Estava cansado e farto de tudo. Farto das incompreensões e decisões do bispo. Farto dos colegas que só pensam neles. Farto dos paroquianos que vivem a exigir coisas que ele não consegue dar. Farto e cansado de tudo e de todos. Quando amanhecia, tinha vontade que a noite regressasse depressa para tomar o comprimido de dormir. Fazia o que tinha para fazer como qualquer máquina onde se coloca uma moedinha. Andava pela paróquia e pela vida de cabeça erguida e ombros levantados. Fazia lembrar o cavalo elegante com os antolhos para não ver senão o que está a sua frente para ser feito. Chegado a casa, o seu corpo transformava-se, tolhia-se, encurvava-se, amarelecia. Pegava no livro da liturgia das horas e rezava palavras sem dialogar com Deus. Sentia que a sua espiritualidade se esvaía por entre os dedos. Tentava segurá-la como se segura a água numa mão. Ficava apenas um resto de humidade que rapidamente secava. Era como se a fonte tivesse secado. Como se Deus o tivesse abandonado à sua sorte. Entrara no seminário de armas e bagagens, como se costuma dizer, entusiasmado porque ia mudar o mundo, ia ajudar as pessoas a encontrar-se com Cristo. Mas a realidade impôs-se. Era mais forte do que ele e do que todo o entusiasmo que alimentara em tempos de seminário. Sentia-se sozinho. Não tinha com quem partilhar os sucessos e as derrotas. Só as paredes da casa paroquial sabiam a verdade do seu coração, e a almofada que recolhia as lágrimas antes do comprimido fazer efeito.
A PROPÓSITO OU A DESPROPÓSITO: "O padre é o tem de"
1 comentário:
Neste tempo: que comunidade? que padre? Mas, vem aí a sinodalidade, com gentes sem a mínima preparação, e tudo se resolve!!!....... em plano inclinado.
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