sexta-feira, dezembro 14, 2018

O Cristo escondido

Possui em sua casa duas mesas cheias de santinhos, como gosta de referir. Depois faz a visita guiada ao santuário. Uso a palavra possui, porque é mesmo esse o sentido verbal da coisa. Ela tem posse daqueles santos todos. Reza a todos. Olhe este Santo António tão lindo. E é mesmo. Distingue-se das outras miudezas que por ali abundam. Digo miudezas no sentido em que são pequenos e, no meio de tantos, acabam por se tornar ainda mais pequenos. Porém, eu não desgosto disto. Nem da atitude da senhora Alcinda, nem da sua piedade. Muito menos da forma autêntica como acho que reza. Aliás, eu próprio tenho duas mesas cheias de cruzes. Como uma coleção ou quase coleção. Gosto de juntar as cruzes das minhas peregrinações, dos amigos que mas oferecem, daquelas cruzes que me prendem o olhar e tenho de as fazer minhas. 
Contudo, na visita guiada da senhora Alcinda, não consegui encontrar Cristo algum. É certo que também não sou pródigo na visão. É certo que era quase como descobrir uma pessoa no meio de muitas pessoas. Mas nem ajeitando os óculos mais aos olhos. A custo lá encontrei um Cristo muito pequenino. Por sinal também numa cruz muito pequenina, por detrás de um Santo que lhe não sei o nome, mas que lhe fazia muita sombra. Era como um anão vigiado por guarda-costas, aqueles homens acima do tamanho normal. Era, afinal, um Cristo escondido. Era aquele tipo de Cristo que se esconde nas nossas muitas piedades, nas nossas muitas jaculatórias aprendidas desde criança, nos rituais a que nos habituámos, nas missas a correr, nas tradições populares, nos muitos afazeres da vida e da religião. O Cristo que se vai escondendo no meio de tanta coisa que lhe faz sombra.

14 comentários:

Anónimo disse...

E no Natal ainda se esconde mais!

Anónimo disse...

Boa tarde Confessionário. Ao ler-te vieram-me logo á memória aquelas pessoas que são muito devotas da Senhora De Fátima, mas que têm verdadeira alergia á missa dominical.
Em certa altura em que num grupo de pessoas, eu expressava essa minha admiração, logo de lá me respondeu um dos presentes:
_ Eu com missas e padres não quero nada, a minha fé é com Nossa Senhora, que ela é que faz os milagres.
Só consegui pensar cá com os meus botões, e pedir interiormente, que Nossa Senhora faça o milagre de lhe iluminar aquela "fé" e já agora aquela cabeça!
Maria Ana

Anónimo disse...

Já estou farta das tretas das suas conversas. Na verdade devia fechar o confessionário, e ir vender sandálias ou pirolitos para a Feira da Ladra, que prestava um serviço muito mais útil à nação. Afinal, o que é que faz na vida? sempre com sentenças e juízos morais, a controlar a vida de toda a gente, com tiques de cão de guarda. isso também não cansa? Nem posso olhar para a sua cara, mesmo que ande de costas. É pior que as melgas, as carraças, as pulgas e todos os bichos do mato, juntos, que nunca deveriam ter sobrevivido à inundação do tempo de Noé. Os violadores não são só os que estão presos, são também os que metem o focinho, a penca, ou seja o que lá for em todo o lado e impedem os outros de respirar.
Depois vem com o paleio do amor, devia der proibido de pronunciar essa palavra,. ou qualquer outra que se lhe assemelhe. Não injurio ninguém, por isso não lhe vou chamar parvalhão a si, só à sua sombra, que é aquela que se projecta.
Não desejo mal a ninguém, mas há sua sombra devia dar uma travadinha de 24 horas, para que fosse possível haver o mínimo de paz e liberdade.
Porque não emigra? Queixinhas, pretensioso, palerma, parvalhão, idiota, a sua sombra, claro. Suma.

Anónimo disse...

7Muito interessante a narrativa. a prucura do Cristo...É como encontrar uma pessoa no meio de outras...BEm assim mesmo... O mais excessial sempre encontramos que seja até por muito custo.

Patty disse...

Tocou-me muito, esta sua reflexão.
Obrigada!

Confessionário disse...

14 dezembro, 2018 19:39

Fez-me sorrir, o que é muito positivo!

Não vou comentar o seu comentário.
Afinal, tem todo o direito a formular ideias da minha sombra, desde que não maltrate o seu autor!

Vim só dizer que tem aí, consigo, uma chave, que é só sua (não tenho acesso a ela), para fechar o confessionário. Se está cansada da minha sombra, use-a. Nunca deixe de respirar!

Anónimo disse...

Minha nossa que revolta? A? Sangue do cordeiro tem poder. Xou ...xou ...

Anónimo disse...

ai Santo DEUS.............

Anónimo disse...

que observação mais ridícula a dessa senhora que, em tom de brincadeira, manda uns bitaites deslocados! Olha, padre, a falas loucas ouvidos moucos!
Eu gostei imenso deste teu texto, e não vi nele nenhum moralismo ou juízo.

Anónimo disse...

Meu querido Conf.,

Não percas tempo a pensar na maldade daquele comentário.

Obrigado por mais um ano a nos fazer reflectir e mais importante ainda, a nos permitir questionar!

Um Feliz Natal!
Bjinho
SL

Ailime disse...

Boa tarde Sr. Padre,
Realmente um comentário muito a despropósito sobre a sua verdadeira essência.
Só quem não tem lido o que escreve e a forma tão pragmática como o faz e que aprecio imenso, não entende a sua escrita que louvo, porque fala de uma igreja que no fundo é a sonhada por todos nós.
De mofo acho que estamos todos cansados.
Ailime

Anónimo disse...

14 de Dezembro 19:38

Mas que bruta!

Anónimo disse...

Sim, muitas vezes sem darmos por isso buscamos as bênçãos e não o abençoador porque é mais confortável...quanto mais ter um relacionamento próximo com Ele, que já implica desconfortos tais como amar os inimigos...andar em pureza...gastar tempo a ler a Bíblia...orarmos....jejuar....

JS disse...

Há palavras e intervenções que têm o condão de entrar fundo no nosso coração.

Normalmente aprendemos que a nossa mente tem a capacidade de pensar e imaginar as coisas mais horríveis dos outros; e colocamos em nós uma série de filtros para que nem tudo o que pensamos seja traduzido em palavra comunicada. Todavia, várias (muitas?) vezes, o nosso pensamento exterioriza-se, revela-se, causando efeito no seu destinatário.

Algumas coisas que escutamos/lemos sobre nós interpelam-nos de forma até violenta. Porque é que alguém pensa mal de mim, do que faço, do que digo? Porque é que determinada pessoa parece sofrer perante a minha pessoa, a minha existência, a minha maneira de ser e de estar?

Questionamo-nos. Estarei a fazer mal, a proceder mal, a causar mal? As intenções que me movem serão tão puras como eu as imagino? Ou, apesar das boas intenções, os resultados se revelam contrários?
Será que não me faço compreender? Ou haverá quem seja incapaz de me compreender? Ou esse alguém até me compreenda melhor do que eu próprio? Andarei enganado, a enganar-me e a enganar outros?
Terei feito algo de errado àquela pessoa que a impede de me olhar com bons olhos? Terá acontecido algo de errado que a leve a pensar de forma tão negativa a meu respeito? Terá sido algo de involuntário, de que não faço ideia, de que não estou lembrado?
Terá ela razão no que diz? Haverá outros a pensar o mesmo, mesmo que o não digam? Que pensarão os outros, ouvindo/lendo o que ela pensa de mim?
Perante este tipo de reacção, valerá a pena continuar? Fará falta parar, rever, mudar? Estarei a perder o meu tempo? Estarei a criar anti-corpos, a gerar inimizade e sofrimento? Estarei a afastar os outros de Deus, a roubar-lhes a fé e a paz? Estarei eu longe de Deus, do que Deus pretende de mim?

As questões multiplicam-se, as respostas não são fáceis. Descobrimo-nos amados sem o merecermos, sem nada ter feito por isso ou mesmo apesar dos nossos erros e pecados; sabemos também haver quem não simpatize connosco, quem não vá com a nossa cara, quem não nos suporte, às vezes por culpa nossa. Estamos sempre sujeitos a ser mal interpretados e a ferir, mesmo inconscientemente, quem nos rodeia. Não mandamos no coração dos outros, não podemos obrigá-los a gostar de nós. Aprendemos a não levar demasiado a sério os elogios e as palmas, esquecemo-nos por vezes de aceitar com serenidade as críticas e os ataques.

Não somos perfeitos, não somos insubstituíveis; os nossos projectos têm o seu início, terão o seu fim. A pergunta decisiva: "Senhor, que queres que eu faça?"