terça-feira, setembro 10, 2019

Igreja menos clerical

Há uns dias, depois de umas obras numa das minhas paróquias, foi necessário limpar a Igreja, e o povo juntou-se para o fazer. Depois convidaram-me para almoçarmos juntos. Foi bonito. Muito bonito. Mas às tantas, uma das senhoras, que é muito atrevida e tem sempre um olhar desconfiado para com todos, perguntou porque é que eu não participara da limpeza da igreja. Ela até tinha razão. Eu também poderia ter participado. Só me faria bem estar ao lado deste meu povo. Respondi, em tom de brincadeira, que os padres deviam, de facto, ser limpa-igrejas. Que, aliás, eles deviam fazer tudo na comunidade cristã. 
Disse-o em tom de brincadeira. Mas depois o pensamento levou-me a pensar em muitas outras coisas que, nas comunidades cristãs, esperamos que o padre faça. Como se fosse omnipresente. Como se a Igreja fosse o padre. Como se uma comunidade cristã tenha de ser obrigatoriamente clerical. Estava mesmo a recordar-me daqueles colegas que, quando chegam a uma paróquia para celebrar missa, têm de preparar os vasos sagrados para a mesma, acender as velas e tocar o sino para que as pessoas venham. Estava também a imaginar como seria se os padres tivessem de varrer a Igreja, assear e adornar os altares, tratar das flores, lavar as alfaias, ler todas as leituras na Liturgia da Palavra, começar o canto da animação musical das cerimónias, e por aí fora. É óbvio que raramente as coisas acontecem assim. Mas isso não me impede de pensar que ainda há muita acção apostólica, litúrgica e formativa demasiado centrada na figura do padre, como se uma comunidade cristã dependesse totalmente deste. Ainda há comunidades cristãs que não conseguem fazer nada sem o padre, sem a sua presença e consentimento. Ainda há muitas comunidades cristãs centradas no padre, quando o centro da comunidade deve ser o próprio Cristo. Ainda há muitas comunidades cristãs que não são verdadeiras comunidades ou verdadeira Igreja.

6 comentários:

HD disse...

Caro amigo



Eu acho que poderia haver uma outra hipótese de leitura da observação da paroquiana.



Cairiam os "parentes na lama" se o Sr. Padre colaborasse nessas tarefas de limpeza?

Por vezes (não o conheço e espero que não pertença a essa horrenda casta clerical) há padres que acham que têm um estatuto especial, onde determinadas tarefas mundanas são para os "plebeus"....



Não se misturam, há tarefas básicas que são para os "mais simples", até exigem que o tratem por Sr Padre....e tanto haveria a comentar sobre "alguns" seus colegas que vivem mais numa Corte, do que sentirem-se como pastores ....



Há tempos na minha paróquia o pároco durante o arraial, andou a ajudar na cozinha com os grelhados e o coadjutor a limpar mesas e a recolher o lixo- misturados com outros leigos voluntários.

Foi bom ver estes gestos, pois caíram por terra alguns “anticorpos” de alguma malta que entende que por vezes o Clero gosta muito de usufruir, mas pouco de colaborar no esforço....



Mas se calhar estou errado nestas observações…



Abraço fraterno em Cristo

HDias

Confessionário disse...

HDias,
Não sinto necessidade de me defender ou justificar.
Parece-me que o primeiro parágrafo deste texto dá conta de que é muito bom estar com o povo, agir e trabalhar com os meus paroquianos (não só "para", mas "com"). O que ocorreu, no entanto, foi motivador para pensar a Igreja que sonho menos clerical.
Por outro lado, e embora faça muitas coisas comuns com a minha gente, reconheço que deveria fazer muito mais.

Anónimo disse...

Olá, muito bom o relato, que condiz com o comportamento humano. Mas nem todos tem um pensamento que pode ser construtor. Por que fazemos pelo outro em algumas ocasiões ainda fica só desejo ou algo que perdure. O trabalho coletivo nós ajudam a mantermos unidos em comunidade pode ser mais agradável.o Sr não tem que justificar nada tudo um pode ter dois destinos o reconhecido do esquecido. O que todos tenham os mesmos aspectos de realidade condicional e tua presença por mais que Deus lhe guie terá os que ainda não entendeu a sua posição em sociedade. É onde bate o etnocentrismo sem percebemo.Parece que há vendas nós olhos e vento no cérebro.

Anónimo disse...

Muito bom dia, Sr. Padre

Poderia facultar-me o endereço pessoal do Papa, p. favor?

(Gostava de lhe enviar uma conta).

Muito obrigada,

Eu própria

Anónimo disse...

Olá, corrigindo terceiro comentário, é o egocentrismo sem percebemos,

Anónimo disse...

Ainda há muitas comunidades cristãs que tudo fazem para se livrarem do padre, mas não conseguem. O padre é a torre, a estátua, a voz, o nariz, porque quer e põe o nariz em tudo. Falo dos padres clericais, os padres-igreja, que não sabem dar lugar, porque também há desses. São aqueles que quando estão sentados ou frente ao altar ou ao ambão vêm todos os lugares preenchidos. Às tantas pretendem apenas comunicar a omnipresença divina por seu meio. Esquecem-se, porém, das intersecções, o que bom. È bom saber que há de restar sempre um lugar para o vazio.