A Camila é uma boa rapariga. É uma boa mãe. É uma boa catequista. Eu atrever-me-ia a dizer que é uma boa cristã. Mas a vontade de nada é a vontade que tem mais vezes. Passa o tempo a queixar-se do que não tem, do que queria ter, do que anseia viver. Desta vez queixava-se de este ano só ter cinco crianças na catequese. Por isso perdera a vontade de dar catequese. No entanto, em cada encontro da catequese fica feliz por poder partilhar Deus com aquelas cinco crianças. Como é bonito vê-las a crescer. Cada uma delas. Dizia-me. Cada uma delas.
As suas palavras foram a melhor ocasião para lhe recordar como Deus lhe dava tanto e ela achava sempre tão pouco. Deus dera-lhe cinco crianças para guiar, e ela achava pouco. Deus dera-lhe a oportunidade de servir e ser missionária junto destas crianças, mas ela insistia no desejo de ir para África como missionária. Deus dera-lhe uma comunidade cristã onde crescer e por a render os talentos que lhe dera, e ela continuava a desaproveitar esses dons, porque nem sempre a comunidade é como ela gostaria que fosse. Tentou interromper-me para murmurar baixinho que nunca lhe ocorrera este pensar. Porém, eu continuei o meu raciocínio, como se não a estivesse a escutar, lembrando-lhe que Deus estava sempre a dar-lhe coisas, oportunidades, soluções, e que ela insistia em desaproveitar grande parte delas, porque achava que era pouco ou que não era bem o que queria.
1 comentário:
Sabe o que acho? É o nosso Deus, este com que lidamos quotidianamente, aproveita-se das iniciativas alheias, coloca-lhes a sua etiqueta e num piscar de olhos passam a coisa sua. A isto qualquer bem-intencionado chamaria «abuso». Agora é uma questão de enquadrar a sua amiga «Camila» no considerando e ponderar o que é «muito» e «poucochinho». O «pouco» é sempre «pouco», mesmo quando lhe chamamos «muito», ainda que tentemos observá-lo por outro ângulo. Este «pouco», pode contudo não ser um «menos», o que sucede sempre que o pouco-chega, por outras palavras, «basta».
Vamos enquadrar a sua amiga Camila nestes considerandos. Deus dá-lhe muito e ela acha pouco, segundo diz. O que é pouco para a pequena? Cinco crianças, serão pouco? Meu amigo, permita-lhe que lhe chame assim – tenho idade para ser sua tia, por isso, não vejo inconveniente no termo – a pequena devia olhar para estes os miúdos como se fossem «seus». Estou certa que a sua perspetiva mudaria imediatamente. Lamentar-se por aquelas crianças por não terem a «simplicidade» e a «pobreza» da esmagadora maioria das crianças de África e necessitarem de muito mais para se divertirem e estarem bem com a vida. Compreender que dar «catequese» ali é uma missão deveras importante e aprender também ela a despojar-se das suas ambições de «muito» para tentar perceber o que tem e entre isso, o que é o «pouco», porque, lá está, «pouco» pode ser «bastante» e o bastante é sempre demais. O «pouco» quando não é miséria, pode ser uma grande riqueza, como é sabido. Talvez surja na pequena a vontade de aumentar o «pouco» e pouco a pouco, vá aumentando o número dos catequizandos. Com sorte ainda se tornam demais.
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