O burro do Alfredo é o vizinho mais próximo do cemitério. É ele que, do seu posto de trabalho, vela cada campa. É um burro sossegado, mas atento. Não se dá por ele a não ser nos funerais ou nos finados. Chegados ao cemitério, findo o canto fúnebre, o burro do Alfredo continua a salmodia na sua língua materna. É difícil manter a compostura e guardar a seriedade. O seu dono é o primeiro a desfazer-se em prantos de gargalhada contida. Já o avisei para que guarde o animal a sete chaves quando há funeral, mas o Alfredo esquece-se. É que ninguém consegue ficar-lhe indiferente numa cerimónia que exige tanto recato. Foi quando o Alfredo me contou que em tempos o padre que eu substituíra, para dar início ao ritual das exéquias e efectuar a despedida do defunto no cemitério, dado que os presentes faziam barulho inapropriado, pediu, alto e bom som, que se fizesse silêncio a fim de ele prosseguir a oração com a devida dignidade. As pessoas aceitaram o pedido e calaram-se. Nisto, o burro do Alfredo, quase em tom de gozo com o padre, abre as goelas e esboça um zurro do nunca visto. Sorriram as pessoas e conformou-se o padre, dizendo. Bem, a este não posso eu mandar calar.
3 comentários:
Como eu dizia há dias, num comentário do post da "Confissão", aqui está um post divertido que não tem comentários porque não agita as mentes perversas que temos. Padre, faça lá mais textos perversos para agitar águas e ter comentários nos seus posts...
O burro do Alfredo fez-me sorrir.
"Bem, a este não posso eu mandar calar." É um animal privilegiado, pois se fosse o padre da minha paróquia a viver a situação, parava a cerimónia virava-se para o dono do burro e ordenava que afastasse o "inocente animal".
Já parou a celebração por menos e deixou mal disposta a dona dos gatos que miavam sem parar.
Gostei muito deste post, leve e descontraído.
"Padre, faça lá mais textos perversos..." que humor negro, mas bem pensado.
É que as mentem perversas também são mentes santas, tal como a igreja, santa e pecadora... ora quando um burro fala os outros calam-se... eis o motivo.
Enviar um comentário