quarta-feira, abril 29, 2009

O colarinho branco

Os óculos adivinham uma pessoa arguta. A Cláudia é uma jovem interessada. Gosta de saber aquilo que não entende. Faz parte do meu grupito de jovens. Reunimos mais ou menos de quinze em quinze dias, que a minha disponibilidade não dá para mais. Há dias fomos visitar uma casa de saúde especial. Foi a nossa partilha de Natal. Íamos na carrinha quando ela dispara, sem mais. Porque é que alguns padres vestem aquele colarinho branco?
No meio da música que se ouvia na rádio, esbocei primeiro um sorriso, depois um gesto de afago, e por fim, aproveitei. Não se trata de um colarinho. Só faltava chamar-lhe coleira. Rimos pelo colarinho e pela coleira. Chama-se cabeção. Os outros que iam na carrinha aumentaram a dose de gargalhadas. Cabeção por causa das cabeças dos padres serem grandes? E continuavam troçando do assunto. Eu também quisera troçar do assunto, porque habitualmente possuo relutâncias com ele, como se um hábito fizesse o monge, ou um adereço fizesse adivinhar a postura da pessoa. Costumo achar que as pessoas são o que vivem e não o que vestem. Mas reconheço igualmente que a forma como cada um se apresenta explica a sua pessoa ou personalidade. Só não o faz ser como se apresenta. Sabem, existe dentro de mim um misto de repugnância e pena por aqueles que me parecem querer ser reconhecidos como padres porque usam um cabeção ou uma batina. Esta ainda me faz mais confusão. Há dias soube de uns indivíduos que entraram num autocarro de batina em direcção a Fátima. Captaram sobre si as atenções e a gentil atenção de alguns. Porém, de padres apenas tinham o hábito. Por tudo isto evito estes assuntos. E tento compreender, aceitar, respeitar quem não usa a roupa como eu, ou pensar que quem usa o cabeção o faz como sinal e não como desejo de se fazer parecer.
Assim limitei-me a explicar à Cláudia e ao resto do pessoal que a Igreja propunha alguns andrajos como adequados à situação sacerdotal. O Código de Direito Canónico fala de uns andrajos simples e discretos, de cores com os mesmos adjectivos acinzentados. Por isso tínhamos de concordar com quem se vestisse assim. Até expliquei que podiam tornar-se oportunos em determinadas ocasiões, como em lugares com pró-formas. Mas, ó padre, nós gostamos de ver que o padre é um de nós, que vive como nós e não à parte e que com isso nos leva ao essencial. Eu disse Pois, para concordar até certo ponto. Porque o padre tem de ser sempre sinal, não de diferença, mas da diferença de Deus. Até certo ponto também se calaram. Mas a Cláudia não. Padre, mas as cores que o senhor veste não serão sinal da alegria e do amor de Deus? Isso do cabeção, da batina e das cores acinzentadas não faz parecer Deus alguém que está triste?

quarta-feira, abril 22, 2009

Esta é para ti, Diana, parte II

Sentou-se no sofá porque é mais cómodo para a sua doença. Fica cansada com facilidade. Não consegue reter muita comida e energia. Retém a respiração consoante os pulmões lhe permitem. Devo exagerar, porque não faço muitas considerações à doença. Vejo-a como os outros jovens da sua idade. Nem mais nem menos. Só as nossas conversas são diferentes. Porque não há como ir direito aos assuntos. Não há como falar do que é essencial. Padre, diga-me que valor e sentido tem o sofrimento. De que serve? Porque se sofre?
Claro que as quatro ou cinco perguntas que fez com o mesmo rumo me deixaram descalço. Por isso encolhi as pernas e fiz uns raciocínios que há tempos venho fazendo, porque sem dúvida que este é um dos enigmas maiores da humanidade, mais incómodos e sombrios. Não é por acaso que a maioria dos doentes, nos ditos países mais desenvolvidos, morrem nos hospitais. Ninguém os quer em casa.
Apeteceu-me responder que com a dor descobrimos o sabor da não dor. Era um raciocínio algo lógico, mas superficial. Por isso avancei essa parte, para encontrar sentido no que queria dizer.
Encarei-a de frente e disse. Diana. Repeti. Diana. Sofremos, porque somos frágeis e limitados. Não somos deuses e senhores da vida. Somos apenas seus administradores. E sabias que isso pode fazer-nos reconhecer a necessidade de Deus? Por sermos limitados, mais facilmente aceitamos que os outros tenham limitações, o que nos põe em pé de igualdades. Não somos superiores a ninguém. Na dor e na morte somos todos iguais. Não há capacidades, bens, riquezas, poderes que lhes resistam. Por sermos limitados, mais facilmente nos sentimos necessitados dos outros. Entendes como a dor pode melhorar os relacionamentos entre as pessoas? Evitar guerras? Evitar conflitos?
Sofremos para nos aproximarmos mais de Deus. Porque nos sabemos, como já disse, necessitados de Deus. Repeti este raciocínio de propósito. Os auto-suficientes não precisam nem dos outros nem de Deus. O sofrimento tem a capacidade de nos fazer descobrir o que é essencial na vida, como tu sabes melhor que eu. Quem melhor do que aquele que sofre para saber o que vale a e na vida!
Incrível como Deus sempre fez com que, no mundo, as coisas grandes se fizessem com as coisas mais frágeis! Incrível como o sofrimento tem a capacidade de nos fazer Viver.

sexta-feira, abril 17, 2009

Ele disse que tinha utilizado um preservativo

Mal se sentou ao meu lado, disse. Senhor padre, utilizei um preservativo. Soube logo que o objectivo era verificar a minha reacção e saber a minha opinião. Falou com malandrice. Mas deve-o ter usado bastas vezes. Não abri muito os olhos. Não devo mesmo ter esboçado qualquer reacção. Tratei as coisas por tu. Isso já não me causa muita confusão. Sabes o que te digo e sem muitos rodeios. O seu a seu dono. Cada coisa no seu lugar. Pergunto-te. Para que servem os preservativos? Ele respondeu que para evitar contagio de doenças infecto-contagiosas. Continuei com o olhar da pergunta e ele percebeu. Também pode servir para evitar uma gravidez. O meu olhar permaneceu incólume. Ele não sabia que responder mais e perguntou. Diga lá então, padre. Olha, meu amigo, o preservativo também pode servir para usarmos o sexo de forma descontrolada, não pensada, não dirigida. Instintiva. Não retiro valor ao sexo, ou melhor, à sexualidade. Se Deus quis que o homem fosse criado com a ajuda do próprio homem através da relação sexual, já por si é algo maravilhoso. Mas o mais bonito para mim é a relação sexual ser a expressão de amor mais íntima, bonita e completa que Deus criou. Eu enquadro o preservativo nisto tudo que acabei de dizer.
A malandrice do Tó passou a ser mais que malandrice, uma curiosidade. Mas a Igreja condena o preservativo, não é? Falemos antes em magistério da Igreja, amigo, porque tanto eu como tu somos Igr. Digo-te, para já, que concordo com a teoria de que o preservativo, por princípio e por norma, é de condenar. Ò padre, interveio ele, olhe que há bispos que já dizem coisas mais prá frente. Ó Tó, se calhar dizem exactamente o mesmo que eu. Assim como me parece que as opiniões que têm originado muitas confusões, não serão muito diferentes umas das outras. A Igreja, magistério, tem sempre de apontar o caminho ideal. Eu penso que não deve desviar-se nem um milímetro. E depois deve considerar que nem toda a gente sabe pisar esse caminho, mas que são pessoas na mesma, criadas com o mesmo amor de Deus. Explico. A atenção e o acolhimento de cada pessoa humana estarão sempre em primeiro lugar no projecto de Deus. Assim ensinou Jesus com a Sua vida. Podemos condenar o pecado, mas não o pecador. As atitudes e opções, mas não quem as faz. A fragilidade, mas não a pessoa frágil. E ainda fica salvaguardada a consciência de cada um. Presumo que assim seja também o entendimento dos bispos e dos que orientam a Igreja.
Mas pensemos de novo no preservativo em si. Já ouvi muitas vozes da Igreja, magistério, afirmar que o uso deste contraceptivo poderá será a única solução para um casal em que um dos dois tenha essa doença da Sida. Ou então a abstinência. Porém, como todos sabemos seria anti-natura que um casal não usufruísse desse momento que é o mais belo e o mais íntimo de um casal, a relação sexual. Concordo sem problemas morais. Porque o que está em causa é o amor de duas pessoas que se entregaram uma à outra numa verdade de amor.
A minha opinião sincera é que tudo requer uma situação e um contexto próprios. Também o uso de preservativos. Custa-me que ele seja badalado para o uso incorrecto do amor. Explico. A maior parte das vezes serve como álibi para cada um fazer o que bem lhe apetecer, para cada um tirar o máximo de partido do prazer. Não que o prazer seja mau ou condenável. Mas que em primeiro lugar se badale o amor e a fidelidade. O problema do preservativo não está em si, mas na raiz do problema da nossa sociedade. Usa-se e abusa-se do outro e descarta-se, como o preservativo. Não se ama. Usa-se. Usa-se o preservativo não para proteger, mas para poder descontrolar-se. Usa-se para poder ter os parceiros que se quiser, mas não para amar. A campanha contra a Sida devia incentivar mais esta forma de encarar o sexo. Dentro do amor e da fidelidade, tudo é explicável. Fora, poderá ser a forma mais fácil de encarar o problema. A Sida é um problema. Grave. Duro. Sofrido. O preservativo poderá ser uma forma de a combater. Sem dúvida que o é, ainda que não a 100%. E até de outras doenças venéreas. Mas que não seja a desculpa para um falso amor, ou utilização plural do corpo. Hoje uma ou um e amanhã ou daqui a nada outra ou outro.

quarta-feira, abril 08, 2009

Esta é para ti, Diana, parte I

A Diana é uma menina que nasceu com uma doença sem cura. Tem um nome complicado. Não o aprendi porque tenho estado mais atento à pessoa que é sua portadora. Mas é um nome complicado. Tão complicado como a doença. Vive mais dias no hospital que em casa. Já se passeia pelos corredores como sendo a sua sala de espera. Falamos muito, sobretudo quando ela precisa de alguém que lhe dê duas palavras para alimentar forças. Temos falado muito sobre o céu e o inferno. A vida para além da morte. O que Deus nos tem preparado e o que espera de nós. O que Ele nos dá e o que nós temos ou merecemos. A nossa história. A história de outros tantos que sofrem ou já partiram. O tempo. A vida. Há dias recebi esta mensagem da Diana: Aprendi que o tempo é muito precioso e não volta atrás. Por isso não vale a pena resgatar o passado. O que vale a pena é construir o futuro.
Escusado será dizer que me lembrou as vezes que complicamos a vida, sem necessidade e presos a um passado que nos faz resistir à própria vida. Ela sabe o que é necessário viver. Tenho-a recordado que o importante não é o tempo que vivemos, mas a intensidade com que se vive. Faz uma vida normal, naturalmente. O que a natureza permite. Quando me procura julga que eu a ensino muito. Mas é sobretudo ela que me ensina. Porque vive num limite em que é Deus que comanda e não os homens.

quinta-feira, abril 02, 2009

sondagem_ “Preocupas-te em cumprir ou viver o que é aconselhado na Quaresma?”

Passado que vai mais de um mês da última sondagem, bem como mais de 400 votos, e quase a aproximar-nos da Páscoa, chegou a hora de avaliar a sondagem que estava no lado esquerdo, no sidebar. A questão era:
“Preocupas-te em cumprir ou viver o que é aconselhado na Quaresma?”

E os resultados são:
1. sou indiferente _ 34 %
2. sim, mas a 50 % _32%
2. sim, a 100 % _23%
4. pouco, 25% a 50% _4%
5. o que é isso? _ 2%
_________________________
pequenas considerações:
  1. Suponho que para a escolha da opção mais votada devem ter contribuído alguns penitentes que não são católicos nem se sentem obrigados a viver a Quaresma. No entanto, e já o previa, devem existir muitos católicos para quem a vivência da Quaresma é algo indiferente. Não acrescenta nem tira nada à sua fé. Das duas, uma: ou deixaram de se interessar pela vivência apenas tradicional de alguns preceitos da Igreja, ou tencionam viver uma forma de cristianismo longe de algumas vivências úteis e se calhar imprescindíveis à fé. Independentemente desta consideração, o facto desta opção ter sido a mais votada deixa-me alguma preocupação. Até que ponto as propostas da Igreja são válidas ao caminho de fé daqueles que pretendem fazer uma caminhada quase individual e onde o relativismo se torna norma?
  2. A segunda opção não me faz pensar em nada a não ser que desejava que tivesse sido a mais votada. Perguntar-me-eis porquê e eu responderei que no meio está a virtude. Ou dito de outra forma: quase ninguém consegue ser a 100 % e seria normal a escolha; e o patamar dos 100% pode parece que já não há necessidade de fazer caminho.
  3. Apesar da afirmação que fiz na anterior consideração, é óbvio que me congratulo imenso com aqueles que conseguiram votar na opção "a 100 %". Perguntar-me-eis se não estou a entrar em contradição, e eu direi que uma coisa é aquilo que eu acho mais plausível e outra o ideal de vida. Quem conseguiu chegar a este patamar, está de parabéns.
  4. Aos que escolheram a 4ª e a 5ª opção, remeto-os para um post anterior que responde à pergunta “Para que foi inventada uma Quaresma?”.

Com os olhos postos na Páscoa e naquilo que deve ser a raiz da nossa fé, hoje surge nova sondagem. E a pergunta é muito simples e directa:

Acreditas na Ressurreição?

quinta-feira, março 26, 2009

Deus não escolhe os preparados

Preciso de paroquianos empenhados num determinado serviço. Procuro. Penso. Reflicto. Rezo as possíveis escolhas. Não se encontram os perfeitos. Penso em mim e depressa concluo que não têm de ser especiais nem perfeitos. Eu também não sou. Têm apenas de ser escolhidos, chamados. É o que faço depois de vários meses nisto.
Iniciam-se as tarefas ou serviços pretendidos. Os tais paroquianos tornam-se alvo de comentários, uns bons outros maus, sobretudo na base do porque é que foram escolhidos. Porque sim ou porque não. Se são bons ou não. Se são as escolhas acertadas. Para mim são apenas as escolhas aceites. Mas há quem não pense assim, ou melhor, que pense contra. São as vozes daqueles que confundem a perfeição com a vida e transportam para os outros as suas inércias ou limitações ou recalcamentos. A voz de uma dessas senhoras confrontou-me directamente. Ao menos foi corajosa e não foi, como muitas outras vozes, apanágio do falar nas costas. Insistiu imenso que a pessoa tal tinha sido um tamanho erro sem perdão Respondi-lhe, como em tempos alguém me dizia. Para fazer do mundo um jardim, devemos concentrar-nos em fazer do nosso um belo jardim. Quando todos assim fizerem o mundo poderá tornar-se um belo jardim. Mas como teimamos em apontar erros aos jardins dos outros, sobra-nos pouco tempo para nos dedicarmos ao nosso. Ela firmou a sua posição com O senhor padre diz isso porque o erro da escolha foi seu. Com a mesma coragem e firmeza com que ela falou, eu respondi. Deus não escolhe os preparados. Prepara os escolhidos.

sábado, março 21, 2009

Para que foi inventada uma Quaresma?

O diálogo surgiu pouco depois da missa, à saída da Igreja, num a propósito destas coisas da quaresma. Estávamos umas cinco pessoas a falar do que era antigamente e do que era hoje. No que eram os hábitos antigos do não comer carne ou do não comer verduras no dia de ramos, no que era a bula e as amentações das almas. Uma série de coisas que a Igreja sempre nos propôs, senhor padre. Que sentido têm essas coisas? Para que foi inventada uma quaresma? Expliquei primeiro o significado dos quarenta dias de deserto antes da Páscoa. Falei depois no maior acontecimento para o sentido da vida de quem tem fé. A Ressurreição. Que não era coisa para banalizar, ou para ter como mais uma tradição bonita da nossa Igreja. Que a Quaresma era uma ocasião para tornarmos especial esse acontecimento. Que era uma ocasião para nos encontrarmos com o sentido da nossa vida. Aproveitando a situação que se vive da famosa crise que vai entrando nos bolsos de todos, falei na oportunidade que esta quaresma de 2009 pode ser para todos. Porque aquilo que nos é aconselhado nesta época litúrgica, tal como o Jejum e abstinência, esmola, sacrifícios, oração, penitência, leitura da Palavra de Deus, austeridade nas igrejas e cerimónias com ausência de flores, Glória, Aleluia, entre outros, minhas amigas, servem um propósito apenas: encontrarmo-nos connosco próprios em confronto com um Cristo ressuscitado, um encontro com o essencial da vida desprendido de embrulhos, um reencontrarmo-nos com os valores essenciais para vivermos rumo à felicidade e ao sentido da vida. Se repararem bem, disse, tudo o que nos é aconselhado ajuda a rebuscarmos alguns valores que dão mais sentido à vida. O desprendimento, a partilha, a solidariedade, a austeridade, o poder do sacrifício entre outros. Tudo o que envolve a Quaresma pode ajudar-nos a redescobrir as coisas essenciais que são deveras importantes e imprescindíveis para se viver com sentido. Serve ainda para prepararmos a nossa libertação, aquilo que chamamos de Páscoa. Por isso, amigas, usem e abusem da Quaresma para encontrar a vossa verdadeira vida, aquilo que lhe dá sabor. E que esta Quaresma de 2009 seja uma oportunidade para fazermos Páscoa na nossa vida e nesta época histórica.
Não sei se elas entenderam. Mas pelo menos não me fizeram mais perguntas. Talvez as tenham feitas a elas próprias depois.

quarta-feira, março 18, 2009

A morfina da ti Maria

Telefonou para o confessionário a filha. Ou a sua lagrimita. Fui lá logo nesse dia. A mãe, que visito regularmente (o que o regular me permite), está de cama há anos. Piorando. Claro. É isso que, doente, na maioria das vezes, se faz na cama e na idade. Estava a dormir. Olhe o senhor padre. Ela sorriu. Tinha levado morfina há poucas horas. A noite anterior tinha sido violenta. Para a mãe, filha e genro. O médico dera a entender. Por isso as lágrimas da filha implorando auxílio. Custa sempre. Caramba. Fiz por mostrar um sorriso também. A ti Maria mal se percebia, mas estava lúcida. Ouvi muito calado. Aprendi. Mulher de fé, de sofrimento, mas de ânimo. Depois disse umas doidices. Já está habituada. Este padre é maluco. Fartámo-nos de rir. Até a filha. Ó Mãe, já há tanto que não rias assim! Ajoelhei-me aos seus pés. Perguntei se precisava algo que eu pudesse fazer. Podia confessar, ou sei lá. Tipo a Unção dos doentes. Disse assim para que não parecesse o fim. Há gente ainda que assimila o sacramento como “extrema unção”. Fiquei pasmado. Que bom! Claro que quero. A filha ficou aliviada. Celebrámos o sacramento. No final ainda ficámos mais um bocadão. Rimos muito. Ai este padre! É o padre mais maluco que conheço… mas se calhar é mais padre que muitos. Fiquei sem palavras. Nem sabia se referir. Mas o que ouvi de seguida deixou-me, não só sem palavras, como sem pensamentos. Deus gosta muito de mim!

sexta-feira, março 13, 2009

A medida do padre

Há pessoas que pensam que os padres se ordenaram para serem párocos. O nosso pároco. É nosso. É meu. Mas eles ordenaram-se para serem padres. E o padre não é apenas aquele que tem uma paróquia. É aquele que vive à maneira de Jesus prolongando os Seus braços de forma ministerial. Faz-se instrumento de Deus na Celebração, na Palavra, na Vida. Gosto muito da vida paroquial. Não sei se aguentaria não ser pároco. Mas não consigo entender como as pessoas podem ser egoístas ao ponto de demonstrarem que o seu pároco não pode fazer mais coisas que estar na paróquia. Já uma vez disse que não há pior que o “egoísmo de deus”, querermos Deus só para nós e como nós O queremos. Também não há maior egoísmo paroquial que querer a paróquia e o pároco à sua medida, no seu tempo e na sua forma. Como se as coisas de Deus fossem finitas ou tivessem medida.

segunda-feira, março 09, 2009

Um erro não é a vida

O João cometeu um erro. Grave, pode dizer-se. A paróquia foi lesada. Eu fui lesado. Não interessa senão saber que podia ser um caso. No entanto decidi chamar a pessoa à consciência. Chamá-la à verdade de uma existência com verdade. No mínimo dar-lhe a oportunidade de perceber que existiu um erro. Mas que esse erro não é a vida. A vida é o que fazemos com que ela seja motivo para sermos felizes. Decidi escrever e ouvir. Perguntar. Indagar. Decidi esperar. O erro resolveu-se por ele, ou pelo João na procura de uma saída. Mas o António, que assistira a tudo, exigira uma outra atitude do padre.
Senhor António, as pessoas exigem que resolvamos os assuntos paroquiais à maneira humana. Um tribunal. Para um lado os bons e para o outro os maus. Vencer os maus. Derrotá-los. Mostrar quem manda. Mas eu sou padre e portanto deveria ser um homem de Deus, fazer como Deus. Jesus escrevia no chão enquanto à sua volta queriam apedrejar a pecadora. Jesus queria mudar o coração da pecadora e dos outros, tão pecadores como ela. Não pretendia julgar pura e simplesmente. Acho que posso afirmar que a Sua intenção nunca foi a de definir o mal e o bem, ou indicar o que é mal e o que é bem. A Sua intenção era transformar o mal, construir o homem novo a partir de dentro, a partir do coração do homem. Por isso foi chamada da maior revolução, porque não era exterior. E por isso fico baralhado quando me exigem que não faça como Ele. Quando esperam, ou melhor, anseiam, que faça sangue, que faça sofrer quem fez sofrer a paróquia ou o seu pároco. Por muito que às vezes tivesse vontade de o fazer, não consigo. Não tem a ver com aquilo que eu sinto de Deus.