domingo, dezembro 31, 2006

Devo o meu filho à minha mãe

A discussão foi acesa. Não nos zangámos. Mas fiquei triste. Sobretudo porque no meio das palavras amigas e sinceras de parte a parte denotei pouca informação e apenas a informação da televisão, aquela que há mais de dois anos tem aparecido numa campanha desenfreada pela liberalização do aborto. Não quero falar do meu respeito ou compreensão pelas opiniões diferentes da minha nem pelas mães que optam por uma atitude destas. No entanto o meu rosto enrugado provocou nos amigos, sobretudo num deles, algum desconforto. Digo-o pela mensagem que me enviou no dia seguinte. Mas a história, se quisermos dar-lhe esse atributo, veio depois da discussão e da mensagem. O amigo porventura dialogou com a mãe sobre o meu rosto. E a mãe ligou-me depois. Padre, hoje contei ao meu filho o que ainda não achara oportuno ele saber. Se hoje tenho um filho lindo e perfeito devo-o à minha mãe, que, na sua gravidez do meu ser, estivera prestes a abortar. Sabia que eu não tinha as condições melhores para a minha existência. Não as explicou e eu entrevi pelo que conheço dela. Pareceu-me que as palavras estavam molhadas, mas não vi porque o telefone não mostra. A sua mãe não se arrependera de lutar, e quase todos os dias ela dá graças a Deus e à mãe pela sua opção. Por isso, dizia-me, o meu filho é resultado do meu não aborto.
A mim calou-me. A ele não sei.

terça-feira, dezembro 26, 2006

Um ano depois e um Obrigado

O “Confessionário dum padre” nasceu num entusiasmo de alguém que gostava e gosta de escrever. Nasceu em 2004, apenas como espaço onde deixar os meus sentimentos e pensamentos. Nasceu para ser a expressão escrita daquela parte de mim que se entrevia pelas minhas atitudes e pela minha forma de viver, como pessoa e sobretudo como pessoa que é padre. Na altura, havia poucos espaços de cariz religioso, e este nem pretendia propriamente sê-lo. Queria apenas ser o “meu espaço”. Com o tempo, o espaço deixou de ser o “meu espaço” para ser o espaço de muitos outros. E como “onde estiverem dois ou três aí estarei Eu no meio deles”, tornou-se um dos “Seus espaços”. Em 2005 o “Confessionário” perdeu a vida que tinha por causa de alguns desaires e dificuldades, coisas que acontecem com facilidade na virtualidade da blogosfera. Os outros, os amigos e penitentes, insistiram para que nascesse de novo. E no dia 25 de Dezembro de 2005 - fez ontem um ano - juntamente com o Menino Deus, o “Confessionário dum padre” renasceu. Olho para trás. E por um lado, quantificando 75 posts e mais de 50.000 visitas (dei conta há pouco!), e por outro, qualificando novos amigos, e muita, mas muita reflexão, meditação e oração que surgiram dos comentários e das chamadas de atenção, sinto-me obrigado a agradecer a todos os que têm visitado este espaço, e sobretudo a Deus… pela oportunidade, pelo dom, pelas graças recebidas, pela força e pela vida que me tem concedido. Vale a pena ser padre assim. Obrigado.

domingo, dezembro 24, 2006

A Bola do Menino

A Malu, da Capela, lançou no ar esta bolinha azul,a bolinha do Natal, uma bola especial.
Será a do menino Deus?!
A Xana, do Portinho de Abrigo,
continuou e passou para o Joaquim,
e este passou-a ao Pensar Cristo
que pensou e a passou à Gota de Chuva
que numa grande jogada a enviou à Joana
Esta à Maria João
Esta à Sandra Dantas
E esta à Elsa, do Eu Estou Aki
Veio depois o mensageiro Ângelo
E o Pe Tó Carlos que enviou antes o Menino
ao S.P e este à Sonhadora.
Esta malandra, por vingança, entregou-ma
como amigo de Verdade. Valeu pelas palavras.Chegou então a minha vez...
É o meu presente com o presente que embrulho com todos estes amigos.
Aproveito para desejar a todos um NATAL VERDADEIRO.

Que linda bolinha
Tenho no meu regaço
Será tua, será minha?
Ou do nosso abraço?

Disseram que trazia
Atrás de si o Natal
Mas não veio vazia
Trouxe algo afinal.

Trouxe um presente
Ui, tão pequenino.
Mas parece gente!
Um lindo menino.

Bato: truz, truz, truz
Abre-se a bolinha
E ouve-se Jesus.
Que diz? Adivinha

Ele precisa de nós
Da minha, da tua
Da nossa voz


Refrão:Este blog tem uma bolinha azul,ó tem, tem, tem......

Por isso Migalhas, grande amigo, aqui vai a bolinha azul,a bolinha do Natal, o Menino Jesus,que quer a tua voz.

quinta-feira, dezembro 21, 2006

Hoje sinto uma vontade enorme de amar

Reconheço que a educação que tive no Seminário era um tanto ou quanto redutora no que se refere ao amor. Mesmo que os meus superiores não o exprimissem de uma forma clara, demonstravam-no. Aproveitavam-se encontros, reuniões abertas, conversas de café, aulas, para falar no assunto. Nós, padres, temos de amar a todos. É esta a nossa forma de amar. A que Deus quer. Tratava-se, numa linguagem teológica, de um amor divergente. Parte de um ponto, nós, e alarga-se para os outros, todos os que nos forem confiados.
Sempre desconfiei desta teoria. E com alguma irreverência ia expondo a minha. Que também não é nova. Não é original. Mas é minha. Foi sempre minha desde o momento em que a pensei, e achei que era minha. Nós temos de amar de uma forma directa. Numa linguagem teológica, de uma forma convergente. Parte-se de um ponto, nós, e converge-se para outro ponto, o outro. Aliás, penso que esta é a única forma possível de amar. Ama-se em concreto e não no abstracto, Eu amo-te. A ti. E a ti. E a ti também. E não eu amo-vos. O “eu amo-vos” torna tudo pouco explícito, pouco claro. Eu diria mais. Um pouco hipócrita.
Sinto que nós, padres, devemos amar cada pessoa. Muitas. Mas cada uma. Só assim experimentaremos o que é amar. O resto – aquilo do divergente – é apenas dar-se. O que também é bom. Mas não chega.
Eu tento amar assim. Amo a Maria, o Manuel, o Tó, a Ana, o Zé e outros mais complicados, como a Di, a Gui, o Mi, o Pi, a Jacinta, a Marilim, o Tonito, o Tozito, a Aniki, a… São tantos, mas também são cada um. Se não fosse assim, acho que não conseguia continuar fiel ao meu sacerdócio.
É a minha teoria. É o meu dogma.

quinta-feira, dezembro 14, 2006

sondagem_ " Destas questões ético-morais, quais as que te preocupam mais?”

Passados que vão mais de 40 dias da última sondagem e 665 votos, chegou a hora de avaliar a sondagem que estava no lado direito, no sidebar. A questão era:

Destas questões ético-morais, quais as que te preocupam mais?

E os resultados são:
1.
Eutanásia _23%
2. Aborto _17%
3. Droga _17%
4. Terrorismo _13%
5. Tortura e escravidão _10%
6. Clonagem _7%
7. Pena de Morte _6%
8. Contrabando de órgãos _3%
9. Suicídio _3%
10. nenhuma _1%
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algumas considerações:
1. Já não me foi fácil lançar esta sondagem. Porém, agora é-me muito mais difícil comentá-la. Estou como aqueles que disseram que todas estas questões ético-morais os preocupam e é difícil perceber qual a que os preocupa em especial. De facto a cultura de morte que existe já em muitos países e que começa a existir em Portugal preocupa-me imenso. Qualquer dia vai tornar-se normal apontar uma arma a alguém com o qual não se concordo e, só por este motivo, apertar o gatilho. Aliás, os noticiários já nos dão conta de casos assim.
2. Parece-me interessante a análise da Maria que, relativamente às nove questões ético-morais enumeradas, afirmava que “cinco conduzem directa e objectivamente à morte (aborto, eutanásia, pena de morte, suicídio, terrorismo) e que estas seriam a mesma coisa com nomes diferentes”. É interessante, mas discordo em parte. A mim parece-me que o fim é o mesmo e que os valores ou ideologias por detrás destas opções serão as mesmas, mas que têm implicações ou circunstâncias diferentes. Por exemplo, e vejamos em crescendo: no aborto, a pessoa a “aniquilar” não tem hipótese de se defender; na Eutanásia, a pessoa a “aniquilar” está fragilizada e pode até optar; no suicídio, a opção é claramente do próprio “aniquilado”, embora motivada a maior parte das vezes por condições adversas. Eu penso que se chega à pena de morte depois de ter como natural estas anteriores, como resultado da forma de entender a vida e o mundo, quem é que está a mais ou a menos. O terrorismo é uma forma dissimulada de Pena de Morte. Mata-se o outro porque se decide em favor de “bens” maiores.
3. Relativamente às restantes quatro opções (droga, tortura e escravidão, clonagem, contrabando de órgãos), a Maria afirmou que “conduzem a uma morte espiritual, moral, cultural”. Gostei desta definição e aproprio-me dela. No entanto, não posso deixar de recordar que, para se contrabandear órgãos, uma pessoa deixa de os ter ou de ser. Em qualquer dos quatro casos, as pessoas deixam de ter ou de ser. E isto também é objectivo.
4. A opção vencedora nesta sondagem (que nenhuma delas é vencedora!) foi a EUTANÁSIA. Há dias li no “Ver para Crer” que um enfermeiro numa clínica injectou letalmente 28 pacientes com uma mistura de valium e anestésicos para "os aliviar" do sofrimento, alegando que tinha compaixão deles. Para este homem tornou-se normal tirar o sofrimento com tirar a vida. È o resultado desta cultura de morte e desta forma de viver sem sacrifícios. Não será necessário recordar aos mais atentos aquilo que valeu o sofrimento da minha mãe nos últimos dias: o sofrimento pode valer muito! Só não entendi o porquê desta opção ser a vencedora. Alguém me explicará? Porventura os que votaram nela, podem explicar?!
5. A segunda opção, o ABORTO, desculpem a sinceridade, é a que mais me preocupa porque se trata de um ser que, de forma alguma, poderá manifestar o seu parecer. Eu votei nela. O assunto especula-se muito hoje por causa do referendo do dia 11 de Fevereiro. Por isso não vou ser extenso. Eu também não quero que as mães sofram! Apenas pergunto: porquê? A próxima sondagem vai nessa pergunta.
6. Também não entendi como a DROGA aparece em 3º lugar. Talvez por ser um flagelo diário e ao nosso lado, visível e que mata aos poucos. Será?!
7. Para mim todo o TERRORISMO é apenas um questão de poder. Suponho que esta opção aparece em 4º lugar porque os americanos ainda ocupam grande espaço das nossas televisões e das nossas referências. Será?! Lembrem o dia 11 de Setembro de há 5 anos. Ou teremos nós, aqui em Portugal, tanto medo de atentados bombistas? Ou, ao escolherem esta opção, estavam a pensar em terrorismo dissimulado nos nossos trabalhos, entre as nossas amizades, nos nossos políticos, no nosso futebol?!...
8. Não sei ao certo quais são as ESCRAVATURAS e as TORTURAS dos nossos tempos! As que me lembram primeiro são as relacionadas com o sexo. As jovens ou crianças comercializadas. Ou então as que em cima conotei como terrorismo dissimulado. Não sei não. Help.
9. Relativamente à CLONAGEM, repito a afirmação de Gaia: “porque o ser humano deve nascer e morrer (independentemente do tempo e da forma) e não deve ser repetido... tira-lhe a essência.” Além disso, o objectivo de ajudar a ciência e a medicina, argumento mais utilizado, não me convence totalmente. Quer-me parecer que atrás desta evolução hão-de vir novas “doenças”. Não acham? Mas bem que dava jeito um clone ou dois para eu poder descansar umas temporadas. Hehe…
10. Ainda não entendi muito bem nem a PENA DE MORTE, nem o TERRORISMO. Parecem-me apenas uma questão de poder. Será?! Por pior que uma pessoa seja, não me parece que se justifique julgá-la, comos se mandássemos na Vida Humana. Como se nos coubesse a nós decidir o que fazer com a vida de uma pessoa. O princípio é sempre o mesmo. Decidir o que fazer com a vida de outro é não saber de facto o que significa a Vida. Nem sei como lida a consciência de uma pessoa com essa forma de lidar com a vida! Como será a mente de um terrorista ou de alguém que executa uma pena de morte?!
11. Continuo a achar que todas estas questões ético-morais têm subjacentes interesses, sobretudo económicos. Para servir interesses de alguém, e sobretudo dos mais poderosos. O CONTRABANDO DE ÓRGÃOS, por exemplo, é limitar um ser frágil e saudável para contribuir com a saúde de um ser rico.
12. O nosso mundo parece caminhar para o SUICÍDIO. O que irá acontecer? Onde acabaremos? Onde iremos parar? Será possível ainda recuperar a confiança nos outros e em nós próprios? Eu por mim, prefiro confiar em Deus.
13. Uma boa conclusão chega no final. Ao menos as pessoas que me visitam preocupam-se com a Vida. Apenas 1% não se preocupa com nenhuma destas questões. Valha-me ao menos isso.

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Hoje surge nova sondagem. Porque continuo preocupado com a Cultura de Morte, porque me preocupa o início desta cultura em Portugal, porque me preocupa não saber quais os valores que regem as decisões das pessoas, esta sondagem pretende fazer reflectir sobre o valor da vida humana que tem início na fecundação. A pergunta é:

Para ti quais os principais e reais motivos que levam uma mulher a desejar um aborto?

segunda-feira, dezembro 11, 2006

Uma história dos fundos

Adoro ver as criancinhas como acólitos. Adoro ser rodeado por elas. Mesmo no meio de algumas confusões, no meio da eucaristia, em que tenho de repetir como se faz. Não que não estejam organizados. Não que não tenham alguma formação. Mas há paróquias em que o dito fica por dizer ou ensinar, por mais que seja dito ou ensinado. Mesmo assim, gosto de os ter à volta do altar.
Estava eu há dias no meio de uma eucaristia quando fugi, inconscientemente, para este pensamento. Como era bom ser rodeado por estes meus acólitos! Aturo-os, apesar das tropelias e tropeços. Faz-se por amor. De repente, sem ruído, do fundo, e no meio da consagração, o cheiro chegou-me, e cresceu de forma progressiva. Tentei não respirar e pensar que a suposta criança, que nem consegui adivinhar qual delas seria, estava precisada. Mas a situação era constrangedora. Consagrar sem respirar é difícil, descobri. Sorrir era delatar o infractor. Que fazer, então, com acólitos assim?! Ó Cristo, é que nem tu me ajudaste nesta!

sábado, dezembro 09, 2006

É que me lembrei da esperança

Há muito que não vejo a senhora dos cães. Mais de trinta em sua casa. Sempre perfumada. Arranjada. Pintada. Apesar de tudo, queria parecer uma senhora. Todos os dias frequentava o chá do café com amigas mais ou menos influentes. O marido era professor. Estivera na guerra das antigas colónias portuguesas. Contavam que uma bala o atingira em zona que agora o deixava desprotegido em questões fisiológicas, as mais simples, como reter águas. Nem devia contar estas coisas. Diziam que os alunos se afastavam dele, a não ser quando pretendiam nota mais alta. A vida sorrira muitos anos antes para esta gente. A casa herdada era enorme. Contavam que havia muito dinheiro, ou não fosse o tratamento veterinário no Porto para todos os cães que pernoitavam em casa. Ou para os alimentar.
E hoje, ao rezar este advento, lembrei-me deste casal, e da casa que lhes ardeu, com os animais, com as mobílias, com a mãe da senhora. Foi o caos por lá. Por cá. Não se falou noutra coisa durante tempos. A minha oração partiu deles. É que me lembrei da esperança, e da forma como esta mulher a perdeu. O marido nem sei. Contaram que moravam longe. As amigas tinham-na abandonado. Os amigos influentes, os colegas, a casa, os bens, o dinheiro. Tudo ficara para trás nas suas vidas. Não sei deles. A última notícia que tive não dizia mais do que: andavam meios perdidos. A minha oração de hoje pergunta onde habitualmente depositamos a nossa esperança? No dinheiro, nos nossos bens, nas nossas capacidades, nos nossos amigos, mais ou menos influentes. Tudo coisas que podem deixar de ser. Efémeras. Finitas. Por isso o nosso mundo perdeu a esperança, escondida por detrás de nuvens que criamos e que escondem o sol. Porquê?! Porque não havemos de descobrir a esperança no presépio, com a Vida Daquele que mudou a vida e a morte, Aquele que faz sentir que a vida tem sentido, mesmo quando tudo parece perdido, porque o que nunca perdemos é o Seu Amor e a certeza de quem um dia, quando tudo acabar, começará de novo?

quarta-feira, dezembro 06, 2006

O padre é o “tem de”

Vem um e tem de fazer o baptizado neste dia. Outro, tem de aceitar o meu filho para o crisma. E tem de perdoar as faltas à catequese. E tem de fazer igual ao seu colega. Vem um emigrante e tem de fazer nesta data. Não importa se quer ir para férias. E tem de passar ali com a procissão. E tem de aceitar este padrinho. Tem de ser compreensivo para a noiva se esta chegar atrasada. Tem de fazer um casamento à maneira.
Tem de passar pelo lar. Tem de marcar confissões assim, porque esqueço-me de vir antes da missa. Tem de estar atento aos jovens. Eles estão a afastar-se. Tem de ir buscar o morto a casa. E tem de estar a pé às 8.00 porque tem de estar disponível para um que se lembrou de tratar um assunto a essa hora. Ou então tem de estar sempre em casa para o caso de alguém se lembrar de lá ir. Tem de ter cuidado com quem anda. Tem de ter cuidado com as mulheres. Tem de ouvir os desaforos de quem não gostou de alguma coisa. Tem de ser agradável a celebrar a eucaristia. Não interessa se está cansado ou doente ou triste. Tem de ser simpático. Tem de ser aberto, acolhedor. Tem de estar sempre bem-disposto. Tem de preparar a homilia. E tem de reflectir mais. Havia de ler mais. Tem de organizar o programa da paróquia. Se não tiver uma gata, tem de viver sozinho. Tem de viver com o que lhe dão. E tem de declarar o IRS para ser igual aos outros. Tem de tratar dos bens da paróquia. Já estarão registados? Tem de ir às finanças. Tem de entregar a acta de casamento. E tem de enviar os extractos e informar o pároco do baptismo. Tem de registar o óbito. E o baptismo. Tem de nomear novo Conselho Económico. Tem de encontrar as pessoas ideais. Tem de fazer esta e aquela reunião. Tem de estar sempre solícito na reunião. Não pode irritar-se. Tem de ir às compras lá para casa. Tem de tratar do carro. Pneus novos de tanto andar.
Vem um amigo e tens de estar mais connosco. Vem um pretenso amigo e diz que tens de ser compreensivo. Vem um que diz o que quer e tens de ouvir e calar. Tens de aceitar. Tens de compreender tudo. Vem um que diz mentiras a teu respeito e tens de continuar a sorrir. Vem o meu pai e diz que tens de rezar mais. Vem a minha família e diz que tenho de os visitar. Vem o bispo e diz que tens de aceitar mais esta paróquia. E tens de compreender e fazer compreender os teus paroquianos. Não pode haver missas em todas. E tens de estar uma tarde com eles. E tens de levar gente ao simpósio. E tens de convencer os ministros-extraordinários. Tens de apostar na formação. Tens de arranjar mais catequistas. Tens de conversar com uma por causa de uma mãe. E conversar com uma mãe por causa de um catequista. Tens de ir mais vezes ao café para estar com as pessoas. Tens de ir ao retiro do clero. Há uns cursitos a propósito em Madrid. Tinhas de ir! E tens de fazer isto e aquilo. E ainda tens uma tese para fazer.
Tanto “tem de” que vem de fora, do exterior. Do que os outros querem. Exigem. Se ao menos ainda viessem do interior. Daquilo que eu quero. Daquilo que eu me exijo.
Vem ainda Deus e diz: tens de ser bom e tens de amar.
E eu só já tenho palavras para dizer Tenho de descansar para ser bom e amar!