quarta-feira, fevereiro 18, 2009

Eram só mais quinze

Foi preciso morrer, para o senhor padre o visitar. Tanta vez que, na doença, o convidei a passar lá por casa. Arranjam-se as maiores desculpas com argumentos, razões, motivos e causas, tempo e falta dele, disponibilidade e falta dela. Quando a vida não nos puxa para ali, inventamos tudo e mais alguma coisa para dizer que a vida tem razão. Mas hoje a campainha cá dentro soou como há muito não soava. Ficou rouca de tanto tocar. Mesmo depois de se retirar o dedo porque tinha de ir embora, continuo a ouvir o som da campainha como se nada mais cá houvesse dentro senão a campainha. Foi preciso ele morrer. A esposa bem me tinha dito para lá passar. Não disse muitas vezes. Mas para ela, porque se cansou de o dizer, foram muitas. Para mim só agora foram muitas. Estava distraído. Distraiu-me o tempo. Distraiu-me a vida. Eram quinze minutos daqueles que costumamos roubar às horas. Eram só mais quinze. Podiam parecer trezentos e quinze. Mas eram só mais quinze. Agora bem posso dizer que estou a gastar mais de quinze a pensar nisso enquanto a campainha ressoa cá dentro.

14 comentários:

Anónimo disse...

Olá!

Sabe? Nada acontece por acaso.......... Tinha que ser assim....... Eu também podia ter estado com a minha mãe mais 15 minutos, mas saí para ir à Eucaristia e quando voltei estava a sair a ambulância.... e muitas vezes a campainha ainda ressoa nos meus ouvidos.... Deus sabe o que faz....


Desculpe, neste post tão profundo, lançar-lhe um desafio:


O nosso querido Amigo, Alma Peregrina, do blogue Crónicas de uma peregrinação lançou-me o desafio: "Um desafio sem sentido, mas tá-se".
Consiste em:
1. Pegar no livro mais próximo
2. Abri-lo na página 161
3. Procurar a 5ª frase completa
4. Copiar a frase
5. Não escolher a melhor frase nem o melhor livro (usar o mais próximo)
6. Passar o desafio a cinco pessoas

Bem, o livro que me estava mais próximo é "Liturgia das minhas horas", de Paulo Guerra, S.J. e a frase:

"Vêm de longe, nascidas da minha limitação e indigência, manchando a minha história com sombras e ruínas."

Passo o desafio a:
1. Confessionário dum Padre (http://eupadre.blogspot.com)
2. Migalhas também são pão (http://migalhassaopao.blogspot.com)
3. Blogue do Padre César Cruz (http://pecesarcruz.blogspot.com)
4. Cantinho da Alexandra (http://alexandraribeiro.spaces.live.com)
5. Branco escuro (http://profundamenteeu.blogspot.com)

Um beijinho, na paz de Cristo
MJG

CrisR disse...

Outro dia escrevia algo no meu blogue sobre se quem inventou o relógio soubesse a tirania do tempo em que vivemos, iria arrepender-se de o ter inventado!
Andamos sempre a correr e ocupados, e o tempo para as coisas importantes é sempre escasso!

Vítor Mácula disse...

pois.

vermos aí que são as pequenas coisas, as tantas vezes pouco visíveis coisas, que sustentam e sustém todas as coisas, das almas aos átomos.

como o deus oculto, humilde, amoroso, pois: o deus fundo.

difícil sabedoria a cristã ;)

belíssimo post, padre.

um abraço pequeno, forte e sentido :)

S. disse...

São oportunidades que desperdiçamos, que na altura pensamos "fica para a próxima", e nunca nos consciencializamos que poderá não haver próxima...

ainat1987 disse...

Deus lá sabe o que faz apesar de sempre ficarmos a pensar. As vezes mais vale perder uns minutos nos nossos atarefados dias do que depois ficarmo-nos a pensar durante tempos a fio.

Anónimo disse...

Olá!
Não se lastime Confessionário,a vida é mesmo assim.Não podemos estar em vários lugares em simultãneo.Se quisermos, temos sempre razões de sobra para nos culparmos disto e daquilo.Num determinado contexto, agimos de acordo.
Penso que o importante mesmo é a consciência do que se faz e a capacidade de sabermos que da próxima vez poderemos estar mais atentos e escolher na vida fazer primeiro o essencial.Também pode ser difícil discernir entre várias situações qual delas é mais prioritária.Mas também depois de escolhida é assumir a escolha e não pensar mais no assunto.
Um abraço e mais uma vez grata pela partilha

Canela disse...

Eram só mais quinze...

a juntar a outros, só mais quinze!

Medite!

Anónimo disse...

Olá Padre

Permita-me que o saúde assim. Pela primeira vez senti que este cantinho era um confessionário. Especial. Nele quem escuta não tem o poder de perdoar o que quer que seja a quem quer que seja. Útil porque treina a humildade e nos faz crescer. Confessa-nos que a sua campainha soou como há muito não soava. Se fosse só a sua... A minha também toca frequentemente por motivos muito semelhantes. A doença e a solidão atingem a geração da minha Mãe. Muitas das suas amigas e as Mães das minhas enfrentam situações de dor. Sei que generosamente me adoptaram. Por todas nutro especial carinho que me retribuem em doses que não mereço. Não têm conta as vezes que ando, também, distraída acordando apenas quando a notícia que não quero ouvir chega. Hoje precisei apenas de dois minutos -não foi mais, garanto- para fazer um telefonema à L. que sucessivamente tenho vindo a adiar. Dei um beijinho e recebi, através de palavras tão arrastadas quanto lúcidas, outro muito graaaaande. Demorei um pouquinho mais com outra amiga a quem a vida, aos 87 anos, obrigou a começar de novo numa cidade que não é a sua. Com a coragem que só o Amor de uma Mãe permite. A esta deixei a promessa de uma visita próxima. Pediu-me um fim de semana. Não prometi tanto mas visitá-la-ei em breve. Estou cheia de saudades!
Como vê, Sr. Padre, a sua distracção já deu frutos:)))! Pode desligar a campainha:)))
A todos, um bom Domingo!

Um abraço amigo

Alecrim disse...

vê o que disse a Fá? desligue a campainha. A culpa não nos adianta.O arrependimento sincero e o perdão de Deus, deve suscitar "auto-perdão" e apagar a nossa culpa. É ou não é?

(eu nem sempre sei fazer isto, mas...)

Anónimo disse...

È...

Tantas vezes não temos tempo para fazer o bem e quanto tempo se perde a fazer o mal...

PAZ

Anónimo disse...

Da próxima será melhor, Tudo nos serve de lição. Fique com Deus

joaquim disse...

Ó Padre meu amigo, como toca o coração ver-te assim exposto, frágil, mas consciente de que houve uma prioridade que se sobrepôs a uma prioridade maior.

Reconhecendo isso mesmo ficas em paz, mas a mensagem que o Senhor te transmitiu por aquela mulher, fica em ti e não a esquecerás.

E é isso que é importante, porque uma subida do caminho se aplanou e tornou agora mais fácil o caminhar.

E não temos nós todos que aqui vimos estar contigo, conversado sobre tantas coisas da vida e da vida dos sacerdotes?

O tempo, o inexorável tempo, somado às múltiplas actividades agora exigidas aos sacerdotes, acaba por muitas vezes, sem se aperceberem, os “afastar” do mais importante que são as pessoas que precisam do conselho, da palavra, do abraço, que dado pelo Padre se sente presença de Deus.

Homem de oração como és, forte na fé, servir-te-ás desta “lição” para seres mais ainda de Deus para os outros.

Rezo contigo e por ti.

Abraço muito amigo em Cristo

Mafalda disse...

Que coragem a sua em ser tão verdadeiro.Obrigada por isso.Ajuda-nos.São os tais quinze minutos que nos dá, desta forma.
Como dizem atrás, desligue a campainha e continue a rezar.
gRANDE ABRAÇO

Anónimo disse...

O livro mais próximo, a página 161, a 5ª frase completa

e desejei o Carmelo logo que o conheci bem, porque achava que nesta Ordem seriam satisfeitas todas as aspirações da minha alma...