terça-feira, junho 30, 2015

um assunto a que não quero dar título

Há padres que se suicidam, e a notícia propaga-se, morbidamente, pelos corredores escuros dos claustros da vida. Nisto a comunicação social não se tem metido, não sei se por respeito aos falecidos ou seus familiares, se por ser uma realidade desconhecida, se porque na verdade o número é exíguo em comparação com aqueles que morrem de morte dita natural.
Mas a gente vai sabendo e, mais do que angustiar-se com a angústia, faz-se pergunta em nós da pergunta mais difícil que há. É a pergunta dos porquês? Fica-se assim a perguntar Porquê, ou porque é que a Fé não faz evitar estas coisas. Sim porque um padre deveria ser um exímio ser de Fé, e ela, que se saiba, responde como ninguém às questões da vida e da morte. Porém, o que nós esquecemos é que antes da fé a pessoa tem de ter resolvida igualmente a sua humanidade. Ninguém conseguirá um dia distanciar a sua fé da sua humanidade, ou usar apenas a fé. Nem os santos.
Outra pergunta que se faz, ou que é apenas minha e agora, é Porque é que ninguém se apercebeu ou fez alguma coisa, ou esteve ali presente para segurar o braço de quem se queria lançar no abismo. E também a resposta me veio sofrida, mas escorreita. Ninguém consegue viver nem sentir autenticamente Deus se não souber amar e viver essa maravilha do amor. Isso pode acontecer e expressar-se de muitas formas, mas tem de existir. Disso tenho a firme certeza. Pois é ou são esses amores que sustentam a nossa vontade de viver! Pois é ou são esses amores que estão ao nosso lado e nos podem segurar quando já não temos mão para agarrar ou não temos mão em nós.

sábado, junho 27, 2015

esvaziasses [poema 62]

Carcaça trajada, polida, carcaça enfim
Balão cheio, colorido, balão de ar a mim
Pipa de vinho, velha, envelhecida, sem vinho
Passo andante, corpo vestido, errante caminho

Vazío sem par nem par e em dor
E se adentrasses que fosse Senhor?

quarta-feira, junho 24, 2015

dedicatória [poema 61]

Amo em ti

Campo lavrado da casa em ruínas
Paredes brancas de pedra nua
Escadas ausentes, porta batida
sem chaves, mas amo em ti

tudo

quinta-feira, junho 18, 2015

Incêndio atinge igreja do milagre da multiplicação dos pães

Incêndio atinge igreja do milagre da multiplicação dos pães. Li a notícia a meio da manhã nas redes sociais. Vinha na página de um conhecido jornal nacional. Como já lá estive há uns anos, numa experiência de fé emocionante, fiquei triste com a notícia. O espaço nunca perderá o significado que tem para quem imagina que possa ter sido ali o milagre da multiplicação dos pães. Recordo que imaginar Jesus por aquelas paragens estremeceu em mim o que de melhor tem o meu coração. Mas o que mais me chamou a atenção na notícia foram os abundantes comentários jocosos. Copio alguns como lá estão ainda. “alguem nao prestou atencao ao forno...”; “Agora é a multiplicação do pão torrado....ou das tostas”;”Hoje há torradinhas para todos.”; “se calhar estavam a aquecer o forno para fazer os pães em duplicado.”; “Agora podem multiplicar os tijolos”; “Lá se foi a padaria do bairro,...”; “Esqueceram-se do forno aceso , agora nem pão multiplicado vão ter.”; “ao menos o pão cozido deve ter ficado”; “"Esturraram-se" as carcaças! Hahahaa”…
O ahahaha ainda soa na minha cabeça. Não é que me sinta indignado com a falta de respeito. Já estou habituado. As redes sociais dão possibilidade a todos os seus frequentadores de dizer o que bem lhes apetece sem medir a reação própria e natural do frente a frente. Além disso, faltar ao respeito não dá direito ao desrespeitado de faltar ao respeito a quem faltou ao respeito. Sim, porque a seguir logo diriam que não me podes faltar ao respeito por eu dizer o que me apetece.
Sinto-me, isso sim, espantado pelo facto de algo como uma casa que ardeu possa dar azo a piadas. Já estou a imaginar como seria comunicar a algumas dessas pessoas que gostam de rir com o mal alheio. Olhe a sua casa ardeu, ahahahah, esturricaram-se as mobílias, ahahaha, a comida que tinha na despensa já está cozinhada, ahahaha, cheira-me a esturro, ahahahah. Talvez, ou talvez não, nessa ocasião se apercebessem que o mal alheio só é alheio enquanto não nos toca a nós. Apetecia-me dizer mais umas coisas, mas não quero faltar ao respeito.

terça-feira, junho 16, 2015

Tencionas ler a nova Encíclica do papa Francisco?

Depois da última sondagem lançada pouco depois da Páscoa, e que nos perguntava se a Igreja ainda estaria muito centrada no clero (vide resultados abaixo), vamos hoje lançar nova sondagem.
“Laudato si, sobre o cuidado da casa comum” é o título da nova Encíclica do Papa Francisco sobre o tema do ambiente que vai ser lançada no próximo dia 18 deste mês de Junho, no Vaticano. A encíclica vai estar disponível inicialmente em italiano, francês, inglês, alemão, espanhol e português. A expressão 'Laudato si' (louvado seja) remete para o 'Cântico das Criaturas', de São Francisco de Assis, que inspirou o Papa argentino na escolha do seu nome, após a eleição pontifícia.
A questão que agora colocamos é muito simples e directa: Tencionas ler a nova Encíclica do papa Francisco?
Já sabem que podem expor as suas razões nos coments, e inclusive falar das expectactivas que têm.

sexta-feira, junho 12, 2015

O charlatão do restaurante

O meu cunhado é sócio de um restaurante onde vou de vez em quando visitá-lo e comer. Por lá sabem e comenta-se que ele tem um cunhado padre. Há dois dias fiz uma dessas visitas, e pedi, com fome, uma sopa e um segundo prato. Ainda não acabara a sopa quando um dos empregados me perguntou se o senhor ao balcão se podia sentar na minha mesa para conversar. Respondi que sim e fiz espaço.
O dito senhor apresentou-se como um charlatão de há três meses a esta parte. Advertiu que não acreditava em Deus, mas precisava falar. Enquanto espetava umas garfadas na comida, escutei os últimos três anos da sua vida, que vai nos setenta. A esposa tinha falecido com cancro há três anos e a filha há um com uma doença fulminante. Há três meses tinha-lhe sido diagnosticado um cancro inoperável, pois já não havia nada a fazer de tantas metástases. Não tinha medo da morte, mas precisava falar e eu, porventura, era um bom alvo de conversa. Ouvi sem o interromper muito, até nos fazerem sinal de que tinham de levantar a mesa. No final falei-lhe rapidamente de alguns casos idênticos que acompanhara e aos quais a fé ou a certeza de Deus dera a força que precisavam. Que Deus não nos resolvia os problemas, pois eles fazem parte da nossa vida aqui na terra, mas que dava a força necessária para os viver e para que o sofrimento pudesse ser algo revelador. Não quis concordar muito, mas à despedida, num aperto de mão agradecido, foi dizendo que ia pensar no que lhe disse e quem sabe se não se convertia.
Ao que lhe respondi que por algum motivo escolhera sentar-se ao lado de um padre para que o escutasse, e que eu aceitara exactamente pelo mesmo motivo.

quarta-feira, junho 03, 2015

explicação do mundo [poema 60]

Vai verde na foice e na manhã do tempo
Volta, a voltar cada página do livro branco
Sem explicação que seja o tempo e voe

O mar vai e vem nas ondas negras
O azul do céu pousa e dá-lhes nova cor
Sem explicação que seja o vento e sopre

Em quatro patas se constrói o dia
De amarelos e de flores e outras cores
Sem explicação que não seja o Criador

Sem explicação