Lembro-me bem do teu último beijo. Foi o último dos teus murmúrios de beijo. Tirei-te a máscara de oxigénio, encostei a minha cara nos teus lábios e tu moveste-os na direcção dela. Só isso. Mas tanto e sem medida. Mentiria se não dissesse que guardava cada beijo com receio que fosse o último. Fazia por guardar cada milésimo de segundo do movimento de cada beijo em ralentando. Era a minha forma de lidar com o adeus a qualquer hora. É difícil desmistificar as partidas, desconstruir a vida humana num segundo de morte que se arrasta. É difícil viver a pensar nisso. E não obstante, é a sequência natural da vida. E depois lembro esse beijo. Lembro-o bem. Lembro que fechei os olhos ao aproximar-me dos teus lábios. Foi o gesto natural de quem queria encerrar o beijo por dentro para o poder ir buscar sempre que precisasse. Como agora. Na altura fui o filho mais feliz do mundo. Desde que ficaras a oxigénio que apertavam as saudades dos teus murmúrios de beijo. Por isso fui o mais feliz dos filhos. A felicidade não cabia em mim. Foi o último beijo. Tinha quase a certeza que o seria. E hoje fui buscá-lo. E de olhos abertos, cai uma lágrima, sem que a consiga guardar dentro de mim… como guardei esse beijo.
1 comentário:
Tão bonito e tão sem palavras!
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