Gosto das luzes acesas no Santuário de Fátima, que acabam o frenesim das devoções e descobrem o véu da fé. É a melhor altura para se ir dizer umas coisas a Nossa Senhora. Falar com ela da nossa vida que está para resolver. Do filho que se tem esquecido de passar pelas bandas por onde passo. Ou passa discreto e eu, de tão ocupado, não pressinto a Sua presença. A mãe não tira o lugar do filho, mas chega-lhe com mais frequência. Por isso é bom falar com ela. É a melhor altura para não me mostrar rabugento a murmurar daqueles que vão a Fátima mas não vão à missa, que depositam flores em vasos já carregados, que acendem velas como quem faz outra coisa qualquer, que percorrem o tapete de joelhos almofadados.
Estava na minha conversa amena, simples, directa, sentida, quando à minha frente uma criança dos seus sete, oito ou nove anos, sozinha, se pôs de joelhos a percorrer o centro da capelinha, olhando para os lados, orgulhosa do seu feito, como que a dizer Eu também sei fazer. Perdi-me à procura da sua família e à procura da minha conversa com Nossa Senhora. Perdi-me e só me ocorreu que nós somos homens de hábitos e as crianças cópias dos seus ídolos, familiares ou não. Para uma criança não há feito maior que conseguir fazer o mesmo que os que lhe são modelos. Ali estava ela feliz pelo feito. E nisto comecei a entabular uma rabugice com Nossa senhora, porque me questionei que fés imitam ou aprendem as nossas crianças com os cristãos que somos. Podia estar errado. Podia não ter percebido o gesto daquela criança. Podia muitas coisas, mas não consegui deixar a rabugice com Nossa Senhora.
Estava na minha conversa amena, simples, directa, sentida, quando à minha frente uma criança dos seus sete, oito ou nove anos, sozinha, se pôs de joelhos a percorrer o centro da capelinha, olhando para os lados, orgulhosa do seu feito, como que a dizer Eu também sei fazer. Perdi-me à procura da sua família e à procura da minha conversa com Nossa Senhora. Perdi-me e só me ocorreu que nós somos homens de hábitos e as crianças cópias dos seus ídolos, familiares ou não. Para uma criança não há feito maior que conseguir fazer o mesmo que os que lhe são modelos. Ali estava ela feliz pelo feito. E nisto comecei a entabular uma rabugice com Nossa senhora, porque me questionei que fés imitam ou aprendem as nossas crianças com os cristãos que somos. Podia estar errado. Podia não ter percebido o gesto daquela criança. Podia muitas coisas, mas não consegui deixar a rabugice com Nossa Senhora.
20 comentários:
Há pouco tempo ouvi um padre dizer na missa: “quem somos nós para dizer que está certo ou errado aqueles que andam de joelhos em Fátima?” Foram mais ou menos estas palavras. Eu pensei em como ele era mais sensato que a maioria. Pensei no bom-senso, na sua bondade. Para mim ele disse tudo, como sempre, para mim, diz tudo.
Rabugice… agora que leio esta palavra faz-se luz. Acabo de conseguir definir aquilo que sinto em relação à paróquia a que pertenço e consequentemente à Igreja Católica… Tenho passado, nestes últimos 18 meses, por uma provação que jamais imaginei passar. Porque estas coisas, até nos acontecerem a nós, acreditamos que só acontecem aos outros.
Ajuda da Igreja? Recebi, mas não da Católica… Da Evangélica. Irónico foi que a ajuda, não espiritual (foi até bastante materializada), foi prestada sem conhecerem muito bem a minha história… Só depois de me resolverem um enorme problema se aperceberam da dimensão da minha provação… Posto isto e depois de me darem a mão, ofereceram-me então a ajuda espiritual. Ajuda que acabei por não agarrar, apesar de acreditar que Deus me pôs estes irmãos no caminho… Porquê? Porque estava tudo muito fresco, tudo muito confuso, por não saber para onde caminhar e porque apesar de sempre ter reconhecido os evangélicos como irmãos cristãos, sou devota de Maria. Eu, confessionário, era daquelas pessoas que não vão à missa mas que vão a Fátima. Não queimar velas ou andar de joelhos. Ia apenas beber daquela paz que se sente naquele santuário e falar com a Mãe de Jesus, tal como continuo a fazer com ou sem a presença da sua Imagem.
Desde daquele dia em que tudo mudou, em que parte de mim morreu e se obrigou a renascer que sinto o colo de Deus. Palavras sábias aquelas que me disseram “ Não há Cruz sem Cristo, nem Cristo sem Cruz”. Os meses foram passando e reaproximei-me da Igreja Católica, voltei a ir à missa e até mesmo a comungar. Não lhe consigo chamar uma reconciliação com Deus. Deus esteve sempre na minha vida nos bons e maus momentos. Foi de facto apenas uma reaproximação da Igreja que deixei de frequentar com assiduidade no início da adolescência.
Hoje olho para os últimos meses e faço o balanço do “proveito” espiritual que retirei desta reaproximação. As homilias: na maioria das vezes extremamente apaziguadoras e com excelentes pontos de reflexão. Um sacerdote com um grande dom da palavra e que emana iluminação quando a toma. Inexplicavelmente, enquanto Pastor o seu trabalho, pelo menos nesta paróquia resume-se à celebração da Eucaristia uma vez por semana. Convém referir que se trata de uma freguesia de cerca de 300 habitantes com uma comunidade católica praticante de não mais de 15 a 20 pessoas, cuja média de idades rondará os 55 anos, e que se trata de um sacerdote com várias paróquias a cargo a uns quantos km de distância, o que não facilita a tarefa. Ainda assim existem crianças, existem casais jovens e nada é feito para os chamar à Igreja a ouvir aquelas homilias. Investe-se muito pouco no aumento e fortalecimento da comunidade. Não é gente sem Fé é gente que vai a Fátima. Friso que isto é o que eu sinto e que está na base da minha rabugice com a Igreja… Esta postura ou forma de “gestão” da Igreja aqui, digo-o francamente com humildade, pode até revestir-se de uma sabedoria que eu não atinjo. Mas eu sinto assim e só consigo viver sentindo, sentido o que faço, o que me é feito e numa luta diária para que as minhas palavras e atitudes revelem os meus melhores sentimentos, o que é evidente não acontece sempre ou seria Santa e estou longe disso.
Disse-me uma vez um sacerdote que não acredita que se possa ser um bom Cristão sem ir à missa. Pois eu discordo. Diria antes, e pelo que tenho apreciado, que ir à missa não implica de todo ser um bom Cristão. A Fé sem Obra de pouco vale e eu dou primazia à Obra. Recordo agora algo que vi no youtube: Ricardo Araújo Pereira enquanto orador numa conferência episcopal. Alguém que apesar de ter tido uma forte formação católica se assume como ateu. Depois de ouvir toda a sua palestra recordo-me de ter o seguinte pensamento “é de facto um ateu com uma atitude muito cristã”
Sinto-me tentada a desistir da Igreja e voltar ao que era antes. Mas o que era antes não pode mais ser, porque Deus entendeu levar para junto dele o meu companheiro na Fé.
SL
Bom dia!
"porque me questionei que fés imitam ou aprendem as nossas crianças com os cristãos que somos."
Claro está que a criança é o reflexo dos que admira, que por volta dessa idade serão os pais.
Temos espelhado nas nossas crianças jovens e adultos o fruto da sementeira do passado.
O meu desejo é que sejamos fortes o suficiente para que, tal como alguém escreveu um dia, a criança que que fomos não se envergonhe dos adultos que somos.
Gostei do titulo a imagem da criança e do santuário, costumo pensar que a criança é o santuário desse Deus que nos escapa.
Por uma questão de aritmética!...
Cheguei à conclusão
De quem o inferno não existe.
Nem sequer o purgatório,
Como tanto pregaram...
Pois se eu tenho
Quatro filhos.
Jamais seria capaz de os lançar ao fogo...
Que será Deus...
Que quis, de graça, ser nosso Pai?...
Vejam a festa que Ele fez
Ao filho pródigo...
Que pediu a herança
E foi correr mundo...
Fez-lhe uma festa
E recebeu-o de novo,
Sem pedir contas!...
Berlim, 14 de Janeiro de 2014
14h42m
Anónimo de 13 Janeiro, 2014 21:50
Concordo contigo e com esse padre: nóa não somos ninguém para julgar os outros ou as suas atitudes. Porém, podemos ter uma opinião, uma forma de reação ou de sentir, certo?!
Olá SL
Um bom cristão precisa de alimentar a sua fé, e isso acontece de maneira especialíssima na Eucaristia (mas não só). Um bom cristão prova a sua fé na vida (e não apenas ou muito na missa). Percebes a diferença?!
Mais, como cristãos precisamos de muita coisa, e tb precisamos eventualmente de ir a Fatima, e de sermos autênticos na nossa fé e na nossa vida, e sermos mais acolhedores, sobretudo quando os que estão ao nosso lado precisam... precisamos muita coisa! oh se precisamos
Anónimo de 14 Janeiro, 2014 09:00
Gostei muito da frase: "costumo pensar que a criança é o santuário desse Deus que nos escapa."
Confessionário,
entre as muitas coisas que precisamos, precisamos certamente de si e dessa sua entrega, precisamos de si enquanto exemplo. Quanto à minha rabugice veremos se ela passa... Percebo a diferença e experimento essa forma especial de alimentar a fé cada vez que comungo. Mas às vezes olho em volta e parece que há coisas que não "encaixam"... ou sou eu que não estou "encaixada"... O tempo o dirá.
SL
Sl, eu às vezes tb nao encaixo!
Pois não, lol
SL
Bom dia,
Obrigada confessionário por todos os comentários que fez individualmente a cada um dos comentário, gostei da forma como o fez, denota uma atitude até agora nunca demonstrada.
O "interesse" demonstrado revela uma proximidade "saudável" dos leigos que por aqui passam...
Para mim essa "proximidade" é importante e faz a diferença.
Obrigada pois por este novo rosto do confessionário, que aponta para todos e cada um em particular, sem no entanto nos intimidar.
Anónimo de 14 Janeiro, 2014 09:00
Fique bem!
É claro que podes, não és perfeito.
anónimo de 15 Janeiro, 2014 08:53
Na verdade nem sempre tenho o tempo disponível para responder assim.
Além disso, também acho que o espaço aberto a outras pessoas que respondam ou possam responder é interessante.
E mais ainda, nem sempre tenho resposta pronta!
Mas agradeço muito as tuas palavras... e tê-las-ei em consideração (dentro do disponível-possível)
Caro Confessionário,
Presto serviço em Fátima há alguns anos e não queria deixar de partilhar consigo uma história: um dia estava um senhor já com os seus 60 e tal anos a cumprir a sua promessa na passadeira, vinha de rastos, ao seu confrontado por uma colega minha dizendo-lhe que Nossa Senhora não pediu estes sacrificios, mas a emenda de vida o peregrino saiu-se com esta resposta: "Minha senhora, se pude andar de rastos na guerra para matar outros, quanto mais não posso andar de rastos para agradecer a Nossa Senhora ter regressado com vida e saúde a casa!"....
Antes de prestar serviço no Santuário, também eu não conseguia entender este tipo de situações, mas o contacto com os peregrinos e a partilha que fazem de suas vidas, levam-me a rezar mais intensamente pela nossa conversão. É o pedido que nos foi feito em Fátima, oração, penitência e conversão. E sempre que lá estou e vejo todas aquelas pessoas com uma infinidade de motivações para estarem ali, peço a Nossa Senhora que as converta a elas para que a sua Fé cresça e a mim para que nãoos julgue e acolha tal e qual como Ela faz. "Não apagará a chama que ainda fumega…» (Mt 12,20)
Tb quero pensar assim...
Bom dia,
"nem sempre tenho o tempo disponível para responder assim."
Nem sempre nem nunca é isso que faz com sejamos gente.
Compreendo que não tenha tempo não somos donos das nossas horas.
A sua área de actuação requer um estar presente por inteiro.
"Além disso, também acho que o espaço aberto a outras pessoas que respondam ou possam responder é interessante."
Também eu acho que é enriquecedor, mesmo o que parece ser negativo.
"E mais ainda, nem sempre tenho resposta pronta!"
É bom que assim seja muito bom mesmo, pois uma pessoa que tem sempre resposta pronta, tal como certezas absolutas para tudo na vida, tudo soa a superficialidade.
Fique bem.
Eu gosto de pensar que apesar de estar longe de ser perfeita, transmiti a fé e devoção que me foi passada pela querida avó, pelos pais... meus filhos me acompanham desde que estavam na minha barriga e sinto me orgulhosa pois os dois desde pequeninos tiravam a chupeta para cantar o glória... para falar com Jesus... e é nesta continuação que quero continuar a caminhada com eles...
Compreendo o que diz.
No entanto, aprendi a nunca questionar os actos de uma criança, sobretudo no que diz respeito à sua relação com Deus.
As crianças, têm perante experiências limite,as mais variadas posturas.
E são sempre elas, que nos fazem calar.
-Estas a desenhar uma ponte?
-Estou.
-Vejo o céu, a água por baixo, mas a ponte não tem fim...(a ponte começava no princípio do papel e terminava abruptamente, a meio). Podíamos "pegar" uma estrada á ponte, o que achas?
-Não é preciso.
M. 5 anos, doente oncológica
(realmente e, infelizmente, para nós que as vemos partir, não foi preciso)
M, tb te compreendo.
Mas eu não estou tanto a questionar o acto da criança, mas os nossos actos de adultos.
Desculpa, chamei-te M, mas foi para situar, pois pressuponho que a M seja a criança de 5 anos...
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