito no "caminho".

Mas agradeço imenso o comentário. Fez-me muito bem pensar no que referiu. E se tem acompanhado o meu pensamento há muitos anos é porque sente vontade de os acompanhar!

Um bem haja de coração