quarta-feira, dezembro 14, 2016

A Igreja que se tinha de afastar do mundo

Sentados ao redor da mesa de jantar estávamos um pequeno grupo de sacerdotes de diversos países e culturas. Todos nos entendíamos numa só língua. Mal ou bem, entendíamo-nos. E debatíamos ideias, teologias, pastorais, liturgias, tudo o que viesse ao acaso da conversa típica de padres. 
Nisto, um deles, que tem cerca de uns quatro anos de sacerdócio, aludiu ao de leve no tema Igreja-mundo, alegando que a Igreja tinha de se afastar do mundo. Creio que nem ele entendeu o que acabara de afirmar. Creio que o exprimiu porque o lera nalgum livro de piedade barata ou o ouviu a algum outro colega, pois que estes entendimentos andam de moda dentro de um clero que gosta de fechar as suas igrejas para não se contaminarem. Pois eu não gostei e discutimos até ao outro lado da lua, que é como quem diz até ao tutano. Nem eu nem ele desarmámos. Eu porque não concebo que a Igreja, sendo formada por gente que vive no mundo, tenha de fechar-se aparte ou encerrar-se em si mesma. Lá diz o Papa, e bem, que a Igreja não deve ser autorreferencial. E ele teimava que não me entendia. 
Uma coisa é construir uma Igreja mundana, e outra fazê-la mundo. Uma coisa é a construção da Igreja e outra a construção do Reino. Foi para este que Jesus veio ao mundo e é este que nos pede que construamos. É verdade que a Igreja tem uma identidade própria. Mas não me conformo com termos que em vez de aproximar, distanciam.

11 comentários:

Anónimo disse...

Bem vindo ao "clube dos atónitos" com as novas revelações das novas gerações!! A igreja ao invés de progredir está a regredir com atitudes como a desse colega e daquele outro, que eu também já referi, que ouvi dizer ter dito " A Igreja deve saber estar no mundo sem se envolver nele"! Acham-se muito espertos, mas a IGREJA somos todos NÓS!!
Agnostica

Ana Melo disse...

Faz como Deus faria. Segue em frente. O padre não é o INEM. Deus, criou-nos, programou-nos, com muita resistência (para mim resistência demais). Essa necessidade de aproximação muito imediata, nunca foi com Deus. Vemo-lo em muitos episódios a analisar a situação, a esperar pela melhor hora, a deixar que os que precisam, gritem, rezem, vigiem……

gui disse...

Belo nome para o clube. A mim, da me a sensação que há alguns jovens sacerdotes que pretendem apenas ser o ator principal de um filme de época. Vestem a batina como quem veste um muro que os separe daqueles que não se encontram dentro das personagens que pretendem à sua volta. Ainda por cima encaram o sacerdócio como carreira e não como vocação.

JS disse...

Gostaria de ter assistido a esse diálogo de surdos...

Confessionário, vê lá se reconheces alguma destas frases:

Se o mundo vos odeia, reparai que, antes que a vós, me odiou a mim. Se viésseis do mundo, o mundo amaria o que é seu; mas, como não vindes do mundo, pois fui Eu que vos escolhi do meio do mundo, por isso é que o mundo vos odeia.

Anunciei-vos estas coisas para que, em mim, tenhais a paz. No mundo, tereis tribulações; mas, tende confiança: Eu já venci o mundo!

Não ameis o mundo nem o que há no mundo. Se alguém ama o mundo, o amor do Pai não está nele. Pois tudo o que há no mundo - a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e o estilo de vida orgulhoso - não vem do Pai, mas sim do mundo. Ora, o mundo passa e também as suas concupiscências, mas quem faz a vontade de Deus permanece para sempre.

Almas adúlteras! Não sabeis que a amizade com o mundo é inimizade com Deus? Portanto, quem quiser ser amigo deste mundo torna-se inimigo de Deus!

Anónimo disse...

Verdade, verdadinha...
a Igreja hoje procura (em tudo, infelizmente) estar no mundo, a modos do mundo.
E aí é que está o problema!
A Igreja deve estar cada vez mais no mundo, mas a modo de Igreja! - ou seja, de Cristo (palavra e testemunho), para construção do reino. Cristo veio ao mundo, mas não é do mundo.
E pior...
a Igreja hoje procura (sim, procura) trazer os modos do mundo para a Igreja.
E então aí... anula-se completamente.
Deve considerá-los, e aproveitá-los (tecnicamente, por exemplo), pois claro, mas devidamente encaixados no seu múnus.
Vêde a liturgia; vêde as Igrejas, espaços consagrados - onde a presença de Deus especialmente está, onde melhor se procura e melhor se sente - como estão a passar de lugares de oração, para salões de conferências, salas de concertos-espectáculo, auditórios de relações sociais!!! Deixou de se promover a oração, e sem isso...
Mas também não é com os fundamentalismos, clericalismos e manias de superioridade da maioria dos novos padres que lá vamos...!
Estamos, de facto, numa grande encruzilhada!...

Anónimo disse...

Mesmo a propósito:
transcrição do blogue THEOSFERA, nota de 15dez16

ADAPTAÇÃO OU ALTERNATIVA?
As reformas na Igreja costumam ser feitas no sentido de a adaptar aos tempos.
Mas já houve um tempo em que tais reformas se faziam em sentido contrário aos tempos.
Se pensarmos em Santa Teresa e São João da Cruz, notamos que aquilo que os levou a reformar o Carmelo foi a insatisfação com o que viam naqueles tempos.
O critério para eles foi a origem e o eterno.
A eternidade é o que nunca prescreve, o que nunca passa de moda.
Os tempos melhoram quando os cristãos propõem o que é diferente. Para igual já bastam os tempos.
Os santos são mesmo os melhores educadores!

Confessionário disse...

15 dezembro, 2016 11:42

Cuidado com a expressão do "diferente"! Nos tempos que correm pode significar exactamente o fazer diferente para agradar; ou então fazer diferente buscando o passado próspero da Igreja. De resto, estamos de acordo!

Confessionário disse...

15 dezembro, 2016 11:39

Cuidado ao dizer que "Cristo veio ao mundo mas não é do mundo". Isso poderia significar que ele não é real e não está vivo no mundo. Eu prefiro pensar que Ele está em tudo e acima de tudo... também no mundo.
De resto, estamos quase de acordo. Apenas quereria pensar que a encruzilhada é apenas mais um cruzamento na estrada do nosso caminho.

Confessionário disse...

JS... e todos os restantes amigos que já comentaram tentando repor, de alguma ou de certa forma, a ideia de que o mundo se contrapõe à Igreja:

olhem ali o que escrevi: "Uma coisa é construir uma Igreja mundana, e outra fazê-la mundo. Uma coisa é a construção da Igreja e outra a construção do Reino"

Eu não advogo por uma Igreja secularizada, mundana. Não quero uma Igreja que se mundanize (esse erro tb o reclama o papa Francisco na Evangelii Gaudium) nem uma Igreja que se faça o mundo. Reclamo uma Igreja que esteja no mundo, porque o que Cristo veio rstaurar foi o seu Reino. Foi, por palavras muito nossas (que não traduzem tudo o que deveríamos dizer), "humanizar" o mundo.

expliquei-me?!

abraço

JS disse...

Confessionário: talvez seja preciso explicar ao pessoal que "mundo" é um conceito teológico, que difere do significado comum actual que é atribuído ao vocábulo. E mesmo como termo teológico (tal como é usado, por exemplo, por S. João) assume diversos matizes.
Assim, se se quiser bem discutir afastamentos ou aproximações ao mundo, importa primeiro clarificar o que cada um entende por "mundo". Senão, o diálogo rapidamente se enredará no equívoco (como parece ter sido o caso que relatavas, Confessionário).
Depois, pode ser necessário lembrar que um dos segredos do catolicismo tem sido o de conciliar e fazer conviver visôes distintas e até contraditórias sobre Cristo e a sua (nossa) missão. Por alguma razão sempre nos recusamos a ficar apenas com um único Evangelho nas mãos.

JS disse...

Em relação à nota que alguém quis transcrever do blog THEOSFERA:
Li recentemente quase as mesmas palavras referidas a Martinho Lutero.
E lembro que a reforma carmelita resultou na cisão da ordem.
Complicado.