segunda-feira, janeiro 24, 2022

E se depois da morte não houvesse senão o nada?

A pergunta inquieta. A pergunta mais inquieta que podemos fazer quando sentimos de perto o rosto da velhice, da doença ou da morte. O senhor João, a quem inventei agora o nome à pressa, lê muitas coisas e já tem tempo para as ler de dia e de noite. No meio das muitas coisas que são livros ou artigos de profundo interesse, diz-me que não quer acreditar em Deus, mas que tem sempre pontas soltas quando o pensa. Por isso gosta de falar com o padre da terra, que é como quem diz, a sumidade das exegeses da fé ou da doutrina ou da Bíblia, que ele toca de vez em quando. Sobretudo quando se intriga nalguma linguagem de algum pensamento. Parece um filósofo dos antigos. Mas sem textos redigidos ou pensamentos elaborados. Parece apenas um homem que pensa porque quer viver com sentido. E é mesmo por isso, diz-me, que não se afasta totalmente de Deus, e o admira por fora. Assim como admira os crentes por dentro. Bem, isto já sou eu a filosofar. A debitar palavras e pensamentos sem nome atribuídos ao senhor João quando são mais meus que dele. Mas a pergunta que formulou como eu a disse, inquietou-me. Porque tenho uma certeza racional de Deus que me brota do amor que sinto por dentro, mas não tenho certezas para além dessa. Eu nunca imaginei um para além da morte sem Deus, senhor João. Nunca o pensei porque não faz sentido. Mas isso não será um subterfúgio de uma humanidade que quer sossegar-se?, perguntou o senhor João. E eu respondi que eu não me quero sossegar, porque nunca me sossego. Por mim falo. Mas as explicações que me saem da relação que tenho com Deus e que são inexplicáveis, são a fonte dessa evidência pessoal. E continuámos a nossa conversa com palavreado que, agora que o leio ao escrevê-lo, me pareceu mesmo um conjunto de palavras como se fossem um pequeno ensaio sobre o viver. Creio que ficámos os dois com a pergunta no bolso. Eu convencido, pelo coração, que o criador da vida humana só poderia criar uma vida com sentido para além dela. E o senhor João convencido que ainda não estava convencido, mas que o não estar convencido era um sinal de que se queria convencer. 
 
A PROPÓSITO OU A DESPROPÓSITO: "A Olímpia e o milagre da vida"

11 comentários:

Anónimo disse...

Se não houver nada, então nada haverá.
Aproveita o que és e o que tens; em breve o deixarás.

Anónimo disse...

Nada eras, nada serás. O que és, então?

Anónimo disse...

Também é verdade: a crença no além pode não passar de uma alienação do aquém.

Ailime disse...

Boa tarde Senhor Padre,
Este tema requer muitos conhecimentos de filosofia que eu não tenho.
Mas que já tenho pensado no assunto, isso sim, muitas vezes até.
Penso que aqui reside o grande mistério da vida para além da morte.
E mais nao sei.
Ailime

Cisfranco disse...

E se não houvesse nada depois da morte? Pergunta inquietante que todos fazem duma maneira ou doutra. Mesmo aqueles que parecem afirmar, convictamente, que depois não há mais nada, eu pergunto-me a mim mesmo se não o farão para se acalmarem a si próprios. Então, no meu raciocínio para autoconsumo, penso: porque será que toda a gente se questiona sobre o seu fim, uns dizendo que há qualquer coisa, outros militando que não haverá mais nada? Porquê a natureza humana ser assim: interrogativa, sempre à procura de mais? A tal ponto que se pode cair na frustração e falta de sentido para a vida. Afinal o meu cão ou meu cavalo não têm nada disto... Será que estamos feitos para sermos infelizes, coisa que os animais não são? Se assim é, mais valia sermos como os animais e não ter esta capacidade de questionar. Isto parece-me absurdo. Este é o meu argumento, digamos, psicológico e filosófico caseiro para crer. Claro que depois vem tudo o Jesus disse, selado e credibilizado pela Sua ressurreição.

Anónimo disse...

Uma citação a que Anselmo Borges gosta muito de recorrer:
"Um cão que morre como um cão e sabe que morre como um cão é um homem."

Anónimo disse...

Há cães que morrem como um cão e outros que morrem sem ser como um cão? E se morrem como um cão, então são homens? Não percebi

Anónimo disse...

Que o assunto é complexo e há espaço para discussão, mostra-o o facto de a crença na ressurreição ser relativamente tardia na história do povo bíblico. No tempo de Jesus ainda não era uma crença consensual; e apenas se colocava a hipótese de uma ressurreição colectiva, não individual.

Confessionário disse...

28 janeiro, 2022 08:59
O que considera como o tempo de Jesus? Enquanto ele estava entre nós? Ou os inícios do cristianismo? O que considera como o povo bíblico? Será Israel ou será o que depois se chama de novo povo de Deus, a Igreja?
Faço estas perguntas, porque, apesar das naturais dúvidas que sempre subsistiram à volta de um tema tão complexo como a ressurreição, há que dizer também que foi esse "fenómeno" que transformou claramente a vida dos apóstolos e que originou o crescimento exponencial do cristianismo!

Anónimo disse...

E se depois da morte em vez do nada, nos encontrássemos todos?
Mas há pessoas que eu não gostaria de encontrar. E será que na eternidade posso mudar de passeio?

Anónimo disse...

Para mim eternidade não é nada, é TUDO porque me vou encontrar face a face com Aquele que me ama com um amor único e irrepetível. Ali a felicidade é plena por isso, não há necessidade de mudar de passeio.