terça-feira, fevereiro 18, 2014

Um café com sabor a Deus

Gosto muito de café. Tomo uns três ou quatro por dia. A meio da manhã tem de ser. Como aquele que diz que se não for à missa ao Domingo nem é Domingo, manhã para mim sem café nem é manhã. Alguns paroquianos, um ou dois em particular, ligam e dizem Vai um cafezinho? E lá vou eu para o café. Não consigo estar lá muito mais tempo que aquele que demora o tomar do café. Mas sento-me à conversa, que também é bom e sabe tão bem como o café.
Há dias numa destas acções matinais, uma senhora chamou-me para a sua mesa. Estava sozinha, lendo o jornal. Primeiro, de costas um para o outro, foi metendo conversa. Depois convidou-me e acabei por me sentar a seu lado. Foi desabafando e contando que há mais de um ano que não ia à missa. Explicava-se, comprimia-se, metia as mãos uma na outra, remexia-se na cadeira. Dizia que não tinha motivos para ter deixado de ir à missa, uns mal-entendidos, umas histórias de mulheres. Desfiava coisas do passado que agora não achava bem, mas tinham acontecido. Depois de tanta palavra puxa palavra, perguntei-lhe se não gostaria de se confessar, pois que aquilo era uma autêntica confissão. Mas aqui, perguntou ela. A não ser que não queira, respondi. Sorriu e disse que sim. Estava mesmo a precisar, senhor padre. E foi logo ali, naquela mesa de café que se confessou e que recebeu a absolvição. O café estava praticamente vazio. Mas que não estivesse. Seria igual. Afinal, qual é o lugar mais sagrado para o perdão de Deus? É aquele onde esse perdão for mais genuíno. Além disso, quem mais precisa encontrar-se com o perdão ou a mão de Deus, não se encontra, geralmente, dentro das quatro paredes de uma igreja ou das quatro portadas de um confessionário. Naquela manhã o café soube-me muito melhor. Soube-me a uma presença especial de Deus. A ela também de certeza, pelas palavras com que terminámos a conversa e nos despedimos. Obrigada, padre. Veio mesmo a calhar. Já há muito que precisava deste momento. A partir deste Domingo vou passar de novo a ir à missa.

16 comentários:

Imaculada Cintra disse...

Que lindo esse relato... vou partilhar no meu blog... Deus o abençoe e o inspire sempre!! Evamos evangelizar sem fronteiras...
Imaculada Cintra - catequista
Brasil-Franca-SP

Anónimo disse...

Boa tarde, mais uma bela partilha deste confessionário, que que para mim também já faz parte de um "vicio", quase como o do café... que também gosto muito.
Mas dar uma "vistinha" de olhos a este blog, já faz parte dos meus hábitos diários. Pois acho que ao ler alguns destes textos, ou mesmo alguns comentários (não tem que ser o último, é um qualquer ás vezes á sorte)fazem com que o meu dia comece de uma maneira diferente,pois Deus está "presente" em todos eles e ás vezes fazem-me pensar, quantas coisas boas e diferentes eu poderia fazer e dizer...
Bjs - MM

Peregrina Repetente disse...

Olá Confessionário:
Como eu gosto que sejas um padre desempoeirado e sem algemas ás leis da igreja feitas pelos homens. Ser padre é sê-lo na igreja de 4 paredes, na rua, no café,numa festa, enfim em todos os lugares que fazem deste mundo a IGREJA de Deus.
Há uns tempos envolvi-me numa acesa discussão com o pároco da minha paroquia, e fiquei triste por ele ser tão "quadrado".
Desculpem, mas vou partilhar, até para saber as vossas opiniões.
A situação passou-se numa longínqua terra de África há mais de 40 anos.Num lugar onde não havia igreja, muito menos padre e por isso ninguém assistia à eucaristia nem sequer no Natal ou na Páscoa a não ser que se desloca-se mais de 100km, aparece um sacerdote "caído do céu".
Uma senhora bastante doente, não quer deixar de aproveitar a presença do padre e pede-lhe para celebrar missa em sua casa, convidando todos os vizinhos para tal. Como não havia hóstias o Sr. Padre consagrou Pão e todos comungamos com muita alegria. Penso que foi a última comunhão que a dita senhora teve, pois faleceu pouco tempo depois.
Ora depois de contar isto, o meu pároco, quase que me dá um responso pois às leis da igreja esta comunhão não podia ser feita.
Pergunto eu: nesta situação tão especial, será que para Deus ela não existiu?
Por isso, padre, continue a confessar onde e quando puder, porque a Igreja somos todos nós.
PR

Ângela disse...

Que lindo! Gostei!

Anónimo disse...

Perdoem, que sou uma leiga, se aqui vou dizer uma insanidade. Eis o que significa a comunhão para mim – um estado de espírito. Um estado que se inicia com a vontade/necessidade de assistir à celebração da eucaristia, um estado que se intensifica com a leitura e a homilia e que se “materializa” no acto de comungar. Como se estivesse a participar num banquete onde se oferece paz e confiança.

É verdade que cada vez que assisto a uma missa, nunca sei no início se irei comungar. Depende sempre de como me sinto no momento da comunhão… A homilia tem um papel fundamental. Já aconteceu não me sentir tocada pelas palavras proferidas e acabar por não o fazer.
Também é verdade que não dou primazia à confissão. Há meses que o não faço.

PR,
No meu sentir, a comunhão tendo por base este estado de que a recebe e a presença do Espiríto Santo em quem a administra pode ser feita nas mais variadas circunstâncias…

Confessionário,
Estou eu longe do que se pretende na comunhão? Diz-me de tua justiça que aprecio imenso os teus conselhos.

SL

Anónimo disse...

Bom dia!
Muito bom este texto.
Não foi no café, mas foi à porta da igreja, ontem 18/02/2014.
Parei o carro para falar com uma pessoa, e surgiu outra, apareceu de seguida o padre.
Apesar de me manter a uma distância considerada segura, pois o homem quando "está com os azeites" descarrega em cima da primeira pessoa que lhe aparece pela frente, fiquei uns instantes mais que acabaram por se transformar numa hora e tal. As pessoas foram saindo de mansinho e ele fazia questão de ficar, não tinha pressa afirmou. Ficámos os dois, e perguntou-me se não precisava de falar com ele respondi-lhe que sim mas só depois do dia 22, que até lá não se preocupasse que a coisa que lhe queria pedir era muito fácil para ele de resolver.
Muito bem assentiu, mas preocupa-me a falta de brilho no seu olhar... Fiquei a olhar para ele sem saber o que lhe dizer, não confio muito na discrição dele especialmente por se dar com algumas das senhoras que têm a língua mais comprida da paróquia.
Ele continuou a sra. é diferente, afirmou mais uma vez olhando-me nos olhos, e lá começaram a rolar umas quantas lágrimas... comecei devagarinho sem pressa... sinto-me afastada de Deus e não consigo rezar, já faz muito tempo que não consigo estar em comunhão com Ele, e sem comunhão nada flui... sinto-me vazia... sem absolutamente nada para transmitir, o chão parece fugir de mim. Este é o meu PECADO não espero porque não creio... Sinto-me frustrada por incapacidade de discernir ou acreditar em algo ou alguém...
Desta vez foi ele que ficou em silêncio pegou nas minhas mãos e olhou-me fixamente nos olhos. Surpreendeu-me o gesto pois o homem pela idade que tem e pela doença é conhecido pelos modos pouco afetuosos. Quando resolveu falar foi para me dizer que me iria incluir nas intenções dele, foi o que eu percebi.
Despedi-me dele e garanti a minha presença na celebração do próximo sábado para orientar aquele bando de jovens irrequietos.
Entrei no carro e ele fez o mesmo.
Senti que alguém me batia no vidro, era o padre, saí do carro, dirigi-me a ele com certo receio pelo que ele me quereria. Ficámos frente a frente "Permita-me que lhe diga que a admiro muito, muito, mais do que as palavras possam expressar, gosto também muito de si. A sra. é o rosto desta igreja.
Só consegui responder-lhe que era bondade dele que não era em mim que estava a diferença, mas sim no olhar dele. Também gosto muito de si... disse-lhe ainda dei-lhe dois beijinhos entrei no carro e claro está já não disfarcei as lágrimas que caíram livremente até chegar a casa.
Para mim esta foi uma verdadeira confissão... sem absolvição audível, à porta do templo de pedra, mas do lado de dentro de dois corações que partilharam de uma sintonia não "tradutível" por palavras.

Confissões a Jesus disse...

Vou partilhar também uma conversa que escrevi e me deixou a pensar:

http://confissoes-jesus.blogspot.pt/2014/02/porque-tu-amas-os-teus-sacerdotes.html

Confessionário disse...

SL,
a comunhão é um alimento que nos une a Deus e aos outros, como a própria palavra indica.
Daí que devíamos ir à Eucaristia com firme propósito e vontade de comungar. Precisamos desse alimento e de nos sentirmos comunhão.
Aliás, para participarmos de forma completa na Eucaristia deveríamos comungar. De que adianta Deus fazer-se alimento se nós não o comungarmos?!

Confessionário disse...

PR, eu já o fiz numa ocasião em que não dava de outra forma, não havia hostias para consagrar e tínhamos de fazê-lo.
No problem... Só quem passa por elas e as tem de decidir é que percebe claramente como teria de ser assim!
E tb não quero condenar ou julgar algumas liturgices que se tornam mais importantes que o homem (como o Sábado para os judeus... recordam?), mas os seus promotores deviam prestar mais atenção ao que o Papa Francisco tem falado. Eu tb acho que as normas devem ser cumpridas... mas

JS disse...

Cara SL, estarás longe do que se pretende na comunhão? Bem, longe é dizer pouco.
Valha a verdade, o facto de te questionares consegue tirar uns metros a esses milhares de kilómetros de distância; e, se te serve de consolação, também estás longe de estar sozinha no engano.

A solução para encontrares o caminho? Tira a tua pessoa da equação, o teu "eu", o teu ego. Liberta-te da tua própria vontade e interesses, dos teus apetites ou disposições momentâneas, dos teus estados de espírito voláteis.
Nada disso interessa, nada disso importa.
Descobre o outro, O Outro. Ele chama-te. Vais à missa porque foste convocada. E dizes: "Aqui estou, Senhor". E olhas para o lado, e vês os muitos outros que também foram chamados, e dizes: "Sim, aqui estamos, Senhor".
E depois sentas-te e dizes: "Fala, Senhor; a tua serva escuta", porque sabes que Ele quer falar-te, que Ele vai falar-te, até que teus ossos estremeçam, mesmo que não te agrade, mesmo que não o compreendas, mesmo que o teu coração esteja algo endurecido naquele dia.
E depois Ele far-se-á presente naquele altar e dir-te-á: "Vem, vem comer", "Sou Eu que te quero comungar", "Estou a bater à tua porta, deixa-me entrar". E responderás apenas "Senhor, não sou digna de te receber em minha morada..."
E irás. Até junto daquele altar. E deixarás que Ele te visite. Que Ele te inunde. Que Ele viva agora em ti. E dirás: "Obrigada". Uma, duas, mil vezes até.
E sairás da missa. Tu com Ele, Ele contigo. Para a vida. Para o mundo. Para a tua casa. Para mais uma semana.
E comungarás os irmãos. E deixarás que eles comunguem Aquele que vai em ti. E dirás: "Eu venho, Senhor, para fazer a vossa vontade". Ou então: "Seduziste-me, Senhor, e eu deixei-me seduzir... E foi tua a vitória".
E logo chegará a hora de Ele te chamar de novo...

Confessionário disse...

Fantástico, JS
Já tinha saudades dos teus comentários

Anónimo disse...

Obg, JS. As lágrimas correram-me pela cara ao ler a sua resposta...

Não tenha dúvidas estou longe ou não o teria questionado. é em parte o que procuro neste blog: orientação.

SL

paula disse...

os seus textos não deixam de me inspirar, de me fazer feliz sempre que cá venho.

abraço

Anónimo disse...

Obrigada, Sr Padre
Obrigada, JS

Bem-hajam !

Anónimo disse...

É bonito ter essa percepção do momento, essa abertura. É bonito aproveitar o momento, não deixar passa-lo. É bom, estar no momento certa à hora certa.

Ana Melo disse...

Para mim, ser discipulo de Deus, é isto, tempo, disponibilidade e acolhimento.
Continuamos a rezar demais, com pedidos a Deus, (ò meu Deus, faz com que…!!!!).
"DEUS é CAMINHO, VERDADE, E VIDA”, em qualquer lugar em qualquer situação, a nossa oração persistente/continua/diária/independente de sítios, ou pessoas com quem nos cruzamos, deve ser o “Reza em mim Senhor”.