quarta-feira, novembro 14, 2012

Na lareira 2

Volto de novo à lareira que fica na casa de retiros onde me encontro. Continua a chover, e continuo sozinho. Depois da noite de ontem, apanhei o vício de vir à lareira quando todos já estão no silêncio dos seus quartos. Estamos quase duas dezenas de padres neste retiro. Estamos vários dias. Como está frio, a lareira é um ponto de chegada e de partida. Por isso quero partir da lareira. Quero partir da lareira para chegar a Ti, como se este calor fosse uma amostra do grande calor que me espera ao fim do caminho. Por falar, em caminho, hoje descobri, mais uma vez, que Tu és Caminho, e digo alto aquela expressão que se ouve dizer por ai. O Caminho faz-se caminhando. Porém, como vivo, insistentemente, à volta do que tenho de fazer, do que me cansa e me desilude, do que eu não queria que fosse assim, transformo estas coisas no meu verdadeiro deus, porque é a elas que dedico a minha atenção, a minha vida, o meu desamor. Por conseguinte o caminho fica por fazer. E quando penso, como agora, em reatá-lo, já não lhe sei a direcção. As voltas à volta das coisas que tornei deus, deixaram-me zonzo, perdido. Não estou triste, Senhor. Está só a chover, a noite começou e faz frio. Mas com esta chuva, talvez o vidro se desembacie e eu descubra de uma vez por todas o Caminho que leva à terra prometida. Faz-me bem limpar estas coisas. Torná-las mais nítidas. Vou aquecer-me mais um pouco e vou dormir. Amanhã apetece-me procurar esse caminho.

14 comentários:

Anónimo disse...

Sempre que passo pelo meio de uma floresta, uma das coisas que mais atraem a minha atenção são aquelas arvorezinhas ainda do tamanho de rebentos no meio daquelas outras enormes e frondosas que as rodeiam… foi algo que aprendi a ver com o coração e não apenas com os olhos quando era miúdo…

Confessionário, assim te imaginei agora também a partir desta tua oração…

…como se fosses um pequenino rebento no meio de todas essas “florestas” densas de preocupações que às vezes projectam sombras enormes no nosso coração…

Nos dias mais áridos e desérticos da tua existência, nunca esqueças que esse pequeno rebento um dia transformar-se-á também numa dessas árvores fortes e frondosas e que junto a todas as outras, dão alguma sombra refrescante no meio dos montes dos desertos desta vida onde acampamos abrigados nas tendas da comunhão…!

“Quão formosos são, sobre os montes, os pés do que anuncia as boas novas…” Isaías 52,7

vp

maria disse...

Olá moço :)

ando a publicar no meu blogue uns extratos de um livro do JM Castillo. O último, penso que ajuda a iluminar este teu texto.

Beijinhos

Adalberto Macedo disse...

Confessionário.
“Porém, como vivo, insistentemente, à volta do que tenho de fazer, do que me cansa e me desilude, do que eu não queria que fosse assim, transformo estas coisas no meu verdadeiro deus, porque é a elas que dedico a minha atenção, a minha vida, o meu desamor…”
Nem sempre é possível fazer-se o que nos dá prazer! Tenta tirar prazer do que fazes. Não faças como o viajante ingrato, que reclama pela falta da lua no céu, enquanto as estrelas brilham para iluminar o seu caminho. Faz como a criança que cai e não busca culpados pela queda: apenas se levanta para tentar de novo, com mais vigor e entusiasmo. O CAMINHO FAZ-SE CAMINHANDO … com quedas e alguns tropeções …
Abraço e boa caminhada

Marlene disse...

Ganhou um selinho meu...

http://munguniupendo.blogspot.pt/2012/11/que-belo-presentinho.html

Unknown disse...

Confessionário dum Padre e da VIDA. Bem hajam Padres que corajosamente caminham e partilham o seu sentir. Um forte e longo ABRAÇO. Ana

Anónimo disse...

"... o Caminho que leva à terra prometida. ..."
Um dia esta foi a terra que me foi prometida.
Deixei familia, trabalho, amigos, e vim.
E comecei (não uma vida nova, a vida nem é nova nem velha, não se começa nem se acaba), a viver neste lugar.

A viagem até aqui foi atribulada.
Implicou muitas dúvida, muitas noites sem dormir, de lareira apagada com "chuva e frio lá fora". Fi-la sozinha.
Não existe caminho.
Existe em cada um, a "obrigação" de chegar.
E chegaremos no dia em que deixarmos de procurar fora, o que está apenas dentro de nós.

A lareira continua apagada, lá fora não chove, mas faz um vento muito forte (aviso laranja), apesar da intensidade do vento dentro de mim existe agora uma também forte certeza.
Quero chegar ao meu coração.
Quero chegar a Ti Senhor.
Sem mapa e sem caminho, SEI QUE CHEGAREI


Joana disse...

Gostei muito anónima do dia 15 Novembro, 2012 12:24.

Também é uma reflexão muito bonita :)

Confessionário disse...

Joana, eu tb...

Anónimo disse...

Olá Joana!
Sou a anónima de 15/11 12:24H
Agradeço a sua observação.
Permita-me um pequeno esclarecimento.
A mensgaem que deixei é mais que uma reflexão, é uma condição/constatação real da minha vida.
E dói, dói muito chegar a esta conclusão.
A dor de cabeça é real, e posso afirmar que a dor da alma também.
É real, é real o vento, tal como a lareira apagada. É real a falta de lenha para acender a lareira, é real a falta de forças fisicas para chegar.
Mas quero muito chegar.

Confessionário, obrigada também.

É importante para mim sentir que ainda que virtualmente alguém em alguma parte "sentiu" o meu "existir".

Joana disse...

Anónima de 15 Novembro, 2012 14:56;

Acredite, que não está só nesse seu sentir...

Nós seres humanos, apesar de estranhos e desconhecidos uns para os outros neste blog virtual e na vida real, da distância física e pessoal que nos separa, somos todos muitos semelhantes no sentir.

Não se encontra pessoa alguma, que nunca tenha sentido alegria, ou tristeza, neste, ou naquele instante da sua vida, isso faz parte de todos, da nossa natureza.

A unica diferença, é que uns teem a capacidade de gerir esses sentimentos, muito melhor do que outros, que nos descontrolamos mais facilmente.
Ou simplesmente são interiormente mais fortes, com maior amor próprio. Talvez... não sei... não a conheço a si, mas, conheço-me a mim...

E depois existe este cantinho do confessionário, onde nos cruzamos, mesmo que virtualmente, mas sabemos que pelo menos alguém nos ouve para além de nós próprios e que afinal não estamos assim tão sós, neste sentir e neste caminhar...

Mas posso dizer-lhe, que também eu procuro chegar e apesar de muitos dos meus erros e falhas (enormes tempestades mesmo), ainda mantenho uma réstia (muito pequenina) de esperança, que Ele esteja lá no final do caminho, a sorrir à minha espera com os braços abertos e a dizer: "porque duvidas-te tanto do meu Amor por ti? podias ter sido bem mais feliz nesse teu caminhar!"

Mas... por enquanto... ainda é só um sonho ideal que mantenho... pois desconheço o que me espera quando chegar ao fim do Caminho...

A mesma força que amigos e familiares enviam para mim, deixo aqui para si anónima.

Que os ventos acalmem e que encontre a lenha necessária, para a lareira aquecer o frio dos seus dias...

Ninguém melhor do que eu, sabe como isso é dificil, mas também eu tento fazer isso todos os dias.
Infelizmente não podemos deixar de caminhar e o vento que hoje sopra contra, amanhã estará a favor e nos levará a bom porto, envio-lhe estas palavras, porque também eu quero muito acreditar nelas...

Bjinhos :)

Ana Melo disse...

“E quando penso, como agora, em reatá-lo, já não lhe sei a direcção. As voltas à volta das coisas que tornei deus, deixaram-me zonzo, perdido.”“e eu descubra de uma vez por todas o Caminho que leva à terra prometida.”

Vai com certeza REdescobrir.

«Quando penso em mim! coisa que faço muito raramente! “rezo” para que noites escuras, noites de muitas dúvidas, não voltem – e não têm voltado pelo menos com dor.

Tantas vezes, desde novita, me fiz a perguntas como estas:
-que queres tu?
-tu não és obrigada a ir por aí, porque vais? quem te obriga?
-se os outros forem para um poço! tu também vais!? não és obrigada a ir!
-que opção foi essa ! “isto ou aquilo” o que é que isso quer dizer?
-“isto ou aquilo” do que vale? no fim o que fica? mentiras? estórias para contar! ou estórias para contarem de ti?
(bom!!! não esqueçam! sou uma risonha, sempre fui, mas também assumi muito cedo, o meu lado anti-social)

NÃO TIVE A SORTE!,(ou tive a sorte!?) da proximidade “dos aquários” creio que lá, alguém mais atento me faria “cair as escamas dos olhos” e me mostraria, com PALAVRAS SÁBIAS, que muitos, já tiveram, têm, as mesmas ou parecidas duvidas.

(Não sendo todos nós, padres ou freiras -pois com um pequeno retiro- o essencial volta, e com ele volta, com certeza a alegria do caminho.)

Estas dúvidas! não são respondidas no quotidiano!! é um caminho de muita inquietação!! muito dizer não, ”quase” sem porquê!! – etiquetar-nos a nós próprios de: " a esquisita!”, “a não gosta de nada!”, “a bruta!”

Trazem-nos luz, os dois últimos posts e os comentários que os mesmos deram origem. Não trazem soluções! já era pedir demais! mas consigo adivinhar, que as que possam surgir (soluções) serão sempre muito romanceadas! pois somos tantos e diferentes -filhos de tantas mães – mães estas, que tratando-se dos próprios filhos!! são sempre os melhores do mundo! as companhias é que podem não ser muito boas!!!!

Ainda me atrevo a concluir, que “formados” mais perto ou mais longe dos aquários, mais cedo ou mais tarde, a vida vivida em comunidade, vai-nos trazer a “todos” (há sempre gente, que só tem certezas) dúvidas sobre o caminho. Não raras vezes, o troco que recebemos das nossas opções são só ilusões e ansiedades. A questão está se estamos munidos de ferramentas para o tal discernimento, e estando! o caminho de volta faz-se, não sem dor! mas muito mais consciente.

Sem sentimentos da posse atrelados. Que não deixe-mos por NADA de viver os “amores” ADULTOS E RESPONSAVEIS, que connosco se cruzem na caminhada. (acho que destes! não existem muitos! tem de se esperar muito! mas deve haver!)»
” O Caminho faz-se caminhando”

Ana Melo disse...

“E quando penso, como agora, em reatá-lo, já não lhe sei a direcção. As voltas à volta das coisas que tornei deus, deixaram-me zonzo, perdido.”“e eu descubra de uma vez por todas o Caminho que leva à terra prometida.”

Vai com certeza REdescobrir.

«Quando penso em mim! coisa que faço muito raramente! “rezo” para que noites escuras, noites de muitas dúvidas, não voltem – e não têm voltado pelo menos com dor.

Tantas vezes, desde novita, me fiz a perguntas como estas:
-que queres tu?
-tu não és obrigada a ir por aí, porque vais? quem te obriga?
-se os outros forem para um poço! tu também vais!? não és obrigada a ir!
-que opção foi essa ! “isto ou aquilo” o que é que isso quer dizer?
-“isto ou aquilo” do que vale? no fim o que fica? mentiras? estórias para contar! ou estórias para contarem de ti?
(bom!!! não esqueçam! sou uma risonha, sempre fui, mas também assumi muito cedo, o meu lado anti-social)

NÃO TIVE A SORTE!,(ou tive a sorte!?) da proximidade “dos aquários” creio que lá, alguém mais atento me faria “cair as escamas dos olhos” e me mostraria, com PALAVRAS SÁBIAS, que muitos, já tiveram, têm, as mesmas ou parecidas duvidas.

(Não sendo todos nós, padres ou freiras -pois com um pequeno retiro- o essencial volta, e com ele volta, com certeza a alegria do caminho.)

Estas dúvidas! não são respondidas no quotidiano!! é um caminho de muita inquietação!! muito dizer não, ”quase” sem porquê!! – etiquetar-nos a nós próprios de: " a esquisita!”, “a não gosta de nada!”, “a bruta!”

Trazem-nos luz, os dois últimos posts e os comentários que os mesmos deram origem. Não trazem soluções! já era pedir demais! mas consigo adivinhar, que as que possam surgir (soluções) serão sempre muito romanceadas! pois somos tantos e diferentes -filhos de tantas mães – mães estas, que tratando-se dos próprios filhos!! são sempre os melhores do mundo! as companhias é que podem não ser muito boas!!!!

Ainda me atrevo a concluir, que “formados” mais perto ou mais longe dos aquários, mais cedo ou mais tarde, a vida vivida em comunidade, vai-nos trazer a “todos” (há sempre gente, que só tem certezas) dúvidas sobre o caminho. Não raras vezes, o troco que recebemos das nossas opções são só ilusões e ansiedades. A questão está se estamos munidos de ferramentas para o tal discernimento, e estando! o caminho de volta faz-se, não sem dor! mas muito mais consciente.

Sem sentimentos da posse atrelados. Que não deixe-mos por NADA de viver os “amores” ADULTOS E RESPONSAVEIS, que connosco se cruzem na caminhada. (acho que destes! não existem muitos! tem de se esperar muito! mas deve haver!)»
” O Caminho faz-se caminhando”

Unknown disse...

Ola Padre, compreendo e tambem sinto que os muitos afazeres, em que por vezes falha o Amor, porque nao e aquilo que desejamos, nao e aquilo que queremos, nos desilude e nos deixa uma amargura, por vezes, indecifravel. Nessas alturas, gosto de parar um pouco e meditar e tentar encontrar um Caminho que seja meu, que corresponda ao meu ideal e em que Ele tambem esteja presente. Por vezes e mesmo dificil
encontrar o trilho certo...
E, quantas vezes julgamos escolher o Caminho certo e, afinal, nao o conseguimos percorrer.
Mas e preciso continuar com persistencia e fe para O podermos encontrar no final do nosso tempo. Um abraco
Ruth

Anónimo disse...


Que bom ter consciencializado essa realidade, é o ponto de partida. Este ano quando voltar ao retiro poderá acrescentar algo mais. Estou certa que foi caminhando. Não se canse padre, não se decepcione, situações de decepção são como os pobres, sempre existirão neste mundo… por isso, coração ao Alto! "Porque, onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração".