Era amiga da falecida. Já haviam passado umas semanas. A amiga falecera com um cancro fulminante. O sofrimento durara apenas um mês. Desde que as dores apareceram até que no hospital a morfina a sossegou de vez, tardou um mês. Toda a gente na terra falava do assunto e da pena. Eu também. E a sua amiga precisava dizer o que sentia. Porque é que a sua amiga, que era, por sinal, muito boa, tivera uma morte tão arrepiante, tão injusta, tão não sei o quê? Então Deus não premeia os bons e castiga os maus?
Há dias, o evangelho de João recordava-nos as respostas de Pedro a Jesus quando este lhe perguntou se o amava. Três vezes lhe deu uma resposta afirmativa. Tal, como uns dias antes, três vezes o negara. Mas o curioso é que, depois de Jesus lhe fazer a pergunta, vai também dar-lhe sinais do tipo de morte que lhe calharia em sorte. E como nós sabemos, foi a crucificação ao contrário, ou seja, de cabeça para baixo, porque Pedro não se achou digno de morrer tal e qual como o mestre. Recordo esta passagem, porque a sorte final de Pedro não lhe foi dada porque traíra Jesus, porque agira mal, porque o negara, mas porque o amava. Foi na sequência da certeza do seu amor, que Jesus lhe manifestou como ia padecer. Nós é que estamos habituados a catalogar as coisas e, de igual modo, catalogamos as coisas de Deus. Nunca teremos certezas absolutas da acção de Deus. A única coisa que saberemos é que, nas coisas de Deus, o que mais importa é o amor!
16 comentários:
Sim, sinceridade está no amor.
É precisa muita lata para extrair estas conclusões. As voltas que a vossa cabeça dá, Srs. Padres, para encontrar justificações para o injustificável. Para ser muito verdadeira, o que parece, entre isto tudo, é que têm gosto por sangue, por sofrimento, por cabeça baixa. Sofrer por amor. Romper por amor. Impor por amor. Aceitar por amor. O que é o amor afinal? Mais aprece um lenço enxovalhado. Talvez alguém pegue nele para limpar as gotas de suor que lhe afloram a testa. É que tudo isto é tão cansativo, custa tanto ver... Toma lá, mais uma! Contaste-as Pedro? 3 + 3, tudo junto dá quanto?
Pois hoje o que tenho para lhe dizer é que fique lá com o seu amor, faça-lhe o que quiser, ponha-o onde lhe apetecer, desde que não incomode os demais. Até pode desaparecer com ele. Para sempre. Farta de paleio barato, 3 + 3 +3 + 3... Puuuuu8u!|
Que na rota que levamos para os braços do Pai, como o esperamos, o Espírito nos anime a ver, tocar, animar, acudir a todos os pequeninos, que Mateus 25 nos mostra, tão claramente, serem a porta do céu.
18 julho, 2019 09:35
Ora vamos lá ser um pouco mais claros.
Este texto anda à volta da questão: Deus premeia os bons e castiga os maus?
E, para provar que Deus não funciona deste modo, lembrei que a Pedro não foi "destinado" aquele tipo de morte por causa das suas negações (a parte má), mas na sequência de demonstrar o tão grande amor que tinha a Jesus (a parte boa). Ora...
Só posso falar por mim (não posso falar pelos restantes padres): não gosto nem de ver sofrer nem de sofrer; mas a minha fé faz-me encontrar algum sentido ao sofrimento! SE é bom? Não. Se fosse bom, todos o queriam. Mas haverá sempre algo que podemos perceber nele!
Não me quero meter em conversa que não me diz respeito - nem tenho pachorra - mas, fiquei a pensar... Deus é português, etíope, brasileiro...? O sofrimento tá localizado?
Boa reflexão, Sr. Padre. Gostei de ler.
A lógica de Deus é bem diferente da nossa. A passagem de Jesus no mundo está repleta de episódios que mostram isso mesmo. Nem sempre parece justo aos nossos olhos, é um facto, mas acredito que a justiça de Deus seja bem diferente. Assim espero, pelo menos.
Parabéns pelo bom trabalho que tem feito. Continue.
Os meus parabéns por tantos textos maravilhosos. Padre ou não padre, poucos serão os que reúnem tantas qualidades humanas e literárias numa só pessoa. O desinteresse em cada palavra, o despojamento pessoal, o outro, sempre o outro em primeiro plano. Penso que este seja o seu leit motiv, a razão que o leva a escrever em cada dia. Por mim, cada vez mais encantada com a sua sensibilidade, a capacidade para prescrutar o sentir dos outros, o seu bem, sempre a querer o seu bem. Para quem escreve? Foi questão que se me colocou muitas vezes. Com que objectivo o faz? Por iniciativa própria ou conduzido por algo maior? Muitas vezes - ou todas - em que o li, fiquei com a certeza que os seus textos, tão intimistas, eram dirigidos a uma audiência que queria impressionar com o seu talento e tão grande talento tem o Sr. Padre. Coisas de artista, não é verdade? O que importa é que não magoa ninguém, é discreto. Ninguém consegue «decifrar» os seus textos, digamos assim, o Sr. Padre faz sempre por não identificar ninguém entre as suas «Marias» e «Manéis». O importante é que é tudo por bem, e tanto bem faz o Sr. Padre! Bem demais, se há bem que pode ser contabilizado em demasia. Tem um condão que tudo transforma em maravilha, eu pelo menos, estou cada vez mais maravilhada e louvo o Senhor pela graça de o ter entre nós. Precisamos de artistas dos bons. De proletários, vertente que aprecio num Padre. Acredito que tenha igualmente uma enorme capacidade de mobilização. De certeza que tem. E que bom sabê-lo. Gostava tanto de o conhecer, estou mesmo ansiosa por apreciar essas maravilhosas qualidades que possui. É de guias espituais, engraçados, divertidos e carismáticos que precisamos. Em si claro que o encontramos. Talvez possamos ser amigos, quem sabe. Há algo melhor? Muitas felicidades se é que isso lhe é importante.
Olé, Confessionário.
Penso já to ter dito noutro momento: por vezes deixas-te enredar nas malhas equívocas da teodiceia.
Ao usares o caso de Pedro para desconstruires a doutrina da retribuição, acabas somente por invertê-la e torná-la ainda mais absurda. Queres dizer que a morte não é um castigo do pecador, acabas por sugerir que se trata de um prémio, de uma recompensa do amante.
Não convém confundir a morte de Pedro com a morte de Lázaro.
Nas coisas de Deus o que mais importa é o amor!
Afinal o que é o amor, perguntava um anónimo e porque é que que nas coisas de Deus (Será que não é tudo coisa de Deus?) só o amor importa?
Que sentido encontrar para uma doença como o cancro, então quando é fulminante muito mais difícil se torna encontrar esse sentido.
Estou no período de remissão de um cancro que me concedeu 60% de invalidez.
Tento não pensar muito nisso e dizer para mim mesma que já passou o pior, mas por vezes dou comigo apavorada, e a questionar-me porquê eu numa família sem historial nessa área.
Porque é que às vezes tudo me parece vazio e sem significado e me sinto apenas uma inútil criatura que não tem certeza alguma?
Sinto também muitas vezes que nenhuma importância terei para Deus!
Duvido demasiado e talvez seja por aí que ainda não consegui atribuir convicta um sentido para este sofrimento que às vezes me apavora.
Porquê? Porquê? Porquê?... A pergunta que tantas vezes fiz...
Num momento de perda violento, na homilia da cerimónia fúnebre apenas uma frase me ficou... "Deus leva para junto de Si os que mais gosta.." O contexto em que foi dito não me lembro... Porque por mais que vos esforceis Padres, e louvo o esforço, o sofrimento é de tal forma intenso que nos alheia a qualquer palavra. É a alienação total.
Mas voltando à frase " Deus leva para Si os que mais gosta" É uma frase que que descontextualizada pode tornar-se para alguns aberrante. Estranho não me ter chocado, porque foi assim que a ouvi... Descontextualizada, no meio de muitas outras palavras, esta frase ficou-me. Vá se lá saber porquê... Não me chocou e hoje acho que a entendo. Aliás, acho que a entendi logo...Não me perguntem porquê... Não saberia explicar. Os porquês mantêm-se, mas serenos, porque mantenho a convicção que um dia terei resposta e não tenho pressa. Se assim se pode considerar um sentido, esta certeza de que algum dia conhecerei a resposta, foi o sentido que encontrei no meu sofrimento.
Voltando ao tema central do post - Deus premeia os bons e castiga os maus.. Ninguém que eu preze utiliza a expressão "Deus não dorme" à minha frente sem ser repreendido por mim...
SL
JS,
Já sabes como aprecio imenso os teus comentário e achegas.
Neste caso concreto, não faz muito sentido, embora o culpado possa ser eu, na medida em que possa não ter sido claro no texto. Os textos são sempre inacacabados e limitados, por mais belos e completos que possam parecer, porque dependem, não apenas do seu emissor, mas da forma como lê o seu receptor.
O que eu quis reflectir, neste texto, foi a questão de prémio e castigo de Deus consoante as nossas virtudes e pecados. Para isso, justifiquei que Jesus informou Pedro da morte que ia padecer, não por ocasião das suas negações nem com motivo delas, mas na ocasião em que este lhe manfesta, de certo modo, o seu amor. Ou seja, foi num momento em que Pedro diz ao Senhor quanto o ama que este lhe refere a morte dificil que iria ter.
Não quis, portanto, que se entendesse que a morte ou determinados tipos de morte são consequencia de determinadas virtudes ou pecados. São o que são. E o que mais importa, diante da morte, não é os méritos ou virtudes, a sorte, a dor, ou o tipo de morte, mas quanto Deus nos ama.
SL,
eu não gosto muito dessa frase.
Entendo-a, aceito-a, tb já a tenho usado, pode ser muito alentadora, mas eu creio que Deus gosta de todos, e leva todos, agora uns depois outros. Essa justificação é muito boa para nós, mas eu prefiro pensar que, se calhar, Ele chama, porque a nossa missão já terminou, e terminou bem!
São apenas considerações
19 julho, 2019 17:42
Bem haja pelas palavras de icnentivo
Paulina
Nem sempre o sentido é óbvio. Muitas vezes só depois de passado o susto, se faz alguma luz, mesmo que pequenina.
Só do lado de fora as coisas obtêm mais sentido! De dentro, é quase impossível. Casos raros são os dos santos e dos mártires!
Conf.
É evidente que não acredito na frase no seu sentido literal...Deus não faz acepção. Existe todo um contexto, um historial de vida, não só antes como depois, que fizeram encaixar a frase.
É tudo muito pessoal, cada um com a sua história e Deus com a de todos.
Gostei da "missão terminada e bem."Faz me sentido.
Bjito
SL
«Jesus informou Pedro da morte de que ia padecer».
Di-lo agora, Sr. Padre. Então, se inquirisse o nosso estimado Pedro logo após ter ouvido as palavras de Jesus, calculo que nem o próprio estaria apto a descrever o tipo de morte e o sofrimento. Provavelmente Pedro não era um ouvinte astuto, capaz de decifrar «lamirés» que lhe eram dirigidos.
Ou, melhor será dizer que o Evangelista, após ter acesso aos relatos relativos ao falecimento de Pedro, informou os leitores dos comentários que Jesus a propósito dos sofrimento de que Pedro iria padecer. Nunca o iremos saber.
Retira-se que, naquela altura, o dever de informação (ou de predestinação) era tido em grande conta, embora o da sua transmissão fosse bastante facilitado. Como se vê a mensagem chega com falhas manifestas. Mas convenhamos que Jesus nem sempre (ou quase nunca) primava pela clareza. Desta forma, entre a «ida» e a «vinda» os textos têm pano que dá para mangas, ou dito de outra forma «são leituras inesgotáveis».
Suponhamos que o nosso amigo JS ou o Sr. Padre, na sequência de afrontamentos e palpitações, deslocavam-se a um consultório médico (podiam até ir os dois em conjunto), e que o médico identifica a doença ou transmite o tratamento de um modo equívoco. Tão equívoco mas tão equívoco, que nem um nem outro dão pelo equívoco.Provavelmente nem pela doença. Provavelmente incorreriam ambos em erro caso se não não lograssem esclarecimento, visto a sua persistência que não se compaginar com a fragilidade da saúde de ambos (suponhamos). Dá que pensar.
Há casos, como o de Pedro - ou o de Maria - em que parte da informação é sonegada, de forma a possibilitar o escorreito desenrolar da narrativa, ou a não permitir a anttecipação do final o que poria um termo abrupto ao suspense.
Pegando em Maria (e se ela é pesada), vamos colocar em hipótese o casamento. Não com José, que foi apanhado no meio de tudo e foi ficando, mas o «casamento com o Senhor» (as senhoras freiras também casam com Deus ou pelo menos são suas noivas, pelo que não me parece muito chocante mais esta suposição). Vamos substituir o nome de «Maria» por «Manuela», por exemplo. Mais uma vez vamos supor que Deus praticou algo muito grave, de tão grave que Manuela, a saber, nunca casaria. Troquemos o nome de Deus, que vai passar-se a chamar «Leandro»... Deverá Manuela casar com ele? Com o Leandro que a equivocou, com aquele «fresco»? E se já casou, como pode «Manuela» desfazer o erro em que Leandro (e os amigos) a fizeram incorrer?
Espero que consigam desmontar esta história de uma forma útil e inequívoca, mas a verdade é que não me posso alongar, tenho consulta hoje e está na hora e não estou desposta a desfazer equívocos. Em vez de «Manuela», a senhora passa a «Clara», s.f.f.
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