segunda-feira, agosto 27, 2018

Quilómetros e quilómetros percorridos

Percorria centenas, senão milhares de quilómetros, sentado ou deitado no sofá azul da sala. Não era verde porque o azul condizia melhor com a cor que mais gostava. Contudo, neste momento, ele preferia que fosse verde. Preferia que tudo fosse verde e iluminasse de esperança a sua vida. Ou melhor, a vida de quem amava. A cabeça não parava. Mesmo com os olhos fechados. Percorria centenas, senão milhares de quilómetros, a pensar como era, como fora, e como seria. Nunca pensava no como é agora, neste instante. Isso é apenas para sentir-se. Não é para pensar-se. Nós usamos geralmente o pensamento fora do controlo emocional. Por isso anda, corre, voa por todo o lado em busca de um algo que não se encontra. Faz quilómetros sem conta, para trás, para a frente. Faz quilómetros de estradas, de cidade em cidade, de terra em terra, e faz quilómetros de tempo, para o passado e para o futuro. 
Apesar da quietude do espaço, da ausência de ruídos ao redor do meu sofá, eu não páro. Não páro, porque hoje estou muito longe de mim. Estou onde está alguém que amo, alguém a quem tenho uma ligação especial. É uma ligação de sangue e de fé. Meu pai. Meu pai que hoje dá entrada numa nova vida e não consigo deixar de percorrer quilómetros em busca do seu bem-estar. Em busca de uma imagem que me faça pensar que ele está “bem, mas bem”, expressão que costuma usar, e que todo o seu estado actual de saúde não é mais do que uma ficção de Deus.

5 comentários:

Zilda disse...

Me fez chorar, voltei alguns quilômetros, dias lá atrás difíceis de aceitação. Onde havia muitas pessoas mas pra mim, estava faltando alguém que amava...e me amava de verdade. A dor da alma ferida muitas vezes pensamos que jamais será curada.Mas ainda era e é o remédio o silêncio o assistente meio precavido. Mas insiste fazer a gente pensar e chorar até adormecer para que seu anjo de guarda ti acolha ao despertar com um ar de dormência espiritual. Ti informando levante, siga a tua estrada. Seja forte.

Zilda disse...

Hoje acabei aceitando que foi difícil entender que todo cristão tem, uma cruz pra carregar e uma estrela pra seguir.

Anónimo disse...

Uma nova etapa é apenas isso: uma nova etapa. As pessoas não mudam, mesmo que envelheçam, ou percam capacidades. E as relações também não mudam quando há amor. Por isso sei que não lhe faltará o amor que sempre teve, nem a presença constante, mesmo que tenham de ser percorridas centenas ou milhares de quilómetros. O longe faz-se perto...
E a certeza de que lhe quereis bem e tudo fazeis pelo seu melhor, também vos ajudará a percorrer esses quilómetros com outra serenidade.
Por certo continuará a estar "bem, mas bem". E vós também!
Um grande abraço
LPS

Anónimo disse...

A vida...e Deus a fazer a Sua vontade e não a nossa, como deve ser.
Mas este texto está...
Bj

Ailime disse...

Um texto muito belo, apesar do motivo que o originou.
Sr. Padre, coragem!
Ailime