quarta-feira, julho 10, 2019

Quanto mais acredito, menos faço

Um padre amigo e sábio disse-me um dia que quanto mais acreditava, menos fazia. Eu estava ciente e seguro de que devia ser ao contrário. Que quanto mais motivados pela fé, mais entusiastas da acção deveríamos ser. Que tolice a minha. E não era exagero da juventude que possuía nesse tempo. Era a tolice de quem se convence que a sua acção vai salvar tudo o que encontrar pela frente. Como se essa salvação dependesse de nós. Tão tolo. Hoje percebo um pouco melhor a frase daquele meu amigo. Não a levo à letra. Nem conseguiria. Mas tento. Talvez no meu pouco que faço surja o muito de Deus. Talvez menos activo, eu não me confunda com a sociedade, relações e religiosidade consumistas. Sim, porque nós vivemos numa sociedade que consome bens, numa afectividade que consome pessoas e numa igreja que consuma ritos e gestos religiosos. Talvez a nossa melhor acção seja Ser. Ser para amar e ser amado por Deus.

23 comentários:

Anónimo disse...

Uhmm, as duas últimas frases baralharam-me um bocadinho!!!!!
Acha que pode "explicar" um pouco melhor?
Bj

Confessionário disse...

Sera mais que agir!

Anónimo disse...

Sim, ser/agir, amar a Deus e amar...,
Ser.
Bj

Anónimo disse...

Já temos homilia feita para o dia 21? :)

Confessionário disse...

12 julho, 2019 12:25
Por acaso ainda não li as leituras desse domingo.
Mas vou ficar alerta! lol

JS disse...

Há também um lado mais sombrio (mesmo que natural) escondido na frase.

É que com o decorrer do tempo a acção/actividade tem realmente tendência a reduzir. A disponibilidade de energias não é a mesma; os fracassos e respectivas frustrações acumulam-se, a necessidade de segurança pela rotina intensifica-se. E por vezes constroem-se auto-justificações teológico-espirituais para lidar com (e ocultar a) realidade das coisas.

Confessionário disse...

JS,
...pois...

Anónimo disse...

JS
uhmmm...parece uma "justificação" um pouco "dura"...

Anónimo disse...

...pois... pois... duríssima.

JS disse...

Gosto de lembrar aquela história dos três religiosos numa casa.
Um era franciscano, outro dominicano e o terceiro jesuíta.
A certa altura faltou a luz.
O franciscano ajoelhou-se e começou a rezar: "Bendita a irmã luz que nos alumia..."
O dominicano levantou-se e começou a pregar: "Já no início da criação Deus dizia: 'Faça-se a luz'..."
E de repente a luz voltou.
O jesuíta tinha ido trocar o fusível.

Quando no outro dia ouvia falar do esmoleiro do Papa em acção, senti-me feliz: já temos Papa para o futuro.

JS disse...

O "menos faço" pode fazer sentido dentro da lógica "menos é mais" e do "work smarter, not harder".
Faço menos, mas sou mais objectivo, mais focado, mais eficiente no que faço.
É também a experiência a falar, e a aceitação dos próprios limites.

Confessionário disse...

JS
eu tb conheço essa história. E de repente aquele que estava preocupado com a vida, trocou o fusível. Deixa falar desta maneira. A sua acção é fruto de quem era. Por isso a questão jocosa da história...
Ou seja, o que dizes às 15:51 é, em verdade, mais de acordo com o que eu pretendi escrever. A juventude (sim, tb a juventude sacerdotal) faz-nos correr com a sensação de que devemos fazer mais e mais, fazer tudo, quase como se a salvação (repito) dependesse dessa nossa acção. Com o tempo e maturidade, vamos descobrindo que a Salvação é algo que depende, verdadeiramente, de Deus. E aí, muda-se a perspectiva de vida! tenta-se viver mais que fazer!

mas estou a gostar muito deste pequeno debate que me tem feito pensar.
Pois eu próprio, sem querer, posso deixar-me cair na desculpa esfarrapada e que está sempre à espreita!

Anónimo disse...

Em tudo que disseste, faz sentido e que tenhamos a virtude de fazer e também de acreditar naquilo que somos bons por que a perfeição somente cabe a Deus.bjtos

Anónimo disse...

por acaso também gostei deste debate, já estou a ver, e aperceber melhor este post,
mas agora o titulo, se calhar já não "coincide" tanto com texto..., um texto muito interessante mesmo.
Bj

Ailime disse...

Boa noite Sr. Padre,
À minha maneira, muito simplista, vou dizer o que penso sobre este assunto.
"Quanto mais acredito, menos faço".
Quanto mais imbuídos estivermos do Amor de Deus mais fácil será a nossa tarefa que fluirá com mais naturalidade. Os nossos gestos, as nossas ações terão repercussão nos que nos rodeiam e tudo se encadeia normalmente.... Será?
Abraço e bom fim de semana.
Ailime

JS disse...

Confessionário, penso perceber o que pretendes salientar: a esterilidade final do activismo, que não dá lugar à acção de Deus.
- Não deixo que Deus aja em mim (o activismo mascara e é muitas vezes uma óptima desculpa para uma débil vida espiritual, para não se crescer na relação pessoal e íntima com Deus, para não se escutar o que o Espírito tem a dizer às igrejas.
- Não vejo nem aceito que Deus aja nos outros, antes e para lá da minha acção (mesmo que também pela minha acção), e sobretudo de forma diferente dos meus planos e esquemas, num ritmo e num tempo que não domino nem controlo. A liberdade do Espírito (que sopra como e onde quer) continua a enervar muita santa gente dentro da Igreja.

JS disse...

Todavia, continua a martelar-me na cabeça aquela frase do Papa sobre uma Igreja fechada na sacristia, paralisada e paralítica, que prefere ficar imóvel a sair e agir, por medo de se sujar, de se ferir, de se enganar. Que vê a criatividade como uma ameaça, a misericórdia como uma fraqueza, o esforço de renovação como uma inutilidade. Que inveja e censura qualquer assomo de alegria e entusiasmo. Não fazem nem deixam fazer, e têm raiva de quem faça.

Confessionário disse...

JS,
Temos de separar o activismo daquilo que é uma entrega comprometida à missão.
Creio que aqueles que se dedicam incasávelmente à missão não passam a vida a fazer coisas e centram-se no essencial. Talvez não façam tantas celebrações e estejam mais com as pessoas. Talvez...
Assim como temos de separar a Igreja paralisada e fechada na sacristia da Igreja que se gasta com o essencial. Dou-te um exemplo, embora coxo: tenho um colega que tem feito um trabalho muito interessante nas suas novas paróquias, em termos de evangelização; no entanto, com as adversidades e canseiras que lhe advêem das IPSS paroquiais que tem nas paróquias, a sua vida tem sido um caos.
É curioso que ainda há poucos dias um colega mais velho falou também destas coisas, dizendo que nós, Igreja, nos temos gasto com coisas secundárias!
Mesmo consciente de que devemos fazer tudo pelo Bem maior, eu acho que ele é bem capaz de ter muita razão!

JS disse...

"Talvez não façam tantas celebrações e estejam mais com as pessoas." Ou talvez consigam fazer das celebrações aquilo que eram supostas ser: o estar com as pessoas. Já fui convidado a participar num grupo coral que inclui sempre nos seus ensaios um momento de convívio em torno dum bolo e alguma bebida. Não é que cantem bem, sejamos francos; mas sentem-se bem ao lado uns dos outros. E acaba por ser mais eucarístico (= mais comungante) aquele encontro do que propriamente a missa que animam ao domingo.

Quanto às IPSS, estamos de acordo: têm sido o calvário de muitos padres. Mas penso hoje ser errado considerá-las algo de secundário na vida de uma comunidade ou no ministério de um sacerdote. O problema, parece-me, está no facto de nenhum seminário ou faculdade teológica preparar os futuros padres para lidar com essas estruturas. A aprendizagem acaba por ser feita já com o bébé no colo, à força de se cometer erros e com um desgaste pessoal impressionante. Se os seminaristas pudessem ter uns módulos de formação em gestão, muito sofrimento poderia ser evitado.
No outro dia, ouvia falar dos cursos de missionarização para quem se sinta chamado uma experiência missionária em países desfavorecidos. Para meu espanto, falavam que tais cursos implicavam aulas de mecânica, de engenharia e construção civil, e de uma série de assuntos práticos. Diziam-me que um missionário tem de ir preparado para ser um agente de desenvolvimento na área para que for enviado, e que tem de saber desenvencilhar-se das múltiplas contrariedades e obstáculos da vida dura que irá assumir.

Confessionário disse...

JS
Gosto da perspectiva que apresentas no primeiro caso.

Ja quanto ao segundo, entendo que não têm de ser os padres a gerir essas instituições. Afinal a Igreja tem mais leigos que padres. A Igreja deve estar presente, e não deve ser secundária essa presença social e caritativa (é, aliás, primordial), mas não tem de ser gerida por padres. Lá está, precisamos de uma Igreja mais corresponsável.

Servir com Alegria disse...

Interessante este texto, porque já me senti na mesma corrente, cheia de Fé para derrotar tudo, e até ir alem fronteiras, em missão... Mas hoje sinto o vazio tão grande, os sacerdotes não nos escutam, não conseguem deixar os leigos trabalhar, e para amar Jesus Eucarístico, não preciso de tanta liturgia, não fazes assim ou doutra maneira. Precisamos de padres mais calmos, mais atentos a tantos paroquianos que andam afastados por falta de serem escutados ouvidos e acariciado pelo Pastor, que neste momento têm as ovelhas muito sem caminho e sem estábulos. Como à muitos anos sempre me disseram o Testemunho é o melhor ensinamento e isso está muito longe...Jesus ensinava com autoridade, parava para escutar, e estava com os seus discípulos...hoje sinto-me orfã, sem caminho e isso leva a afastamento, mas os Padres também não fazem muita questão em saberem porque os seus paroquianos se afastam, porque estão cheios de muito que fazer!!! pensar que ir e missão para Africa, temos que ter tempo para tanta gente que nada tem, e é feliz com o pouco, um afeto um carinho um amor gratuito...Tempo de rezarmos muito para que Nossa Senhora, Nossa Mãe, interceda por todos nós filhos que andamos muito afastados do Seu querido Filho.

Anónimo disse...

Verdade,eu mesmo sinto saudades dos bons tempos das rezas que os padres acompanhava no meio das famílias. A depencias de tudo fazem que afastamento da casa do pai. Na minha comunidade está praticamente vazia a cada da mãe.

Anónimo disse...

Verdade,eu mesmo sinto saudades dos bons tempos das rezas que os padres acompanhava no meio das famílias. A depencias de tudo fazem que afastamento da casa do pai. Na minha comunidade está praticamente vazia a casa da mãe.