quinta-feira, setembro 11, 2014

Uma confissão marcante

Era padre faz pouco tempo. Sabia-me dono do saber e do mundo. Achava-me capaz das melhores proezas, das mais sensatas virtudes sacerdotais. Além disso, estava no centro das espiritualidades sacerdotais em Portugal. Fátima. Tinha aprendido a oração da absolvição. Sabia-a de cor. Estava apto para ser sinal do perdão misericordioso do Senhor.
A senhora que se abeirou para se confessar tinha uma idade própria de quem já passou por muito, mas ainda há-de passar por muito mais. Não me olhou nunca nos olhos. Sofrera e sofria. Sofria e não queria sofrer mais. Achara-se usada e não queria mais. E como o perdão de Deus é tão próximo, tão íntimo, tão à maneira de Deus, agarrei na mão da senhora para lhe mostrar que Deus a agarrava também. Mas o inóspito aconteceu num repente que me marcou para sempre. Ela retirou a mão das minhas, afastou o corpo ligeiramente. Esperou a absolvição de forma nervosa, tímida, assustada. Eu assustado também, jurei a mim mesmo que, durante a confissão, não voltaria a agarrar na mão de desconhecidos. Hoje faço o possível para me colocar no lugar da pessoa que se está a confessar. Apenas escutá-la naquilo que é e sente. Não é fácil. Mas tem de ser. É que naquela confissão marcante aprendi que ainda estava muito longe de saber como Deus agia nas pessoas. Porque cada pessoa é uma pessoa. E Deus age sempre diferente de pessoa para pessoa.

31 comentários:

PR disse...

"jurei a mim mesmo que, durante a confissão, não voltaria a agarrar na mão de desconhecidos. "
Um juramento é um juramento e tu saberás melhor do que ninguém o que fazer... para te compreender só tendo passado por uma situação semelhante à que relatas.
Estou do outro lado, ou seja do lado da senhora que se assustou com o teu gesto.
Arrepia-me o ar altivo frio e indiferente com que a maior parte dos padres ouve as confissões... "enojam-me" os meios sorrisos hipócritas com que nos presenteiam.
Um dia destes se a ocasião se proporcionar, faço o relato da minha última confissão.
"cada pessoa é uma pessoa" verdade, vá-se lá saber o que se passou na cabeça da mulher quando lhe pegaste na mão.
Neste momento quer-me parecer que a mulher estaria tão carente de um gesto desses, verdadeiro e desprovido de intenções, que se assustou com ele.
Permite-me dizer que se alguma vez sentires que deves tocar na mão de um desconhecido durante a confissão, esquece o juramento, e fá-lo... Se o gesto for bem recebido tanto melhor se não for percebido abonará a teu favor a boa intenção.
Acredito que as palavras " o vento leva" mas quem esquecerá o gesto, o toque o carinho.

Cisfranco disse...

Aprecio a sinceridade evidenciada, não só nesta descrição, como noutras que normalmente leio. Mas atenção! Cuidado com a exposição pública... há coisas que só se dizem a confidentes.
Gosto do seu blog e visito-o com com frequência. Que Deus esteja consigo e o abençoe.

Anónimo disse...

Curioso não resisti comentar... aconteceu-me precisamente esse episódio e em Fátima só que eu não era o padre, mas a penitente... também retirei a mão, o padre teve essa mesma atitude... é para mim quase óbvio qual era o motivo da confissão...

Anónimo disse...

Sim, creio que deve ter cuidado, sabe que há coincidências muito estranhas ... só vc ainda não entendeu isso

gralha disse...

Não há nada de fácil nem óbvio no momento da confissão, mas nunca tinha pensado que mesmo o sacerdote tem de entregar-se completamente nas mãos do Espírito Santo. Ainda bem, para a próxima sentir-me-ei um bocadinho menos intimidada (o que não consigo evitar sentir).

PR disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anónimo disse...

Parece-me que devias retirar este post

Anónimo disse...

Como já ouvi, juramento é juramento!
Mas quero dizerte: quando se ajoelhar aos teus pés algum penitente que precise de carinho mesmo que seja desconhecido, agarra-lhe a mão e o coração. Não para o assustar, mas para o entregar ao Coração de Deus... Sendo assim, tenho a certeza, que Deus o agarra e o transforma. Nunca deixemos de fazer o bem, pela aparencia exterior. "O gesto vale tudo" Mas o Amor vale mais.
Boa tarde.

SIRF disse...

Concordo com o PR quando ele diz "se alguma vez sentires que deves tocar na mão de um desconhecido durante a confissão, esquece o juramento, e fá-lo". É um gesto que o meu pároco, que entretanto faleceu, fazia e eu sinto falta sempre que me confesso e não consigo criar ambiente suficiente para estar à vontade! Não sei se algum dia vou voltar a estar tão à vontade como estive com aquele senhor. E isso leva-me a confessar-me cada vez menos!
Quero querer que a Igreja somos nós todos mas é tão verdade que o padre que está "à frente" influencia, lá isso influencia.

Anónimo disse...

Eu não acho que deva retirar o post. Aliás, eu gostei muito do que li, e agradeço. Nunca tinha pensado que um gesto tão simples e tão afectuoso se tornasse inoportuno, e isso fez-me pensar!

Anónimo disse...

O problema é alguns padres usarem por vezes a confissão para iniciarem relacionamentos com as penitentes. Gato escaldado de água fria tem medo. Mas as confissões não devem ser elas na sua totalidade totalmente confidenciais?

Anónimo disse...

Para os curiosos o post é muito interessante, até porque entra nos meandros da confissão, mas o que lá se passa deve ser confidencial até mesmo os gestos e tudo o que supõe dessa confissão, mesmo não sendo referido o nome da pessoa, ainda me asseguraram isso há 2 dias. Imagine-se que eu sei quem é o confessionário e que foi a mim que me confessou e me sinto retratada aqui... imagine-se... não iria gostar

Anónimo disse...


Este post é diferente dos que tem escrito ultimamente. É tocante. Mas a mim também me causa um certo incómodo a questão da confidencialidade. Suponhamos que o que escreveu, como parece, retrata uma situação verídica. Suponhamos que a penitente em causa, pelo insólito, confidenciou a alguém a situação "das mãos" e o local da confissão. Suponhamos que esse alguém leu este post... É certo que esse alguém, se ler este post, nunca poderá retirar dele certezas absolutas, mas ainda assim, caso retire, fica com um cheirinho do teor daquela confissão. Para a próxima é melhor ser mais evasivo... Pelo menos não situe a confissão... Bem, espero que essa parte seja ficção! Sr. Padre, cautela e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém! Lembre-se da anedota do padre e do presidente da junta de freguesia :)

PR disse...

"alguns padres usarem por vezes a confissão para iniciarem relacionamentos com as penitentes"
não creio que assim seja ou que se algum relacionamento surgir entre um padre e uma paroquiana, seja premeditado, mas que há padres que são umas (desculpem o termo) bestas há.
Graças a Deus pelos sensatos e sensíveis às questões mais delicadas da vida, porque também os há e eu conheço e dou graças a Deus por eles.
Diria que estes, os mais sensatos serão os mais velhos, aqueles que já passaram pelo fogo e saíram não ilesos mas "calejados".

PR disse...

"padre e uma paroquiana" penitente era o termo a aplicar uma vez que uma penitente quase nunca é uma paroquiana.

Anónimo disse...

Deixe-me dizer-lhe cara PR que está muito longe do que é a vida e o relacionamento dos padres com mulheres... infelizmente ou felizmente o mesmo não acontece comigo, e cada vez mais o posso dizer com mais conhecimento e mais certezas a cada momento. Tudo é possível, desengane-se

Anónimo disse...

Aqui existe uma mesa entre o padre e o confessor...eu hoje certamente faria de tudo para não tocar qualquer pAdre e minha mãe diz que não se confessa certas coisas com o padre da nossa paróquia pois eles são seres humanos e tbem julgam...podem acreditar eu passei por isso ele quase caiu de costas literalmente e certos carinhos podem despertar amor nas mulheres principalmente mulheres carentes e depois o padre simplesmente se afasta ao perceber e deixa a pobre a sofrer sem ao menos ouvir uma palavra sobre tudo não existe final nem feliZ nem triste, é como se nada tivesse acontecido, isso dói muito. Pessoas machucadas acabam machucando outros por medo de se machucar denovo. Não desejo para ninguém oque eu sofro hj :(

Anónimo disse...

Cada um possui as suas experiências, acho estranho pois comigo excepto o meu problemático retorno à igreja, desde aí fui sempre e literalmente perseguida por padres. Nunca me senti usada, porque creio que todos me amaram de facto, sinto que somos todos vítimas nesta história da vida, uma vez uns, outras outros ou ambos... também nunca nenhum padre se afastou de mim, pelo contrário, por vezes não sei o que os atrai muitas vezes obsessivamente, já me apontaram vários motivos... o meu trauma são por vezes as técnicas peculiares que certos usam, algumas posso dizer que muitas deveras elaboradas ao ponto de eu que sou tão analítica não as conseguir ver antecipadamente... então quando dizem que foi Deus é que fico mesmo desorientada...

Anónimo disse...

Padre, também acho que quebrou o segredo de confissão:
1. Identificou que era uma mulher: uma em centenas de milhares
2. identificou a idade dela ("uma idade própria de quem já passou por muito, mas ainda há-de passar por muito mais"): o que vai mais ou menos dos 7 (idade da consciência do sofrimento) até ao final da vida
3. identificou o local, Fátima, onde centenas de milhares de mulheres se confessam todos os dias
4. identificou o pecado dela ("Achara-se usada"): como centenas de milhares de mulheres

Pronto, aí está como quebrou o segredo de confissão! Ironia, ironia! O senhor apenas relatou um acontecimento que o marcou, o que por acaso aconteceu no meio de uma confissão!
Não vou atirar pedras a nenhum(a) dos comentadores(as), mas o senhor já escreveu tantos posts em que o senhor descreve semelhante situação, e agora é que vêm os puristas.
Sabe onde está o problema? No facto do senhor ser um homem e ela uma mulher, e no facto de lhe ter tocado na mão. Olha as mentes já a imaginar o filme todo!
É curioso como os últimos posts têm tido poucos comentários e de repente...
Faça o que achar melhor sempre, e o que acha que Deus espera de si. O resto são balelas!

Confessionário disse...

Caros amigos, aqui está a prova de como "cada pessoa é uma pessoa".
Não vou abordar a questão do lado da confidencialidade, pois estou de consciência tranquila.
Quero apenas abordar o gesto que me marcou para sempre. Foi um gesto desprovido de qualquer interesse ou de qualquer intenção senao a de oferecer o carinho de Deus. E mesmo assim, porque as pessoas não são todas iguais, a reação não foi a esperada. Honestamente, não guardo daquela confissão senao o que me marcou. Garanto que não me lembro que pecados eram sequer, emnbora tenha já percebeido em muitos dos vossos comentários uma certa especulação.
Hoje em dia agarro imensas vezes as mãos dos meus penitentes, quando os conheço, quando percebo que precisam... Mas não o faço sem ter claro dentro de mim que assim deve ser!
O problema maior é quando nos achamos sabedores de tudo, mesmo os desígnios de Deus, e nos deparamos com situações que nos ensinam que apenas temos de ser autênticos instrumentos de Deus!
Tenho dito.

Anónimo disse...


Anónimo de 13 Setembro, 2014 12:02

O teu raciocínio está muito bem explicado, salvo numa parte... a origem de um maior número de comentários do que o habitual... é que se o penitente em vez de uma senhora fosse um homem e o senhor padre lhe tivesse agarrado na mão... hum...aí sim, teríamos uma longa metragem! Até eu queria ver!

Anónimo disse...

Já houve aqui algum debate sobre gays foi?

Anónimo disse...

Também concordo com a pessoa de 12 Setembro, 2014 16:24

Anónimo de 13 Setembro, 2014 17:57

A tua constatação a respeito do maior número de comentários, levou-me a pensar como tenho feito aqui falta! Da minha parte tentarei estar mais presente, apesar da muita ocupação actual, assim creio que já não se notará tanta diferença de dia para dia.

Anónimo disse...

Também acho que o padre:
1º devia ter identificado a mulher pelo nome ou pelas mãos...
2. Que devia esclarecer que a idade própria de quem já passou muito é acima dos 7 (menos para os pedófilos, evidente)
3. Dizer o dia, a hora e o confessionário em que estava lá em Fátima
4. Dizer claramente que a mulher andava com um padre e quando a coisa terminou isso aborreceu-a muito e com ou sem razão... tirou a mão... não fosse ser usada novamente... vamos lá nós especular, semelhante coisa nas nossas mentes imaginativas e perversas que isso não existe, nem pensar...

Pronto, aí está, assim sim é que seria uma história empolgante. Agora ninguém sabe quem é a mulher, nem mesmo ela sabe quem ela é, nem sabe quem é o padre a quem se confessou... e nem já se lembra tendo em conta os 7 anos de idade e a possibilidade de Alzheimer da confissão ou do teor dela... também vamos crer que não sabe navegar na internet...
Que ironia Sr padre, o senhor apenas relatou um acontecimento que o marcou, o que por acaso Só aconteceu no meio de uma Confissão... mas há pessoas embirrantes mesmo, há algum problema nisso se alguma mulher se sentir tocada ou deixar de se confessar a si pensando que um dia destes pode ver a sua história a meios que contada entre caracteres? Nada disso! Não é minha intenção atirar faiscas, por amor de Deus! Também acho que isto são por aqui umas puritanas, não sabem já elas da sua tanta experiência em posts? Está a ver, o facto haver uma mulher e um homem, está a ver o filme não é? Vc bem dizia... só que "O problema maior é quando nos achamos sabedores de tudo, mesmo os desígnios de Deus, e nos deparamos com situações que nos ensinam que apenas temos de ser autênticos instrumentos de Deus!" mas olhe esqueça, tudo isto são mesmo autênticas balelas... !!!! ;)

Anónimo disse...

Irmãos, confesso que já passei longos momentos com as minhas mãos presas entre as mãos do padre da minha eleição enquanto trocávamos confidências e ele me falava docemente ao ouvido. Nunca me passou pela cabeça retirá-las, apenas prolongar essa experiência íntima e divinal. Ele é um homem culto, interessante, de excelente memória, cheiroso, em excelente forma física, frentex, com uma energia cativante e uma carequinha redonda e sensual. Dá gosto ver e ouvir e, mais ainda, de agarrar. Não sou muito de confissões e ele sabe disso. Compreende-me como ninguém. O “meu” padre já ultrapassou há muito a faixa etária dos oitenta e conhece-me desde muito pequenina. Não me estou a ver a confiar as minhas mãos a mais ninguém. Excepto à minha manicura. Aqui estou eu: uma puritana desviada por um padre sedutor.

Anónimo disse...

hahahahahah 14 Setembro, 2014 18:18 há um quê de bizarro nisso, mas não posso dizer que não achei graça. Bem dito que o amor não tem idades e até os seus cabelos estão todos contados hahaha

Anónimo disse...

Sr padre, não quero debochar o assunto juro que faço um esforço, mas quanto mais sério é, mais é a tentação de o avariar… é assim cada pessoa é uma pessoa…

Anónimo disse...

Agarrar a mão pode nem sempre ser recebido com a intenção a que quem o faz se propões é verdade. Escutar, compreender e devolver o sentimento é quase sempre tão eficaz e muitas vezes mais seguro do que colocar mão na mão. A sensibilidade para escutar o que Deus pede para cada pessoa é fundamental na confissão e na vida. Força

Anónimo disse...



Anónimo de 16 Setembro, 2014 00:11, é isso tudo!

Anónimo disse...

Já fui tocada na mão...na cabeça...em confissão...e nunca teve qualquer significado especial, a não ser o sentir-me tocada por Deus e mais próxima d'Ele, o que para mim já é especialíssimo.

PR disse...

"O problema maior é quando nos achamos sabedores de tudo, mesmo os desígnios de Deus, e nos deparamos com situações que nos ensinam que apenas temos de ser autênticos instrumentos de Deus!"
Verdade.

"Tenho dito." E tens dito muito bem.
Gostei deste "remate final".