terça-feira, dezembro 31, 2024

a carta dos nomes [poema 397]

a carta que te envio num envelope branco
tem o teu e o meu nome, tem todos e cada nome 
que o teu nome no meu...
contém

não procures nele palavras para além dos nomes, não as encontrarás.
o envelope branco vai aberto, como aberto vai meu coração 
e as palavras são livres, só os nomes é que não. 
estão presos numa espécie de... 
mão na mão ou mãos na mão.

o carteiro disse-me que tinhas a porta aberta, e não entrou 
tua cabana não estava vazia, estava lotada
com centenas de cartas que te enviou 
alguém 

com um nome que tem todos e cada nome
que o teu nome no meu...
contém

sábado, dezembro 21, 2024

O chefe do Pai Natal

Na missa de Natal da catequese, durante a homilia, no meio do diálogo com as crianças, ao perguntar se já tinham o presépio montado em casa, uma das crianças lembrou que também já tinha colocado o Pai Natal na chaminé. A assembleia riu-se e eu também. Foi, aliás, uma boa ocasião para lhes lembrar como “nasceu” o Pai Natal. Estávamos no século III, por volta do ano 260, quando nasceu, na Turquia, Nicolau, um bom homem que se tornou bispo de Myra, hoje a cidade de Demre, também no mesmo país, onde acabou por morrer a 6 de dezembro de 343, dia em que o santo é assinalado no calendário cristão. Como passava grande parte da sua vida a ajudar os outros, em particular as crianças pobres, não passou despercebido, ao ponto da sua figura se ligar às tradições de Natal nos países nórdicos, sobretudo, na Holanda, onde se começou a festejar o Sinterklaas, mais tarde Santa Claus no Novo Continente, a América, para onde foi levado pelos holandeses. Embora mantivesse alguma ligação a S. Nicolau, o Sinterklaas apresentava-se com barbas brancas, mais de roupas verdes que encarnadas, com um livro na mão onde tinha registado o nome das crianças que receberiam um presente. Já nos Estados Unidos e no século XIX, as grandes lojas passaram a comercializar a figura de Santa Claus, até que nos anos 30 do século XX, surgiu o pai Natal da Coca-Cola. O publicitário Haddon Sundblom inspirou-se no poema “Uma visita de São Nicolau”, de Clement Moore, para criar a figura do homem de barbas brancas, vestido de encarnado, com a gargalhada singular ho-ho-ho, de saco às costas para distribuir presentes pelas crianças de todo o mundo, voando num trenó puxado a renas. Já faz parte do imaginário do Natal e, desde que não ofusque a verdade e essência do Natal, creio que não vem mal ao mundo. Comentava, mais ou menos, estas coisas, quando uma das crianças, convicta e corajosa, levanta o braço e diz: Senhor padre, Jesus é o chefe do Pai Natal. Seguiu-se uma risada geral e as restantes crianças concordaram com ela. Ao menos isso. Que se perceba que o Pai Natal só existe porque o Menino Deus encarnou e nasceu para morar em nós e fazer do mundo um lugar mais feliz.


Aproveito para vos desejar um Santo Natal e um Feliz Ano Novo: Que o nosso coração tenha a porta aberta para Ele fazer aí sua morada! 

domingo, dezembro 15, 2024

Chegou a Hora do meu pai...

Chegou a hora do meu pai. Chegou a hora de passar da condição mortal à condição de imortalidade na vida eterna. Quero dizê-lo com H grande e digo, aproveitando para colocar outra maiúscula no meu pai. Chegou a Hora do meu Pai. Não quero esconder os dias difíceis que atrasaram os meus afazeres, mas não atrasaram o meu coração. Muito pelo contrário. Acompanhei os últimos tempos do seu sofrimento, para que lhe pesasse um pouco menos. Ele ficava mais tranquilo quando eu estava, e estive tanto quanto me deixaram estar. E eu também tranquilizava. Esgotei-me por dentro e por fora. Porém, em tudo consegui ir vendo o dedo de Deus. A festa da partida foi muito bonita. Foi uma grande festa de acção de graças. Não tinha ainda contado aqui, mas meu pai era diácono permanente. Por isso, o meu bispo acabou por presidir à Eucaristia. A homilia foi minha. As leituras da minha família. O canto dos meus amigos. Igreja cheia. Cheia com antigos e novos paroquianos. Cheia de testemunhos de gente que, como diziam, fora meu pai que os levara à fé. Chorei tanto quanto consegui. E sorri ainda mais. Quem nos conhece e conhece a relação de pai e filho que tínhamos, sabe que éramos muito cúmplices. Sempre o fomos. Entretanto, a partida da minha mãe fez-nos viver estes vinte e três anos muito mais um para o outro. Até porque a fé e o modo de entender Deus nos unia imenso. Assim como o ministério ordenado. Diziam as minhas manas que quando lhe faziam uma proposta, obtinham sempre a mesma resposta. Tenho que falar com o vosso mano. Por isso não admira que tivéssemos passado juntos grande parte dos últimos dias antes da partida. Muito rezámos juntos também. Ou eu rezava e ele acompanhava-me. Eu rezava e ele tentava respirar a custo a minha oração. Devo-lhe a ele e à minha saudosa mãe, não só a vida, como grande parte da fé e da vocação. Só posso estar grato a Deus pelos pais que tive. Por isso foram muitas horas de acção de graças, que ainda se prolongam hoje. Para que meus paroquianos compreendam porque ando alegre, explico que não sou super-homem e que sofro como qualquer ser humano sofre na partida de quem ama. Mas a fé é muito mais forte que a dor. O meu pai partiu, mas vem constantemente ao pensamento. E eu sou feliz. Sou feliz pelo pai que tive na terra e que ainda tenho no coração.

A PROPÓSITO OU A DESPROPÓSITO:  "Feliz dia do pai" e "Obrigado pela fé que me destes"